O que é espiritualidade?

Autor: Verônica Moraes Ferreira
No meio evangélico, concebemos espiritualidade como algo exterior e não como uma mudança no mundo interior da pessoa humana. Ledo engano. Pecamos muito nesse sentido. Lamentavelmente, acreditamos que só somos espirituais quando falamos diferente, nos vestimos de forma a parecermos como “crentes”, temos “visões”, profetizamos etc., porém na realidade a verdadeira espiritualidade é algo que nos faz sermos pessoas melhores, tanto para nós mesmos como para os outros e por conseguinte para com o próprio Deus.
No meio evangélico, observo as pessoas se convertendo ao protestantismo, à igrejas e à denominações, mas não ao próprio Deus. E porque digo isso? Porque, as mudanças observadas na maioria das pessoas são apenas exteriores, a fala das mesmas tem muitos jargões evangélicos aprendidos na calor do momento, sem realmente um envolvimento com o Criador e com suas criaturas. Não existe uma revolução na sua vida interior, sendo ainda as mesmas pessoas de antes, só que com uma camada superficial diferente por causa de algumas coisas que aprenderam em seu contato com a religião. A criatura humana é dessa forma vista e concebida como um ser apenas de contatos, movida por ações reflexas como os animais irracionais, entretanto ela necessita se ver e se perceber como um ser de relações, de relacionamentos, o que implica no uso de sua criticidade. Esta criatura não está no mundo, ou seja na igreja mas com o mundo ou seja com a igreja. O estar com o mundo ou com a igreja implica no uso da razão de forma a exercer sua criticidade e no conhecimento de si como criatura inacabada. É necessário uma busca constante de olhar para dentro e fora de si mesma, e assim buscar alcançar um maior conhecimento de si e do outro, enquanto ser humano e divindade.
Cristo em sua passagem pela terra, nos deu um dos maiores exemplos de sua grandeza humana, quero trabalhar aqui com a visão sobre sua humanidade, simplicidade e humildade. Em nenhum momento das escrituras sagradas ele se arvora do direito de ser mais do que as outras pessoas, por ser mais espiritual do que os outros. Ele não se afasta dos amigos e até dos inimigos por ser Deus, coisa que não vemos nos evangélicos. Ao se converterem, afastam-se dos amigos por julgarem-se muito santos, muitos até chegam ao ponto de citarem as escrituras para apoiar essa idéia de separação, que diz que não se deve sentar à mesa dos escarnecedores, vêem pecado em tudo e em todas as coisas. Na verdade, a santidade é uma busca constante, pois segundo a própria escritura sagrada ela é uma conquista. A bíblia nos diz que somos seres parciais, nós não somos totais então toda idéia de que sou totalmente espiritual é errada, foge a realidade de que o homem é uma metamorfose ambulante, é um ser inacabado que até o último suspiro está constantemente aprendendo e quando passa para outra vida com certeza continuará a fazê-lo. O homem caminha para atingir sempre o estado da soberana perfeição, mas ele não é perfeito. Não creio em perfeição nesta vida, acredito num caminhar constante em sua busca , de um eterno aprendizado, crescendo e amadurecendo.
Muitos evangélicos vivem a vida em função de irem viver no céu com Cristo, e esquecem de que são seres materiais além de espirituais. A vida possui duas dimensões, a saber: a espiritual e a material. Infelizmente, a grande maioria do povo evangélico só pensa em viver na dimensão espiritual. São loucos varridos, carentes de usar suas mentes de forma racional como bem o diz a escritura: “E não vos conformeis a este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus.” Romanos 12.2
Cristo na oração do Pai-Nosso percebe que existe na vida do homem essas duas dimensões, e ele se preocupa em que o homem ao orar, as leve em consideração. É o que podemos notar quando ele ensina o homem a pedir o pão, o perdão, a ajuda contra a tentação e o mal (coisas materiais); e a santificação do nome de Deus, a vinda do reino de Deus, o estabelecimen to da vontade de Deus e o próprio Pai (como coisas espirituais). Dessa forma, não se pode negar a nossa materialidade em detrimento da nossa espiritualidade. Existem “crentes” que mais se parecem com “ ET”s de Varginha” , isto é, parecem pessoas de outro planeta, pessoas que acreditam que só poderão ser felizes apenas quando estiverem num plano espiritual, concebendo sua felicidade apenas num mundo porvir, ou seja no céu. São pessoas espiritualmente pobres e tornam pobres as vidas das pessoas que as cercam. Pobreza espiritual essa no sentido de que não aproveitam os momentos de felicidade que a vida lhes dá, já que não conseguem ver os mesmos devido a uma visão obtusa da existência e no sentido de não se permitirem a possibilidade de se entregar a relacionamentos, na perspectiva de trocar experiências com os outros, viabilizando um maior crescimento da criatura humana como pessoa.
O verdadeiro objetivo da pregação de Cristo era causar uma revolução no interior do homem. Seus perseguidores não conseguiram entender a dimensão de sua obra, para eles a maior revolução seria política e a da espada. Não era interesse de Cristo produzir uma doutrina, uma religião ou iniciar uma revolta armada contra os romanos, mas sim levar o homem a uma mudança em sua interioridade. Cristo não tinha como propósito instituir o cristianismo, ele quis criar um novo homem, ou seja uma nova criatura. Portanto, devemos pensar que a religião por si só não causa essa transformação. A transformação acontece de acordo com o querer do homem em mudar sua qualidade de vida e em querer ser alguém melhor para si mesmo e para o outro. Não é apenas pela prática da religião ou pela observação de seus dogmas e tradições que nos tornamos espirituais. Como exemplo cito a parábola do fariseu e do publicano no evangelho de Lucas 18. 9-14, onde Jesus nos conta que o fariseu e o publicano sobem ao templo para orar, então o fariseu em sua oração começa a se julgar muito espiritual por seguir as práticas da religião que professava, enquanto o publicano não se achava digno de sequer olhar para o céu. Cristo nos diz que o publicano é quem desce para casa justificado enquanto o outro não.
Então o que aprendemos sobre espiritualidade é que quem a possui é aquele que realmente mergulha de encontro a Deus, que tem experiências com Deus, tendo com Ele uma relação individual e dialogal, de forma saudável, sem qualquer tipo de fanatismo religioso. Ser espiritual não é apenas professar uma religião ou simplesmente se apresentar como religioso, é algo mais profundo do que isso , é ter com Deus uma experiência de pele.

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