Autor: Misael Nascimento
Foi também congregada a seus pais toda aquela geração; e outra geração após eles se levantou, que não conhecia o SENHOR, nem tampouco as obras que fizera a Israel. Jz 2.10.
Agradecemos a Deus por este dia. Mais uma vez nos reunimos para o piquenique anual da IPCG, quando louvamos ao Senhor por mais um aniversário da organização da Sociedade Auxiliadora Feminina (44 anos) e abrimos o “mês do lar”.
É uma ocasião para revermos uns aos outros — aprofundarmos a comunhão, conhecermos novas pessoas e participarmos de diversão saudável. Antes de tudo, porém, temos essa oportunidade de ouvirmos a Palavra de Deus.
O momento de ouvir a Palavra de Deus é especial. Cremos que o Deus vivo e verdadeiro, que está aqui, nos fala. Por isso eu convido você a prestar atenção a esta mensagem como um recado do Senhor ao seu coração. Inicio destacando dois fatos apresentados pelo texto lido.
A mortalidade das gerações
Foi também congregada a seus pais toda aquela geração…
O autor bíblico refere-se à morte de toda uma geração. Aprendemos que mais de um milhão de pessoas saíram do Egito, quando Josué tinha menos de 20 anos, e viram os sinais maravilhosos de Deus. Destas, milhares de milhares conheceram o Tabernáculo e a lei divina e participaram da conquista de Canaã.
Cerca de um século depois, todos morreram. Isso significa que daqui há cem anos, não estaremos mais sobre esta terra. Teremos “passado” e outra geração — de nossos filhos e netos — estará de pé. Seremos apenas vaga lembrança, pois somos finitos e mortais.
A facilidade do esquecimento da aliança
… e outra geração após eles se levantou, que não conhecia o SENHOR, nem tampouco as obras que fizera a Israel.
É fácil nos esquecermos da aliança. Morreu, com a geração anterior, a fé. O Tabernáculo estava estabelecido e a lei estava escrita. Havia uma mensagem de redenção. Havia uma instrução litúrgica e cerimonial. Havia uma regra espiritual e moral. Mas não haviam mais conhecedores de Deus.
Isso é assustador. É possível que nossos filhos, netos ou bisnetos sejam adeptos de crenças panteístas ou se voltem para o alto ou baixo espiritismo. É possível que sejam adoradores do diabo ou mesmo completamente ateus. O fato de crermos em Deus hoje não garante, por si mesmo, que nossa descendência vai crer, nem que haverá uma nova geração de crentes bíblicos no século seguinte. O fato de existir uma instituição denominada igreja, com sua mensagem, liturgia e padrões, não garante a continuidade da vivência do Cristianismo em famílias da aliança. Exatamente por isso, temos de nos perguntar o que é a Igreja, qual o seu papel e suas limitações.
A igreja é o ajuntamento daqueles que crêem, adoram e servem ao Senhor nos termos de sua aliança
Qual é o papel da Igreja? A Igreja glorifica a Deus com adoração, evangelização, discipulado, comunhão e serviço.
A Igreja tem o múnus da Palavra e dos meios de graça. Ela é responsável por manifestar as marcas de autenticidade: Pregação fiel da Palavra de Deus, administração correta dos sacramentos e aplicação da disciplina.
Ela fornece uma estrutura de fé onde recebemos apoio espiritual, moral e emocional para enxergarmos os problemas sob a ótica de Deus (da Palavra), tentarmos discernir o que Deus está realizando na história e respondermos a tais problemas com fé e fidelidade à Bíblia.
Ela fornece uma estrutura de suprimento e motivação para as boas obras. Ela fornece uma estrutura de ensino bíblico e correção, bem como um canal para o cumprimento dos termos do Pacto. Ela fornece uma estrutura de pastoreio. Nutrição bíblica e oração (At 6.4). Capacitação para o uso dos meios de graça e para o serviço (Ef 4.11ss.). Apoio, fortalecimento, cura e busca (Ez 34.4).
