Movimentos de revitalização

Autor: Anthony F. C. Wallace
Universidade da Pennsylvania

Sumário: Os estudiosos das ciências humanas já descreveram muitos exemplos de tentativas de inovação em sistemas culturais inteiros, às vezes, bem sucedidos, ou pelo menos em porções substancias de tais sistemas. Muitas rubricas são empregadas, dependendo da disciplina e da orientação teórica do pesquisador, e das características locais mais salientes nos casos que escolheu estudar. “Movimento nativista”, “movimento reformista” “seita de carga”, “reavivamento religioso”, “movimento messiânico”, movimento social”, “comunidade utópica”, formação de seitas”, “movimento de massa”, “revolução”, “movimento carismático”, são alguns dos rótulos comumente usados. Este documento sugere que todos estes fenômenos de inovação do sistema cultural são caracterizados por um processo uniforme, para o qual proponho o termo “revitalização”. O corpo do documento é dedicado a dois fins: 1) uma introdução ao conceito de revitalização, e 2) um esboço de certas dimensões processuais uniformemente encontradas nos movimentos de revitalização.

As formulações são baseadas em maior parte nos dados documentários na maioria publicados. A pesquisa bibliotecária no projeto começou em 1951 com um estudo da nova religião iniciada por Lago Formoso, o profeta de Sêneca, entre a reserva Iroquois do século deze nove, Os materiais de Lago Formoso sendo insolitamente amplos (um número de jornais de manuscrito e diários foram encontrados) forneceram um padrão útil com o qual comparar os vários outros movimentos que têm sido investigados desde então. Nossos arquivos agora contêm referências para centenas de movimentos religiosos de revitalização, entre povos ocidentais como não-ocidentais, em 5 continentes. Isto representa somente uma pequena porção, reunidas num rápido exame preliminar da literatura antropológica. Um esforço cuidadoso para colecionar todos os movimentos de revitalização descritos em documentos históricos, antropológicos, dentre outros, iria sem dúvida ajuntar milhares. Os movimentos sobre os quais temos dados substanciais incluem na América do Norte, o caso de Lago Formosos (Sêneca, 1799-1815), o profeta Dalaware (associado com Pontiac, 1762-1765), o profeta Shawnee (associado com Tecumseh, 1805-1814), a Dança Fantasma (1888-1896), e Peyote; na europa, John Wesley e o metodismo primitivo (1738-1800); na África, a nova religião de Ikhnatonn (Egito antigo), o sudanês Mahdi (o Sudão, 1880-1898), e o Renascimento Xosa (África do Sul, 1856-1857); na Ásia, a origem do Cristianismo, a origem do Maometismo (c 610-650), o desenvolvimento primitivo, Sikhismo (Índia, c1500-1700) e a Rebelião Taiping (China, 1843-1864); na Melanésia, a Loucura de Vailala (Nova Guiné, c1919-1930); na América do Sul, uma série de movimentos terre sans mal entre as tribos da floresta, desde o antigo até os tempos recentes1.

Consequentemente, as formulações aqui apresentadas estão numa fase intermediária: uma espécie tem sido reconhecida e certas características (selecionadas, é claro, à luz dos interesses teóricos do autor) descritas, segundo o estilo da história natural. Mais descrições abstratas, em termos da interação das variáveis analíticas, só podem ser sugeridas aqui, e outros documentos irão apresentar detalhes da dinâmica no processo de revitalização.

