Os falsos mestres e pastores

Autor: Renata Gomes
No quinto capítulo do segundo livro de Reis, lemos uma narrativa sobre a cura de Naamã, chefe do exército do rei da Síria. Naamã tinha lepra, e ficou sabendo por intermédio de uma menina feita por ele cativa em uma de suas investidas contra a terra de Israel, que havia naquela terra um profeta que o curaria. Ele então pede a intervenção do rei sírio. Este escreve uma carta ao rei de Israel pedindo que cure Naamã. O rei de Israel ao recebê-la não sabe o que fazer e acaba por rasgar suas vestes de tanto desespero, todavia o profeta Eliseu manda que este o deixe vir ter com ele, pois assim Naamã saberia que existia profeta em Israel. Ao encontrar com Naamã, Eliseu manda-o banhar-se nas águas do rio Jordão sete vezes, por que dessa forma ficaria curado. Entretanto, Naamã acha isso um absurdo, porque a Síria possuía rios bem melhores do que os existentes em Israel. Mas, aconselhado por seus oficiais resolve fazê-lo. Ao seguir as instruções do profeta, fica curado. Então vai ao encontro do mesmo e oferece ouro e todas as preciosidades que havia trazido como forma de gratidão, contudo Eliseu não aceita. Mas seu servo Geazi , resolve aceitar escondido de seu senhor os tesouros em oferta de gratidão pela cura divina. Ao voltar para a casa do profeta, Geazi é interrogado pelo mesmo acabando por confirmar que havia recebido tal oferta, recebendo em seu próprio corpo e estendida a toda a sua descendência a lepra de Naamã, por causa de sua ganância, de querer usurpar a glória de Deus em benefício próprio.
Bem esta história bíblica nos ensina muitas coisas, e a fundamental é a de que a salvação tanto física como a espiritual não pode ser comprada. Ela se dá de forma espontânea. Deus não pode ser encapsulado. Ele é maior do que todas as coisas, ele é transcendental. Ele ultrapassa a medida do homem. Não cabe ao homem dizer o que a divindade pode ou não pode fazer. Mas muitos “pajés” tentam ditar-lhe normas, padrões de conduta, tentando assim inutilmente planejar a agenda de Deus a seu bel prazer, fazendo de Deus um simples lacaio. Eles garantem que são os detentores da verdadeira palavra divina, que têm as respostas para todos os males. É preciso que o homem e a mulher, que verdadeiramente são pessoas espirituais, tenham uma visão crítica desses falsos pastores e profetas que tentam utilizar sua falsa sabedoria religiosa para dominar as vidas das pessoas e fazê-las verdadeiras marionetes. Atentemos para o que nos diz o Leonardo Boff:
“É importante, no entanto , manter sempre nosso espírito crítico, porque infelizmente com espiritualidade também se pode fazer dinheiro. Existem verdadeiras empresas manejando os discursos da espiritualidade para criar um exército de seguidores que muitas vezes falam mais aos seus bolsos do que aos seus corações.”
É o que constatei ao ligar meu aparelho de TV ontem, quase tive uma síncope, acreditei que estava de volta a Idade Média ou coisa parecida e sabem porquê? Simplesmente por que estava assistindo um programa evangélico, que prometia a todas as pessoas que tivessem um pedaço de uma toalha usada pelo “Bispo Fulano de Tal”, que elas seriam abençoadas de todas as formas. O pior de tudo não foi essa promessa de milagre, foram as pessoas que ligavam para o programa dizendo que só por tocarem o tecido através do aparelho de televisão tinham recebido a “cura divina”. Ora o que dizer sobre isso? É inquestionável que a maioria delas que tenham sido curadas pelo poder de sugestão usado no discurso persuasivo do bispo que fazia o programa. Isso me deu uma sensação muito ruim, eu senti o quanto o povo evangélico precisa amadurecer sua visão infantilizada de Deus e da religiosidade no seu strictu sensu. A criança não possui voz própria, ela não se manda nem se autodireciona. Precisamos, nos tornar adultos e termos opinião própria. As ovelhas seguem qualquer um, um pastor e até um cão pastor podem conduzi-las. Eles as poderão conduzir tanto para a vida como para a morte. Isso ocorre não porque as ovelhas sejam seres sem inteligência, mas sim porque não pensam. Elas se deixam conduzir. É mais fácil, faz parte da natureza do ser ovelha o não pensar.