Entendamos, porém, que a Igreja não salva, nem santifica. Quem salva é Deus, quem santifica é o Senhor. A glória é somente de Deus, Gracioso Soberano que age na e através da Igreja.
Qual é o alcance da Igreja?
Todas as ações da Igreja pressupõem:
A direção e ação do Espírito Santo (At 9.31; 1Co 12.4-6).
A resposta humana à Palavra de Deus (Jo 1.12; Jo 17.8; At 17.11; 1Ts 1.5-6). Mesmo esta resposta, porém, decorre da operação graciosa de Deus (Fp 1.12-13).
Além disso, o entendimento e vivência da aliança começam na família (Gn 18.19; Êx 12.26-27; Dt 6.4-9; 1Sm 1.12, 17, 2.22-25, 3.11-14; Pv 13.24, 23.13, 29.15; Ef 6.4). Isso significa que, ainda que a Igreja forneça toda essa estrutura e suporte para a fé, é necessário que haja uma movimentação dentro das famílias, uma iniciativa e um empenho, em cada família, de compreender e viver sob os termos do Pacto divino.
Quais são as limitações da Igreja?
Por mais estranho que pareça, não há nenhum texto bíblico que afirme que a Igreja tem a missão ou o poder de restaurar vidas. A Igreja pode e deve pregar e viver a salvação, mas quem restaura é o Deus Triúno. É necessário que o indivíduo e a família amem, invoquem e sirvam a este Deus.
Por mais que isso contrarie alguns chavões evangélicos, não há nenhum texto bíblico que afirme que a Igreja tem a missão ou o poder de resolver todos os tipos de problemas. A Igreja pode e deve praticar o amor auxiliador com consciência de suas limitações. Todos temos de colocar nossos problemas diante do Deus vivo.
Eis um fato chocante: Uma igreja não tem como garantir uma família feliz. A Igreja não pode ser responsabilizada por uma crise séria na família. Eu não posso dizer: “estou passando por isso porque a Igreja é fraca ou não me apóia devidamente”. Isso é colocar sobre a Igreja um fardo que não é bíblico. A Igreja não pode ser responsabilizada por um divórcio. “Aqueles irmãos se separaram por que a Igreja não os ajudou”. O fato é que as dinâmicas da relação daquele casal não estavam sendo encaminhadas segundo os termos da aliança divina. A Igreja não tem como forçar que um casal siga os termos do Pacto. Trata-se de uma iniciativa do casal e da família.
Além disso, não existe “Igreja” como objeto abstrato, fora de mim. Eu sou parte do corpo. Ao afirmar que a Igreja falhou, admito que eu falhei. A responsabilidade pelo meu fracasso é minha: “minha culpa, minha máxima culpa” (Sl 51.4).
Aplicações
A partir desse ponto, é possível pensar em algumas aplicações.
Primeiramente, é preciso rever prioridades. Eu preciso definir o que é mais importante em minha vida, o sucesso ou a piedade. O Salmo 127, nos seus dois primeiros versículos, ensina que Deus é quem edifica e sustenta o lar. Se assumimos um estilo de vida que nos impede de termos tempo para Deus, em família, não reclamemos quando, em nossa velhice, virmos nossos filhos e netos afastando-se do Senhor. Trabalho, estudos e carreira são importantes, mas Deus é imprescindível, central e fundamental. Se não entendemos isso, nossa vivência religiosa familiar não passa de casca frágil, insuficiente para resistir aos embates da fé. E isso é percebido por nossos cônjuges, filhos e netos.
A partir dessa compreensão de Deus como edificador e sustentador do lar, é preciso retomar as ordenanças do Senhor.
