Scooby-Doo, a Igreja e o Baú de Olhos

Autor: José de Souza Barbosa Junior
Assisti há algum tempo ao Scooby-doo, o Filme (o primeiro). Como filme, é mediano. Como reconstrução de um dos desenhos que eu mais gostava de assistir quando criança, um fracasso.

A história (?) do filme se passa em uma ilha, onde adolescentes e jovens estavam tendo suas “almas” roubadas e depositadas em um grande caldeirão, onde depois de uma mistura mágica seriam todas (as almas) encerradas em um único ser, que passaria a ser o grande controlador daqueles jovens.

Os jovens e adolescentes que “perdiam” suas almas andavam pela ilha como robôs, sem vontade própria, fazendo a vontade daquele que mantinha suas almas presas no caldeirão.

Seria uma bela alusão ao diabo, não ? Mas eu acho que tem mais a ver com a igreja de hoje… infelizmente.

Muitas igrejas hoje (quando digo igreja, digo instituição, organização, não organismo) não roubam almas, roubam olhos, os nossos olhos.

Somos dia a dia roubados de nossa maneira de ver as coisas para vermos então com o único olho que nos é imposto pela instituição. Tornamo-nos cíclopes (aqueles monstros mitológicos com um grande olho na testa) espirituais, forçados a só vermos o mundo de uma forma, a forma que a igreja quer que vejamos e em uma direção, a direção traçada pela mesma.

É lamentável vermos (ainda vemos?) que qualquer um que se levante com uma visão diferente daquela “dada por Deus à liderança” logo é execrado do meio em que está e taxado de “herege”, “carnal” (a inquisição psicológica é pior que a física).

Tenho pra mim que em muitas igrejas deve haver um quartinho nos fundos, onde bem enterrado se encontra um enorme baú, o baú dos olhos… dos nossos olhos. Ninguém deve ter acesso a esse baú, a não ser que seja para depositar ali novos olhos e fechá-lo novamente, hermeticamente, fortemente, porque a abertura prolongada desse baú pode fazer com que os olhos queiram voltar pros seus donos… isso seria uma tragédia.

O baú dos olhos faz parte do “kit” de grande “líderes”. Gente inquestionável… ungidos do senhor (assim mesmo, com “s” minúsculo)… super astros… novos apóstolos… senhores de nós… servos de si mesmos…

Com nossos olhos roubados e bem guardados no enorme baú, a manipulação e a alienação são simplesmente conseqüências… nem é preciso tanto esforço. Gente sem olho não vê, e por mais que tente ver, não enxerga. O pior cego não é aquele que não quer ver. O pior cego é aquele que não tem olhos!

O pior dos donos do baú de olhos é que, como já disse antes, nos implantam um outro olho no meio da testa (engraçado, mas me faz lembrar da marca da besta na fronte… quem sabe, né?). Passamos a ver como eles. Minto! Não vemos como eles… eles são mais espertos… passamos a ver o que eles querem que vejamos. Se víssemos o que eles vêem veríamos o nosso próprio engano e veríamos a mágica arca, não a da aliança, mas a da alienação, escondida nos fundos dos mega-templos dos megalomaníacos senhores.

O olho que nos é imposto na testa representa toda a dominação sobre nossos pensamentos e atitudes. A Bíblia diz que os nossos olhos são as janelas do corpo. Se nossos olhos forem bons todo o corpo será. Com olhos roubados temos corpos roubados, pois nossos corpos agora são dominados por olhos de outros e passam a manifestar somente o que aquele grande olho vê. Lei… regras… inquisições… Os corpos agora deixam de ser vida para serem morte. Nossos corpos vivem sob a lei do grande olho… do Big Brother eva-angelical… cíclopes perdidos… sem direção… porque quem tem um olho só só anda em uma direção, não vê saídas, oportunidades.

Certa vez li num livro de Rubem Alves que se alguém só possui uma flauta, está condenado a tocar nela todas as melodias que conhece. Quem tem um olho só está fadado a enxergar apenas uma estrada…e pode ser a trilha errada.

Nunca fui muito com a cara de quem tem sempre a mesma resposta pra qualquer que seja o problema. Parece aquela “pomada de peixe elétrico” que via os camelôs vendendo na estação das barcas de Niterói: aquilo “cura” artrite, artrose, bico-de-papagaio, frieira, hemorróidas, machucados em geral, inflamações, lombalgias, e outras coisas mais. Mas é mais fácil comprar a “pomada de peixe elétrico” do que ter que correr atrás da verdade e daquilo que realmente é a cura para o meu problema particular, diferente dos problemas de outros.

Os donos dos olhos têm sempre respostas prontas… são reivindicações, ordenanças, profecias, profetadas, “orações ungidas”, visões, revelações novas (mais velhas que minha avó), etc. Gente assim me faz mal… sinto-as olhando para os meus olhos como olham para um demônio e pensando… temos que arrancá-lo. O exorcismo dos olhos de quem vê é a única arma dos donos dos baús de olhos. Olhos diferentes os amedrontam.

Finalmente, volto ao Scooby-doo. No fim de toda história dos aventureiros da “Máquina de Mistérios” havia a revelação surpreendente: Não eram fantasmas, nem demônios que estavam aterrorizando as pessoas. Eram sempre homens. Homens se disfarçavam de demônios e fantasmas para conseguirem seus intentos. Nas igrejas é diferente, o disfarce é outro, são anjos e seres espirituais que ordenam a entrega dos olhos. Os olhos, dizem eles, são maus. “Dêem- nos seus olhos e lhes daremos um modo novo de ver a vida”… e ao entregarem seus olhos, pessoas entregam seus corpos… para o serviço dos senhores de um olho só.

Que Deus, que tudo vê, Senhor verdadeiro dos olhos de quem o contemplam, possa livrar-nos da barganha de homens maus e jamais permitir que estejamos com os nossos olhos presos nos imensos baús de olhos enterrados em algum lugar dos grandes “reinos deste mundo”.

Quem tem olhos… veja…

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