O poder destrutivo da intolerância

Autor: Rubens Paes

Uma reflexão sobre Lucas 9: 46-56

 “As leis, por si mesmas, não conseguem assegurar liberdade de expressão; para que cada homem exponha seus pontos de vista sem sofrer penalidade deve haver espírito de tolerância em toda a população”  Albert Einstein (1879 – 1955

Desde o seu nascedouro e durante toda a história da Igreja, o Cristianismo sofre constantemente dois tipos de ataques: os externos, promovidos por forças não-cristãs que querem barrar a expansão da fé, e os internos, que nascem dentro das próprias comunidades eclesiásticas.

Exemplo de investidas externas à Igreja são as perseguições movidas pelos oponentes do Cristianismo, que fizeram milhares de mártires.

Mas há também o que se poderia chamar de autofagia no Corpo de Cristo. Muitos conflitos nascem dentro da própria comunidade cristã. Surgem verdadeiros duelos onde cada uma das partes quer fazer prevalecer seus pontos de vista, sem importar-se com os danos que isso possa trazer.

Um retrato dessa autodestruição pode ser visto nos problemas vivenciados pela igreja de Corinto, que estava completamente dividida. A dificuldade foi tratada por Paulo em sua Primeira Carta aos Coríntios. O apóstolo repreendeu com severidade aqueles que promoviam divisões.

Os cismas na Igreja geralmente ocorrem porque há uma luta por poder. Procura-se normalmente justificar as divisões por questões doutrinárias. Mas o cerne de toda problemática geralmente tem a ver com alguma disputa por autoridade e prevalência de idéias. O orgulho leva à disputa por poder. No texto que nos serve de base para esta reflexão, os discípulos discutiram sobre qual deles era o maior, vv. 46-48. Como conseqüência, vieram as atitudes intolerantes.

Sejam de origem externa ou interna, os ataques contra o Corpo de Cristo têm sempre a intolerância como ponto de apoio. O intolerante não sabe ouvir opiniões contrárias às suas, não respeita limites, é perseguidor.

Em Lucas 9: 46 a 56, há dois interessantes episódios envolvendo Jesus e os discípulos. Nos dois casos, o tema da intolerância está presente. Na primeira narrativa, vv. 49-50, o apóstolo João conta ao Senhor que havia visto um homem que expulsava demônios em nome de Jesus, porém lho proibira: “Nós lho proibimos, por que não segue conosco.” Se aquele homem pertencia a um outro círculo de convivência, raciocina João, como poderia, então, ex-pulsar demônios em nome de Jesus?

O Senhor, tratando do assunto com extrema sabedoria, disse não à intolerância. João e os demais apóstolos foram repreendidos pelo Senhor, que disse: “Não proibais; pois quem não é contra vós outros é por vós”.

Jesus, assim, condenou a visão míope, unilateral, autofágica e auto-mutiladora. Aquela atitude de João feria não apenas o homem que fora repreendido, mas o Reino de Deus. Ao invés de agregar forças, os discípulos estavam desprezando alguém que poderia fazer um importante trabalho pelo Reino de Deus.

Assim é que, muitas vezes, continuamos agindo até hoje. Basta um ponto de divergência para que a intolerância se manifeste. E o resultado todos conhecemos!

Na seqüência da narrativa bíblica (vv. 51-56), há outro episódio curioso. Novamente, João é um dos que lideram o movimento. Jesus não fora recebido numa aldeia de samaritanos. Tiago e João, cheios de ira, perguntaram: “Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu para os consumir?” E, de novo, Jesus repreendeu os discípulos. Não havia necessidade de fogo do céu. Estavam ali almas preciosas que seriam alcançadas pela graça de Deus. Jesus sabia que, mais tarde, o movimento missionário chegaria aos samaritanos. E, de fato, após um tempo Filipe pregou o Evangelho àquelas pessoas, At 8: 4-8.

Se desejamos ver igrejas fortes, saudáveis, temos de aprender a ser mais tolerantes, não-exclusivistas. O modelo ensinado por Jesus é de um coração fraterno e compreensivo. Atitudes permeadas pelo amor, fruto do Espírito, trarão mais paz em nossos relacionamentos.

Jornal Aleluia – Junho /2005 – pág. 11

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