Aproveitando o ensejo desejo falar de um outro pastor, que ao pregar sobre a fé de Daniel em seu programa televisivo aos sábados pela manhã, fez questão de falar do terreno que havia comprado para a igreja, e que tinha fé de que iria conseguir pagar o mesmo. Nota-se o quanto esse “homem de Deus” sabe utilizar da persuasão para seduzir seus ouvintes, visando assim fazer com que as pessoas contribuam “espontaneamente” com o pastor, ajudando-o a pagar o terreno comprado para aumentar o templo etc. Ao invés dos pastores estarem preocupados em ajudar as pessoas menos favorecidas dentro das igrejas, muitos possuem apenas a intenção de construir templos faraônicos, para dessa forma ver aumentar os dízimos trazidos a casa do tesouro, e assim seus salários. Afinal de contas, aumento do número de membros virou sinônimo de aumento de dinheiro no bolso dos pastores. Nossa isso, causou-me bastante indignação. O objetivo principal da pregação realizada pelo pregador não deveria ser levar seus interlocutores a uma profunda reflexão, crescimento e amadurecimento espiritual de suas vidas? Mas, o que dizer de tal procedimento? Nossa o mínimo que pode-se comentar é que o mesmo é totalmente desprovido de ética para com a função de pregador. Afinal de contas, nos quatro evangelhos, onde temos a biografia de Jesus neles contida, em momento algum vemos esse Deus encarnado pedindo dinheiro, muito pelo contrário, estava preocupado em ajudar as pessoas com seus gestos, palavras e amor.
O inadmissível, é que em pleno século XXI o homem ainda precise de amuletos medievais tanto humanos como de objetos, totalmente obsoletos para professar a sua fé em Deus. As pessoas jogam a responsabilidade de sua espiritualidade toda nas mãos dos outros, não pensam, agem de forma autômata. Infelizes que são, acreditam-se capazes de raciocínio, mas se apresentam como meros joguetes nas mãos de homens que se julgam “homens de Deus”, mas pessoas a quem ele nunca conheceu. O evangelho encarnado em Cristo Jesus era baseado em formar uma nova criatura e não em ter coisas ou bens, o que predominava era mais ser do que ter. O próprio Cristo dizia que era preciso nascer de novo, era preciso ser uma nova criatura, alguém transformado, mais compassivo, mais amoroso etc. Contudo o que se prega nas grandes igrejas eletrônicas é que o mais importante é o quanto você pode Ter com Jesus, e esse Ter refere-se as coisas materiais. Jesus é um “fado madrinho”, basta só falarmos com determinação que ele realiza nossos desejos, ah talvez tenhamos que chamá-lo de gênio da lâmpada , só que ao invés de ver-se livre ao realizar os três desejos do “possuidor da lâmpada mágica”, terá que satisfazer todos os desejos, tornando-se servo ao invés de Senhor.
É preciso mesmo que os espirituais façam uma atualização da leitura da Epístola de Judas com todo o cuidado, meditando nas palavras dessa carta. Precisamos usar de radicalismo como diz Paulo Freire, isto é, ir à raiz das questões, observando as características dadas pela bíblia sobre os falsos mestres e pastores. Pastores que pastoreiam a seus próprios interesses. Na verdade não são pastores mas verdadeiros lobos em capa de cordeiro, enfim usam capas de algodão que tem franjas de veludo. Em nome de que Deus eles falam? Com certeza não falam em nome do Deus misericordioso, Pai da Vida , Amoroso, Apaixonado e que Optou pelos Pobres e Menos Favorecidos. Eles falam sim, em nome da sua própria ganância assim como o servo de Elias, Geazi. Tais líderes com certeza receberão a verdadeira punição que merecem, assim como Geazi a recebeu.

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