Autor: Dom Aloísio Roque Oppermann
O enfoque que a Bíblia apresenta a respeito de recompensas e castigos, destinadas às pessoas, é bastante diferente entre o Antigo Testamento e o Novo. A primeira Aliança, especialmente através dos Salmos, e mais alguns livros, professa que o homem justo, que pratica o bem, já obtém sua recompensa nesta terra, e será livre de seus inimigos. Quanto aos maus, não demora muito e serão punidos ou até destruídos. É a assim chamada Teologia da Prosperidade. Dentro do seu contexto, crer significa aguardar os bens prometidos, que se restringiriam aos benefícios a serem recebidos já nesta vida, sem estender os olhos para o transcendental, ou o pós-morte.
Já os cristãos, diferentemente, diante da morte do Justo por excelência – o Cristo – “que passou por esta vida só fazendo o bem” (At 10, 38), e assim mesmo foi morto, essa evidência vétero-testamentária enfraquece. Mas não só por causa do exemplo de Cristo. Pela observação prática da lerdeza dessa recompensa, e até pela decepção de sua não realização, os fiéis da Nova Lei passam da fé nos bens deste mundo, para uma esperança no galardão, a ser conferido no além. Apenas esta é a recompensa certa. O Novo Testamento, numa ruptura progressiva, se divorciou da teologia da prosperidade, pela qual o justo poderia estar seguro de ser logo recompensado, e o adversário punido. O malvado nem sempre sofre os desastres previstos pelos Salmos, já para esta vida. Talvez aí resida a dissensão básica, que ocasionou a separação entre judeus e cristãos.
A teologia da prosperidade, tão presente na dinâmica de certas novas denominações religiosas cristãs, é muito simpática. Para seus próceres, é hora de parar de falar sobre justiça social, sobre direitos humanos e sobre as abominações da riqueza mal adquirida. Deus protege o fiel seguidor da Lei, aquele que paga generoso dízimo, (se Jesus é o Caminho, essas organizações religiosas são o “pedágio”), é submisso às regulamentações dos líderes, e acata humildemente certas prescrições de antemão escolhidas. Alegres empresários se reúnem, e se lhes fala do poder divino, que livra das dívidas e garante empresas saudáveis, contanto que tenham para com a entidade religiosa um comportamento generoso ($). O Eterno livraria de golpes da bolsa e de outras dificuldades das empresas, e atenderia prontamente suas orações. Nada mais daqueles temidos problemas e sobressaltos da vida. “Muito sofrer é a parte dos ímpios. Mas quem confia no Senhor será envolvido de graça e perdão” (Sl 31, 10).
A Teologia da Cruz, tão a peito nos ideais de São Paulo ( “eu só conheço Jesus Cristo, e este crucificado” [1 Cor 2,2] ), aparentemente está em rota de colisão com os ideais de riqueza, abundância e de existência “abençoada” de judeus e de novos cristãos. Embora, no fundo, nos justos termos, não exclua outras teologias, essa Teologia de São Paulo, está sendo apresentada como maléfica para os espíritos construtivos e dinâmicos do mundo moderno. Seria bom que todos levantassem os pensamentos, e verificassem a excelsitude do ensinamento de Jesus sobre o Reino de Deus. Essa pregação, sem alijar a prosperidade e o valor da cruz, dá uma motivação muito mais perfeita para a vida de um cristão engajado na vida do século XXI.
* Dom Aloísio Roque Oppermann scj é Arcebispo de Uberaba -MG
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