Autor: Paulo Lockmann
“… porque ele salvará o seu povo dos pecados deles.” (Mt 1.21)
1. Introdução:
Dos messias ao Messias – Christos Neste Natal, mais uma vez precisamos fazer o resgate do verdadeiro significado da data, pois nos deparamos com o seqüestro do significado mais profundo do Natal, que é: “Deus veio ao mundo para nos salvar.” (Mt 1.21).
Até mesmo o celebrar da vinda, do nascimento do messias Jesus, precisa ser melhor definida. O termo hebraico Messias, que em grego é Cristo, cujo significado é o ungido, num sentido teológico mais amplo, o ungido e enviado de Deus, pois quem era ungido o era para o exercício de uma missão. Ocorre que percebemos um conflito entre o sentido singular do Messias, que é o próprio Deus encarnado em seu Filho Jesus Cristo (cf. Jo 1.1), e o sentido plural, onde novos homens proclamados, ou auto-proclamados, de messias pretendem ser os enviados de Deus. Eles reivindicam e vendem isso. Sem considerar os que, sem centralidade religiosa, mas que ideologicamente manipulam conceitos religiosos, se apresentam como a salvação para o povo. A nossa América Latina, e mesmo o Brasil, está cheia de caudilhos messiânicos. Como exemplo, cito Perón, Getúlio Vargas, e vários dos líderes militares das ditaduras que tivemos, e que, por total aversão, me recuso a citar os nomes. A grande maioria desses religiosos e políticos, na verdade, manipulavam o povo e buscavam a sua própria salvação e a dos seus aliados.
Tal falsa messianidade se apoiava e se apóia na baixa estima da maioria do povo oprimido e humilhado, que é convencido de que não é capaz de encontrar seu caminho de libertação e salvação. Precisam dos salvadores, mediadores, messias. Recusa-se a ser sujeito histórico no processo de revolução social, de mudança da cruel realidade em que vivem. Precisam de “coronel”, “padrinho”, de quem “cuide” deles.
Neste deformado conceito de messias, de salvador, se aproveitam políticos e religiosos. Nele crescem políticos populistas e oportunistas, assim como “pastores”, “bispos” e “apóstolos”. Pessoas cujo único projeto é a sua riqueza e a dos seus aliados, que prosperam em cima dos conceitos manipulados da Bíblia; afinal são “filhos do rei”. Teologias de prosperidade que só fazem prósperos seus líderes.
Para líderes como estes não convém pregar o Natal do menino Jesus, pois os relatos bíblicos do Natal confrontam estes messianismos, nos dão o perfil do verdadeiro Messias, o filho de Deus: Jesus.
2. O Messias dos Evangelhos da Infância.
São chamados Evangelhos da Infância os dois primeiros capítulos de Lucas e Mateus. Vou, rapidamente, destacar alguns elementos deles. Recomendo a todos os pastores e pastoras, todas as igrejas, que leiam, com atenção, Mateus 1 e 2 e Lucas 1 e 2. Este é o esforço da Igreja Primitiva, de construir o verdadeiro perfil do Messias Jesus, o Filho de Deus.
Deixem-me começar pelo anúncio do anjo a José, no Evangelho de Mateus: “… José, filho de Davi, não temas receber Maria, tua mulher, porque o que nela foi gerado é do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho e lhe porás o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos pecados deles. Ora, tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que fora dito pelo Senhor por intermédio do profeta: Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e ele será chamado pelo nome de Emanuel”. (que quer dizer: Deus conosco). (Mt 1.20-23). Trata-se de um esforço de Mateus e sua comunidade em enfatizar:
1. O Messias é gerado e procede de Deus.
2. O nome Jesus encerra a grande missão do Messias: salvar o povo dos seus pecados, tarefa não assumida pelos “messias”, mas somente por Jesus Cristo, e o fez com sofrimento na cruz, aliás sofrimento não é algo atraente aos falsos messias.
3. O nome Emanuel, outro designativo do Messias, fala do Deus presente, e todos nós sabemos e experimentamos a presença espiritual fortalecedora, consoladora e salvadora de Jesus.
