Espiritualidade na Terceira Idade

Autor: Monsenhor João Vicente Leite

Quando falamos em espiritualidade, entendemos sempre uma crescente profundidade no viver o sentido da vida humana. Sob este enfoque, cada estágio de nossa existência realiza sua espiritualidade própria. Assim, por exemplo, a juventude e a maturidade enfrentam desafios e oportunidades específicas para seu crescimento mais profundo como pessoa humana.
Também para os idosos isso é verdade. E como escreve alguém, “a velhice é um tempo revelador, em que o melhor e o pior de nós sobressaem com nítido relevo”. Por isso, a espiritualidade dos idosos começa a ser preparada muito cedo. Já na primeira infância, o netinho vai aprendendo com seu vovô a admirar, a valorizar suas qualidades.
A espiritualidade deve contemplar os vários aspectos da pessoa humana, não só o etário: dimensões biológica, psíquica, social, religiosa (espiritual)… Cabe à família, à sociedade, à Igreja, ao poder público “assegurar que os serviços sociais para os anciãos tenham em conta não somente suas necessidades físicas, mas também as necessidades psicológicas e espirituais”. Dessa forma aumentará sua expectativa e qualidade de vida. A verdadeira espiritualidade cimenta suas atitudes na Fé Teologal que, com sua irmã Esperança, nos abre o espírito para as Verdades Reveladas.
A Fé e a Esperança nos levam a olhar para a frente. Com otimismo e alegria, buscar na Palavra de Deus o alimento salutar de nossas preces. Atenção, porém: espiritualidade não se mede por quantidade de oração, por volume, por números, por estatística. A espiritualidade é o grau de nossa união com o Pai.
Aqui aparece um dos aspectos específicos que sinalizam claramente a espiritualidade dos anciãos. A vida, com o passar dos anos, lhes presenteou boa dose de paz. Seus gestos são mais tranqüilos. A ansiedade e a correria já ficaram à margem de seus dia a dia. Seu espírito está aberto à meditação, à reflexão, à contemplação. Pois, Deus não vem a nós num vento impetuoso e violento que fende as montanhas, nem no tremor da terra, nem no fogo abrasador… Vem no murmúrio de uma brisa suave (I Reis 19,11-13).
Celebrar
A Celebração é outro aspecto desta espiritualidade. Louvar e agradecer a Deus as “Bodas de Ouro” da vida matrimonial, o tornar-se ‘vovô’, celebrar o Jubileu Sacerdotal, a Consagração a Deus e ao serviço dos irmãos… Tudo pressupõe tempo, dedicação, fidelidade, perseverança. E este é um privilégio de quem viveu bastante e chegou tranqüilamente (dir-se-á naturalmente) a este estágio de vida. Para envelhecer com serenidade e alegria (a vida é um grande dom de Deus!), é necessária a tranqüila aceitação da própria realidade.
Nos últimos estágios da vida acontecem perdas reais de amigos, de status social, do exercício da profissão etc. Aí então, imprescindível, é a aceitação de si mesmo, numa atitude de dignidade e consciência cristã.
Relacionar-se
Nossa união com o Pai Celeste – alicerce da Espiritualidade Cristã – desenvolve-se e cresce através da oração, como diálogo íntimo, pessoal com Deus. Tal relacionamento exige igual atitude para com nossos semelhantes.
Nas relações com os outros, o idoso desenvolve suas potencialidades, contribui para o bem comum e cresce na união com Deus. Aumenta sua auto-estima. Valoriza-se. Vive com alegria e paz sua idade avançada. E canta com o Salmista: “A mão direita do Senhor faz maravilhas… Não morrerei, mas, ao contrário, viverei para cantar as grandes obras do Senhor” ( Sl 117, 16-17). Conviver Por natureza o ser humano é social. Nasce e cresce em uma família. Vive em comunidade. É chamado a conviver e assumir responsabilidades supra-individuais. Assim ele é educado, desenvolve-se, progride. Para a espiritualidade este é um fator importante. Na convivência com os irmãos aparam-se as arestas, desenvolve-se o altruísmo, combate-se o egocentrismo, exercita-se a partilha, constrói-se o Reino de Deus na terra.
E o sofrimento?
O sofrimento acompanha o ser humano em todas as fases do seu desenvolvimento. Faz parte da caminhada. Nos idosos, pode ser mais acentuado, trazendo limitações. Então é preciso lutar, aceitar a realidade. Sim! Mas não passivamente. Reagir, buscando vencer as dificuldades. Empregar os meios disponíveis: terapias, remédios, exercícios físicos, mentais, convivência trabalhos… E, além de todos esses recursos materiais, apegar-se a Deus.
Aqui a fé bem vivida é muito importante. Só ela nos faz valorizar o sofrimento, unido ao sofrimento de Cristo, o “Homem das Dores”. Então poderemos repetir a CF 2003: “A tua força se revela nos mais fracos, nos anciãos a tua bênção nos sorri”, pois “até mesmo na velhice darão frutos e já no outono de sua vida hão de florir”.
 

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*