Adoração, oração e instrução em família (Gn 4.26). A família precisa voltar a invocar a Deus e a ser um espaço privilegiado de instrução sobre Deus. Por ocasião da instituição da Páscoa, Deus ordenou aos pais que aproveitassem cada celebração para ensinar aos filhos sobre os feitos divinos (Êx 12.26-27). Cada judeu deveria saber que o Senhor é o único Deus e isso tinha de ser ensinado pelos pais aos filhos, dentro de casa, em todo lugar e tempo (Dt 6.4-9). No Antigo Testamento, a ira de Deus recaiu sobre o sacerdote Eli, porque ele descuidou da correção de seus filhos (1Sm 1.12, 17, 2.22-25, 3.11-14). O lar é a instância estabelecida por Deus para ensino e amorosa disciplina (Pv 13.24, 23.13, 29.15; Ef 6.4).
Ademais, a liderança espiritual é masculina. Atualmente é comum homens não tomarem iniciativa espiritual e deixarem o culto e a oração sob os cuidados de suas esposas. São homens que não sabem ou não querem conduzir. Deus estabeleceu Abraão, e não Sara, como sacerdote de sua casa (Gn 18.19). Homens devem aprender a ser homens de Deus, guiando suas esposas e filhos no conhecimento da verdade. Os maridos são os responsáveis pela santificação de suas esposas (Ef 5.25-28) e de seus filhos (Jó 1.5).
Assim sendo, os pais devem ensinar os filhos a cultuar. Os filhos devem aprender o significado de “culto”, “ordem” e “reverência”, não apenas mecanicamente, mas de modo que amem a adoração. Os pais devem evitar o perigo da mentalidade de “culto infantil” como diversão. Os pais devem deixar, eles mesmos, de ser irreverentes, pois há adultos hoje que não conseguem ficar sentados por mais de 30 minutos ouvindo a Palavra de Deus. O problema de irreverência nos cultos — e conseqüente leviandade religiosa da nova geração — começa nos pais, que estão deixando eles mesmos de cultuarem e não ensinam seus filhos a prestarem verdadeira adoração.
Nesses termos, os pais precisam primar pela observância do Dia do Senhor. Isso não é opção, mas mandamento (Êx 20.8-11). O problema é que muitas famílias ditas cristãs dedicam o domingo ao lazer, ou ao trabalho ou ao ócio pagão. Sabem quem venceu a última corrida de Indianápolis mas desconhecem o que está sendo estudado na Escola Dominical. Comparecem somente aos cultos noturnos ou à Escola Dominical — participar de ambas as atividades dominicais é considerado muito trabalhoso. Há pais que recomendam que os filhos vão à Igreja mas eles mesmos ficam em casa e, para completar, há algo mais estranho ainda: pais que vêm à Escola Dominical e os filhos ficam em casa. Quando perguntamos onde está a criança, ouvimos dos pais: “ele não quer vir, prefere ficar em casa; em nosso lar nós não forçamos nossos filhos, entendemos que eles têm de fazer suas opções religiosas”. Já ouvi isso de mães de crianças de 9 anos. O ser “amadurecido” de 9 anos diz aos pais que não quer ir à Escola Dominical e os pais “compreensivos” concordam. Afinal de contas, não se deve forçar nada; a auto-estima da criança não poder ser prejudicada, mesmo que seja necessário desobedecer completamente ao 4º Mandamento. Quando esse menininho estiver “adultinho”, ele não vai levar o Cristianismo a sério. Daqui a cem anos, não haverá mais fé e a culpa não foi da Igreja, mas da família que não quis viver os termos da aliança.
É preciso ainda assumir que a disciplina e discipulado cristão começam na família, na relação cristã dos cônjuges e na educação dos filhos (Ef 6.4).
Os pais assumiram compromissos no momento do batismo. Disseram que iam empenhar-se para que os filhos compreendessem que não existe nenhuma outra opção além do Senhor e da fé bíblica. A Igreja assume jurisdição sobre a criança até os 18 anos e, depois disso, se ela não foi evangelizada e discipulada em casa e, por conseguinte, não professou a fé, deixa de ser membro da igreja.