Para seguir na mesma linha, vejamos nos relatos do nascimento de Jesus, em Lucas 1.26 a 38, a palavra do anjo a Maria. “…Alegra-te, muito favorecida! O Senhor é contigo. Ela, porém, ao ouvir esta palavra, perturbou-se muito e pôs-se a pensar no que significaria esta saudação. Mas o anjo lhe disse: Maria, não temas; porque achaste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um filho, a quem chamarás pelo nome de Jesus. Este será grande e será chamado Filho do Altíssimo; Deus, o Senhor, lhe dará o trono de Davi, seu pai; ele reinará para sempre sobre a casa de Jacó, e o seu reinado não terá fim. Então, disse Maria ao anjo: Como será isto, pois não tenho relação com homem algum? Respondeu-lhe o anjo: Descerá sobre ti o Espírito Santo, e o poder do Altíssimo te envolverá com a sua sombra; por isso, também o ente santo que há de nascer será chamado Filho de Deus.” (Lc 1. 28-35). O que é dito aqui acerca do Messias, o Filho de Deus?
1. “… achaste graça diante de Deus.”
A vinda do Messias é obra da graça e misericórdia de Deus, dádiva de Deus, por isso a tradição de presentear no Natal, pois assim fizeram os sábios do Oriente, os Magos. (cf. Mt 2.1-12). Que escândalo é a comercialização das verdades do Evangelho, afinal Natal é a prova de que de graça recebemos e de graça devemos dar. Escândalo é também o mercado transformar o Natal no seu grande negócio, esvaziando-se do verdadeiro sentido – A vinda graciosa de Deus ao mundo.
2. “Este será grande e será chamado
Filho do Altíssimo; Deus, o Senhor, lhe dará o trono de Davi, seu pai, e ele reinará para sempre…” (Lc 1.32-33). Jesus é o filho de Deus, e reina sobre nós. Esta não é uma verdade para os messias políticos, os quais reinam sobre o povo a serviço dos poderes econômicos, que exploram. Para eles, o rei é o mercado; esta entidade mágica é um verdadeiro deus Mamom, que segue hoje pedindo o sacrifício de inocentes. Só no Brasil são 40 milhões vivendo abaixo da linha de pobreza. Estes reinados com complexos messiânicos são uma afronta ao reinado de Jesus, o príncipe da Paz. Por outro lado, em nome de Jesus, líderes religiosos brilham e reinam manipulando o povo com frases de efeito, cuja teologia dá brilho a eles, e ofuscam negando na prática o reinado de Jesus.
Deixem-me concluir. Nos Evangelhos da Infância, Jesus é o Messias dos pobres, jamais dos poderosos. Seu pai era um operário, seu nascimento foi numa estrebaria, foi um sem teto, sua sobrevivência era garantida pela migração ao Egito, o que faz dele um sem terra, um imigrante. Estas são faces de Jesus. Isso não combina com os messias de nosso tempo, afeitos mais aos hotéis de luxo, mansões, ternos brilhosos; entre estes messias não há lugar para o Jesus de Nazaré.
Que Deus nos ajude a enxergar com clareza o verdadeiro Messias, o Filho de Deus, para isto ajuda ler a advertência que Ele mesmo fez: “E ele lhes respondeu: Vede que ninguém vos engane. Porque virão muitos em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo, e enganarão a muitos.” (Mt 24.4-5) “Nesse tempo, muitos hão de se escandalizar, trair e odiar uns aos outros; levantar-se-ão muitos falsos profetas e enganarão a muitos. E, por se multiplicar a iniqüidade, o amor se esfriará de quase todos. Aquele, porém, que perseverar até o fim, esse será salvo.” (Mt 24. 10-13).
Bibliografia:
HENGEL, Martin – Der Sohn Gottes. Tubigen: Ed. J.C.B. Mohr, 1975. p. 62-74.
BOVON, François – El Evangelio Según San Lucas. Salamanca: Ed. Sigueme, 1995. p. 68-194.
BORN, Van Den – Messianismo no Dicionário Enciclopédico da Bíblia. Petrópolis: Ed. Vozes, 1977. p. 976-985.
BROW, Colin – Nascimento no Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Ed. Vida Nova. p. 243-247.
ESCUDERO FREIRE, Carlos – Devolver El Evangelio a Los Pobres, a propósito de Lucas 1-2. Salamanca: Ed Sigueme, 1978. p. 15-67.
TUYA, Manuel – Mateos em La Bíblia Comentada.Madrid: Ed. Católica. 1978. p. 3-34.
Bispo Metodista
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