O Conceito de Revitalização

Um movimento de revitalização é definido como um esforço deliberado, organizado e consciente dos membros de uma sociedadee para construir uma cultura mais satisfatória. A revitalização é então, do ponto de vista cultural, um tipo especial do fenômeno de mudança cultural: as pessoas envolvidas no processo de revitalização devem perceber sua cultura, ou algumas áreas principais dela, como um sistema; corretamente ou não devem sentir que este sistema cultural é insatisfatório; e eles devem inovar não meramente ítens discretos, mas um novo sistema cultural, especificando novos relacionamentos assim como, em alguns casos, novas características. Todos os processos clássicos de mudança cultural (por evolução, acaso, difusão, mudança histórica, ou aculturação) produzem mudanças nas culturas como sistemas; entretanto, eles não dependem de intento deliberado dos membros de uma sociedade, mas sim dum efeito gradual de reação em cadeia: introduzindo A, induz mudança em B; mudando B, afeta C; quando C muda, A é modificado; isto envolve D… e assim por diante. Este processo continua por anos, gerações, séculos, milênios, e sua penetração tem levado muitos teóricos culturais a considerar a mudança cultural um processo sendo essencialmente lento e autônomo, como uma cadeia, de inevitabilidades superorgânicas. Nos movimentos de revitalização, todavia, A, B, C, D, E… são mudados para uma nova Gestalt abrupta e propositalmente e muitas vezes dentro de poucos anos o novo plano é posto em ação pelos participantes do movimento. Nós podemos notar que a avaliação de Keesing sobre a literatura da mudança cultural (1953), enquanto não lide explicitamente com a questão teórica de efeitos da cadeia versus revitalização, discute ambos os tipos. Barnett (1953) francamente restringe sua discussão às inovações de alcance limitado no contexto das cadeias de eventos na aceitação e rejeição. Assim como Mead sugeriu, as culturas podem mudar dentro de uma geração (Mead, 1955) e o processo pelo qual tais transformações ocorrem é o processo de revitalização.

O termo “revitalização” implica numa analogia organísmica2. Esta analogia é, de fato, uma parte integral do conceito de revitalização. Uma sociedade humana é aqui considerada como um tipo definitivo de organismo, e sua cultura é concebida como padrões de comportamento aprendido que certas “partes” do organismo ou sistema social (pessoas e grupos de pessoas) caracteristicamente manifestam. Um corolário da analogia organísmica é o princípio da homestase; que uma sociedade irá funcionar, por meio de ações coordenadas (incluindo ações “culturais”) por todas ou algumas partes, para preservar sua própria integridade, mantendo uma matriz de sustentação de vida com pouca flutação para seus membros individuais, e irá sob pressão, tomar medidas de emergência para preservar a constância desta matriz. O “stress” é definido como uma condição em que alguma parte, ou toda, do organismo social é ameaçada de forma que produziria prejuízo mais ou menos. A percepção do “stress”, particularmente do “stress” crescente, pode ser vista como um denominador comum do painel de “impulsos” ou “instintos” das toda teorias psicológicas.

Segundo meu uso da analogia organísmica, o sistema total que constitui uma sociedade inclui como partes significantes não só pessoas e grupos com seus respectivos padrões de comportamento, mas também literalmente as células e órgãos dos quais as pessoas são compostas. De fato, alguém poderia argumentar que além do susbsistema humano o sistema inclui o subsistema não humano. O “stress” em um nível implica em “stress em todos os níveis. Por exemplo, a dimunuição do nível de açúcar (fome) no fluido da matriz das células do corpo de um grupo de pessoas numa sociedade é um “stress”na sociedade como um todo. Esta percepção holística da sociedade como organismo integrado desde a célula até a nação, depende da pressuposição de que a sociedade, como uma organização da matéria viva, seja definível como uma rede de intercomunicação. Os eventos no nível de um subsistema devem afetar outros subsistemas (celular vis-à-vis institucional, pessoal vis-à-vis social) pelo menos como informação; de acordo com este ponto de vista, a organização social existe se os eventos em um subsistema são informações a outros subsistemas.

Há uma diferença crucial entre os princípios da organização social e os da pessoa individual; as partes de uma sociedade são amplamente permutáveis, as duma pessoa são pouco permutáveis. As células do sistema nervoso central, por exemplo, exercem muitas funções como a de coordenar informações e executar ações adaptativas que outras células não podem fazer. Uma sociedade, por outro lado, tem uma capacidade de substituição múltipla, tal que muitas pessoas podem exercer as funções análogas de informação/coordenação e execução em favor da sociedade-como-organismo. Além disso, essa regularidade de comportamento padronizado a que chamamos de cultura, depende relativamente mais da habilidade de unidades constituintes autonomamente que percebam o sistema do qual elas são uma parte, recebamr e transmitam informação, e ajam de acordo com as necessidades do sistema, do que de qualquer administração central abrangente que estimule partes especializadas para realizarem suas funções.