No discipulado da família, é preciso atentar para o ensino informal, transmitido nas conversas cotidianas. Somos tentados a encaminhar mexericos e falas maldosas sobre a igreja, diante dos filhos. Isso é um pecado grave, que produz uma geração de cínicos (Êx 20.16; Lv 19.16; Pv 20.19; Tg 3.6). No Art. 14 da Constituição da Igreja Presbiteriana, lemos que um dos deveres dos membros é sustentar a Igreja moral e financeiramente. Sustento moral tem a ver com “não falar mal”, “não denegrir”. Quando isso é desconsiderado os filhos crescem e, ao invés de amarem a Deus, a Igreja e os líderes, se tornam críticos da denominação, dos pastores, dos presbíteros, dos diáconos, dos líderes de departamentos, dos programas, do modo como a Igreja funciona e faz as coisas. O resultado final é um endurecimento ao evangelho. Depois de uma geração, não existirá mais fé.
Por último, os pais devem ser exemplos de piedade (1Co 11.1). Quantas vezes seu filho entrou sem avisar em seu quarto, e flagrou você orando? Quantas vezes suas filha flagrou você estudando a Palavra de Deus? Você já evangelizou alguém com seu filho ou filha? Seus filhos podem enxergar em você um modelo de homem ou mulher de Deus? Você é consistente com seu testemunho cristão dentro de casa ou é adepto da filosofia “faça ou que digo mas não faça o que eu faço”?
Conclusão
Irmãos, tudo isso é por demais solene. Desejamos desfrutar da graça de Deus e queremos o mesmo para nossos filhos. Oramos para que Deus confirme, em nós a promessa feita a Abraão, de ser o Deus de nossa descendência (Gn 17.7).
O que fazer, porém, se nosso lar está se deteriorando? O que fazer se nossos familiares estão ouvindo a Palavra há anos e as coisas vão de mal a pior?
Isso é por demais sério, pois, se sua família — e isso inclui você — não se interessa por Deus nem pelas coisas de Deus, apesar de todas as divinas admoestações, isso pode indicar que o Senhor os está reservando para juízo (1Sm 2.22-25).
Eu creio, porém, que o fato de você estar aqui hoje, ouvindo essa palavra, indica que Deus tem uma intenção bondosa para com você. Deus deseja alterar as coisas em sua vida e em seu lar, nos termos da palavra dada pelo profeta Isaías:
Desperta, desperta, levanta-te, ó Jerusalém, que da mão do SENHOR bebeste o cálice da sua ira, o cálice de atordoamento, e o esgotaste. De todos os filhos que ela teve nenhum a guiou; de todos os filhos que criou nenhum a tomou pela mão. Estas duas coisas te aconteceram; quem teve compaixão de ti? A assolação e a ruína, a fome e a espada! Quem foi o teu consolador? Os teus filhos já desmaiaram, jazem nas estradas de todos os caminhos, como o antílope, na rede; estão cheios da ira do SENHOR e da repreensão do teu Deus. Pelo que agora ouve isto, ó tu que estás aflita e embriagada, mas não de vinho. Assim diz o teu Senhor, o SENHOR, teu Deus, que pleiteará a causa do seu povo: Eis que eu tomo da tua mão o cálice de atordoamento, o cálice da minha ira; jamais dele beberás; pô-lo-ei nas mãos dos que te atormentaram, que disseram à tua alma: Abaixa-te, para que passemos sobre ti; e tu puseste as costas como chão e como rua para os transeuntes.
Desperta, desperta, reveste-te da tua fortaleza, ó Sião; veste-te das tuas roupagens formosas, ó Jerusalém, cidade santa; porque não mais entrará em ti nem incircunciso nem imundo. Sacode-te do pó, levanta-te e toma assento, ó Jerusalém; solta-te das cadeias de teu pescoço, ó cativa filha de Sião.
Is 51.17-52.2.
Em suma, Deus está nos mostrando a necessidade de nos despertarmos e orarmos por um avivamento. Ele é o Senhor sobre nossas famílias. Só ele pode nos confirmar na fé e nos abençoar. Vamos orar.
Estudo bíblico ministrado no piquenique do Dia do Trabalho (1 de maio de 2006). E-mail para Rev. Misael: misael@ipcg.org.br.
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