Autor: Daniel Costa
Provérbios 3:19-26
No mundo de hoje as pessoas estão em busca de muitas coisas que não passam pela construção do ser. Todas as suas referências de valores estão fora e dentro de si mesmas. Essa talvez seja uma das mais terríveis perdas desse mundo consumista, voltado para a cultura do supérfluo, do culto ao corpo, do sucesso. Para o sábio Salomão, escritor de Provérbios, na vida pode-se perder quase tudo só não pode perder os valores capazes de construir o ser, de construir a si mesmo, como por exemplo, a sabedoria e o bom senso. Quanto a isso ele diz: “Filho meu, não te apartem estas coisas de teus olhos, guarda a verdadeira sabedoria e o bom senso.” Com essas duas virtudes ou qualidades sempre se terá condições de construir a vida. Porém, essa duas virtudes são ao mesmo tempo a grande marca e a grande busca de todo ser humano pleno de si, porque ninguém possui sabedoria e bom senso de forma nata, por natureza. Essas são virtudes inerentes e particulares somente em Deus. Em nós simples mortais, precisamos buscá-las, adquiri-las aos poucos pelo caminho, por isso, elas são vistas pelo sábio Salomão como adornos, enfeites à existência. O que significa que cada um pode adquiri-las ou não e usá-las do seu próprio jeito.
No entanto, sabedoria para Salomão é muito mais do que o resultado acumulativo daquilo que aprendemos pelo caminho da vida. Ele afirma: “O temor do Senhor é o princípio do saber” (Pv 1:7). O fundamento, a base da sabedoria está em levar Deus a sério, em considerar Deus junto a todas as outras considerações que fazemos na vida. Ou seja, na construção da vida não existem só as leis da física, as formulas exatas da matemática, as verdades da ciência, a percepção da psicologia, as construções e constatações da antropologia. Junto a tudo isso e para além de tudo isso existe Deus, a possibilidade daquilo que transcende, do que nos escapa. Um sábio sempre vai levar isso em consideração enquanto vive. Já o bom senso não é um conceito, mas uma aplicação. É a forma como aplicamos os saberes no confronto e construção da vida. E, é isso que diferencia o inteligente do sábio, porque é possível se ser um gênio sobre muitos assuntos, mas também, um tolo para viver, alguém sem qualquer bom senso ou habilidade para lidar com as circunstâncias, para viver com coerência os seus saberes diante da forma como a vida se apresenta. Mas, quando se chega a essa rara condição de conciliar sabedoria e bom senso é possível se relacionar com a vida de três formas:
Primeiro – Se constrói o seu caminho com segurança. O sábio Salomão nos diz: “Então, andarás seguro no teu caminho” (vs. 23). Cada um tem o seu próprio caminho. Ninguém pode viver a vida do outro, no lugar do outro, mas somente a sua própria vida, seu próprio caminho. De outro lado, a vida é caminho, não é dada, não está pronta, cada um terá que construir seu próprio caminho. Essa é a primeira percepção de quem possui sabedoria e bom senso, não espera a vida acontecer por si só, mas é responsável e consciente com a sua própria vida. A geração da minha juventude cantou: “Bem, vamos embora porque esperar não é saber. Quem sabe faz a hora não espera acontecer.” O sábio de bom senso, sabe que terá que fazer as suas próprias escolhas na vida, que terá que decidir por onde passar e por onde não passar com a sua vida e fazer isso com absoluta consciência para não tropeçar em si mesmo.
Segundo – Se vive tranqüilo com a sua própria consciência. Salomão afirma: “Quando te deitares, não temerás; deitar-te-ás e o teu sono será suave” (vs. 24). O sono tranqüilo só possui aqueles que não fogem de si mesmo, que são capazes de assumir diante de Deus e da vida o que são, com tudo o que foram capazes de fazer. A vida é sempre a integração de um todo. Não se pode ser feliz aceitando somente uma parte ou um lado de nossas escolhas. Para se ter consciência tranqüila é necessário se ser integro. E integridade é ter consciência dos acertos, mas também, dos erros, das coisas que fizemos e nos arrependemos por ter feito. O grande problema é que a moral cristã só prepara as pessoas para lidar com o acerto, com a retidão das escolhas. Mas quem nunca errou? Quem não é culpado de nada? Esse tipo de percepção da integridade somente no acerto gera, de um lado, a soberba, porque aqueles que se acham íntegros nesse sentido, se acham melhores e superiores porque não fizeram nada que mereça desaprovação dos outros. Quando na verdade o que aconteceu é que as suas incoerências só não vieram a público. De outro lado, pode gerar o cinismo. Porque gera pessoas incapazes de assumir os próprios erros, que estão sempre dando desculpa e transferindo as responsabilidades das próprias culpas. Isso é leviandade. A paz de consciência é fruto da integridade com que lidamos com as nossas escolhas, nossos acertos e erros.
Terceiro – Se vive com fé. Salomão afirma: “Porque o Senhor será a tua segurança e guardará os teus pés de serem presos” (vs. 26). Na vida só se pode viver com saúde mental e equilíbrio emocional quando se vive com fé. É preciso se acreditar, se ter fé em algo mais do que em nós mesmos. A vida fora do mistério da transcendência é tão banal, tão tola e sem sentido. Primeiro, porque sem qualquer lógica ou aviso prévio estamos todos sujeitos ao que é repentino, ao terror que pode nos assolar de repente. Segundo, porque o mal é uma realidade no mundo, o perverso pode nos atingir. Na vida podemos nos machucar pela maldade e frieza do coração do outro. Diante de tudo isso, por mais que nossa mente seja ávida, cheia de conteúdos sociais, morais, psicológicos, filosóficos, etc, ninguém está seguro. Nessa hora, quando se abate sobre nós o terror repentino e a perversidade é preciso crer em algo mais, que existe alguém, um poder por trás de tudo que pode nos manter em segurança e que não permitirá que os nossos pés fiquem presos. Nenhuma circunstância, nenhuma experiência, nenhuma situação nos aprisiona. Podemos superar a tudo, transcender a tudo, ir para além e a frente de tudo que se abate sobre a nossa vida, quando cremos que existe Deus. Seus pés estão livres, então vá em frente.
Deus abençoe você.
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