Da paixão à omissão

Autor: Jonathan Menezes

“Você dará a vida por mim? Asseguro-lhe que, antes que o galo cante, você me negará três vezes”. (João 13:38)
Apaixonados, deseperados, fascinados, loucos, maravilhados… tudo isso por Jesus! A cada dia se torna mais corrente entre os evangélicos o uso destes e outros enfáticos e repetitivos emblemas, que simbolizam a “paixão” da noiva (a igreja) pelo seu noivo (Jesus), e que têm alcançado considerável projeção principalmente através da música na igreja.                                               
Bandeiras como estas, a meu ver relembram aquela levantada por Pedro no cenáculo, onde os discípulos, acompanhados por Jesus, gozavam de momentos de tranqulidade, comunhão e amor, sem, no entanto, saber o que estava por vir, quando, conta a passagem bíblica do Evangelho de João 13: 31-38, Pedro indagava a razão de não poder seguir a Jesus naquele momento (ele não sabia que aquele era o momento crucial, em que Jesus seria entregue à morte), porém, afirmando com determinação: “Darei a minha vida por ti” (v. 37).     
Pedro afirmara isso, mas, no instante em que Jesus foi preso, depararia-se com o contraste do “clima” lá fora: um povo repleto de fanáticos religiosos, enfurecidos e sedentos pela “cabeça” do judeu desertor e de seus seguidores, que já haviam “pervertido” a tantos outros, agora “inimigos” do judaísmo. Nestas horas, a paixão urge converter-se em omissão. E foi o que aconteceu com Pedro, que no caso literalmente negou ser um dos seguidores de Jesus. Ele pode ter sido indubitavelmente sincero em tudo o que disse, porém, não conhecia a si mesmo.                                                               &nbs! p;                      
Conosco não é muito diferente. Quando estamos em vigílias de oração, na compania de outros irmãos, ou mesmo em confortantes momentos de louvor e adoração, fazemos declarações de amor a Deus, “juramos” ser apaixonados por Jesus, levantamos a bandeira do evangelho e fazemo-nos abnegados. Contudo, quando recebemos os impactos das agruras que fazem parte da vida, quando nos deparamos com a oposição de outras pessoas em relação à nossa confessionalidade, ou em meio a circunstâncias práticas e difíceis em que nosso testemunho cristão deveria fazer-se evidente, tão logo, seja por uma questão de preservação de nossa imagem ou de nossa auto-estima, assim como Pedro, temos “lapsos” de omissão que nos fazem esquecer de nossas tão apaixonadas promessas, afinamos e, assim, decepcionamos a Jesus e traímos sua confiança.
Não há nenhum mal em que se diga apaixonado por Jesus (aliás, paixão e motivação são o que mais tem nos faltado quando se tratam das “coisas” de Deus). Entretanto, esta paixão deve ser elevada às dimensões práticas da vida cristã, ou seja, deve não somente permanecer no nível da abstração ou do “discurso”, não passando muitas vezes de um emblema sem significado real ou de uma fraseologia hipócrita, mas desembocar em uma práxis reflexiva, consciente e que considere o serviço a Deus e ao próximo como uma das expressões inequívocas dessa paixão.
Sobretudo, é necessário que sejamos honestos com Deus e consigo mesmos; que reconheçamos a linha tênue que separa momentos de fervor e paixão, da tentação de sermos omissos: quanto a vontade de Deus, quanto a dura, e tantas vezes diabólica, realidade que temos vivido em nosso país, quanto às necessidades do outro, enfim, quanto a nossa missão como igreja.

 

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