Natal – mãe de todas as festas

Autor: Autor Desconhecido
Este título é tirado duma homilia de S. João Crisóstomo que gostava de o repetir, chamando à Natividade de Cristo a festa mais digna e mais importante de todas as festas.

Pondo de lado outras etiquetas, porventura simplistas, gostaríamos de reflectir um pouco sobre o mistério do Nascimento do Filho de Deus e, sobretudo, sobre este ponto: a origem histórica do ciclo Natal/Epifania.

Hamman, introduzindo uma bela colectânea de textos antigos, observa que a festa da Epifania constitui para os Padres Antigos um momento capital do mistério natalício. A Epifania está para o Natal como o Pentecostes está para a Páscoa: a manifestação em pleno dum mistério já revelado: Cristo proclamado a todo o universo!

O Advento simboliza as esperanças, o Natal a encarnação de Jesus e ainda os desposórios da natureza divina com a natureza humana. A Epifania restitui ao Deus voluntariamente humilhado o brilho da Sua glória que permanecera oculto. E ao mesmo tempo deixa a salvação individual à disposição de cada homem, seja ele judeu ou pagão.

ORIGEM E DATA DO NATAL/EPIFANIA

Nos primeiros séculos da Igreja, não só não havia tradição certa sobre a data do Nascimento de Cristo, mas nem sequer se celebrava a festa.

Em meados do séc. IV encontramos em Roma o primeiro documento autêntico que consiste num calendário litúrgico rudimentar (a Depositio Martyrum de Furius Philocalus), remontando ao ano 336, onde podemos ler: “VIII Kal. Ian. natus Christus in Betleem Iudaee,” quer dizer, a vinte e cinco de Dezembro, nasceu Cristo em Belém da Judeia.

É muito natural que os romanos desconhecessem a Epifania celebrada no Oriente a 6 de Janeiro. Mas, a nossa provável vizinha ga1ega Etéria, que andou pelo Egipto, Ásia Menor e Palestina nos fins do séc. IV ou princípios do séc. V e descreveu, de uma forma muito minuciosa, os ofícios litúrgicos de Belém e da Cidade Santa, menciona esta data na sua famosa Peregrinação, como a festa do Nascimento de Cristo.

COMO SE FIXOU ESTA DATA

Uma hipótese antiga, retomada em nossos dias, faz supor que a Igreja quis substituir a festa pagã celebrada em honra do Sol Invicto, Mitra vencedor das trevas.

De facto, o Calendário Civil anota que no ano 274 o imperador Aureliano tinha levantado ao suposto deus um magnífico templo, dedicado aliás taxativamente com jogos circenses de trinta quadrigas e sete voltas!

O facto não tem nada de inverosímil. A Igreja, em vez de desarraigar violentamente certos costumes inveterados, substitui-os inteligentemente por outros, praticamente equivalentes, expurgando-os do paganismo imediato e evidenciando o puro simbolismo cristão.

Os Padres e escritores eclesiásticos são omissos neste ponto e se relacionam o Natal de Cristo com o Sol nascido, desenvolvem apenas o conhecido texto bíblico de Malaquias (Orietur vobis Sol ustitiae), sem falarem para nada de Mitra, mas antes do Sol visível (Sol novus) que nasce com o solestício de Inverno, precisamente a 25 de Dezembro, “quando os dias começam a crescer”, como o nota Santo Agostinho.

Duchesne sugere outra hipótese que fixa o nascimento de Cristo a partir da presumível data cena da sua morte.

De facto, era opinião corrente desde os princípios do séc. III que o Redentor morrera a 25 de Março, conforme escreve Tertuliano. Diga-se, entretanto, que a data era criticamente insustentável, devendo-se apenas a considerações astronómico-simbólicas. Ora, tendo em vista o simbolismo dos números, então muito em voga, eliminadas as fracções imperfeitas, como era razão, concluiríamos que os anos inteiros de Cristo tinham logicamente de começar na Encarnação a 25 de Março. E, consequentemente, o Nascimento não podia ter sido senão, decorridos nove meses, a 25 de Dezembro.

É certo que falta a esta hipótese um testemunho explícito, a não ser a vaga alusão de S.to Agostinho, cerca do ano 400, que fala na tradição dos antigos – “sicut a maioribus traditum…”.

Entretanto o historiador Sozomeno, refere ainda Duchesne, fala de uma seita de Montanistas que celebravam a Páscoa a 6 de Abril, em vez de 25 de Março, porque, tendo sucedido a criação do mundo no equinócio, isto é, segundo eles, a 24 de Marco, a primeira lua cheia do primeiro mês devia cair catorze dias mais tarde ou seja a 6 de Abril. Ora bem, entre 6 de Abril e 6 de Janeiro decorrem precisamente nove meses, tal como sucede entre 25 de Marco e 25 de Dezembro.

A data grega do Natal a 6 de Janeiro fica assim ligada ao cômputo pascal, baseado em considerações simbólicas e astronómicas análogas às que, segundo fica referido, tinham originado a festa de 25 de Dezembro.

Estudando tais hipóteses, conclui Righeti ,pela probabilidade das duas, fazendo notar todavia que os liturgistas modernos preferem seguir neste particular a Dom Botte e adiantando por sua conta que, olhadas bem as coisas, tais suposições poderiam muito bem completar-se uma à outra.

Publicado no Jornal “Ecos da Matriz” de Janeiro/Fevereiro 2000

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