É então funcionalmente necessário que toda pessoa na sociedade mantenha uma imagem mental da sociedade e sua cultura, assim como de seu próprio corpo e suas regularidades comportamentais, a fim de agir de modo que reduza o stress em todos os níveis do sistema. A pessoa, de fato, mantém tal imagem. Esta imagem mental eu chamei de “labirinto”, já que como um modelo do sistema, organizado pela própria experiência do indivíduo, ele inclui percepções do labirinto dos objetos físicos do ambiente (interno e externo, humano e não-humano) e labirinto pode ser manipulado pelo indivíduo e por outros a fim de minimizar o stress. O labirinto é natureza, sociedade, cultura, personalidade e imagem corporal, como visto por uma pessoa.

Podemos agora ver mais claramente o que os “movimentos de revitalização” revitalizam. Quando um indivíduo que está sob stress crônico, e fisiologicamente mensurável, recebe informações repetidas que indicam que seu labirinto não leva à ação que reduz o nível de stress, ele deve escolher entre manter seu labirinto presente e tolerar o stress ou mudar o labirinto numa tentativa de reduzir o stress. Mudar o labirinto envolve a mudança total da Gestalt da sua auto imagem, da imagem da sociedade, da cultura, da natureza e do corpo, e das maneiras de agir. Também pode ser necessário fazer mudanças no sistema “real” a fim de trazer o labirinto e a “realidade” a uma congruência. O esforço para fazer uma mudança no labirinto e no sistema “real” juntos, para permitir maior redução efetiva do stress é o esforço para a revitalização; e a colaboração de pessoas em tal esforço é chamada de movimento de revitalização.

Então o termo “movimento de revitalização”, denota uma classe muito grande de fenômenos. Outros termos são empregados na literatura existente para denotar o que eu chamarei de subclasses, distinguidos por uma miscelânia de critérios. “Movimentos nativistas”, por exemplo, são movimentos de revitalização caracterizados por uma forte ênfase na eliminação de pessoas, costumes, valores, e/ou materiais estrangeiros do labirinto (Linton 1943). Os movimentos de “revitalização”enfatizam a instituição de costumes, valores, e até aspectos da natureza que pensa-se que já tenham feito parte do labirinto de gerações prévias mas que agora não estejam presentes (Mooney 1892-93). As “seitas de carga” enfatizam a importação dos valores, costumes e material estrangeiros no labirinto, sendo que estas coisas são esperadas, como uma carga de navio, servindo de exemplo a “Loucura de Vailala” (Williams 1923, 1934). Os “movimentos vitalísticos” enfatizam a importação dos elementos estrangeiros no labirinto mas nem sempre invocam um navio e carga como mecanismo3. Os “movimentos milenares” enfatizam a transformação de labirinto numa transformação do mundo apocalíptica engendrada pelo sobrenatural. Os “movimentos messiânicos”enfatizam a participação dum salvador divino em carne humana na transformação de labirito (Wallis 1918, 1943). Estes termos e outros paralelos não denotam categorias mutuamente exclusivas, pois um dado movimento de revitalização pode ser nativista ou milenar, messiânico, e de reavivamento ao mesmo tempo; e ele pode exibir ambivalência com relação aos temas nativistas, de reavivamento, e de importação (de fato, geralmente o faz).

Evidentemente os movimentos de revitalização não são fenômenos incomuns, mas são recorrentes na história humana. Provavelmente são poucas as pessoas que viveram sem se envolver num processo de revitalização. Eles são, além disso, de uma importância histórica profunda. Tanto o cristianismo como também o islamismo, e possivelmente o budismo também, se originaram em movimentos de revitalização. A maioria dos grupos denominacionais e sectários e as ordens nasceram ou se dividiram depois do fracasso em revitalizar uma instituição tradicional. Pode-se questionar se uma grande proporção dos fenômenos religiosos não se originararam em sonhos de transformação de personalidade ou visões características do processo de revitalização. Muitos mitos, lendas, e rituais podem ser relíquias ou do conteúdo manifesto dos sonhos-visões ou das doutrinas e história das seitas de reavivamento e de importação, cujas circunstâncias de origem se distorceram ou foram esquecidas, e cuja conexção com os estados de sonho é agora ignorada. Os mitos, em particular, há muito tempo se notou que possuem uma qualidade de sonho, e tem sido interpretados mais ou menos especulativamente, de acordo com os princípios da interpretação do sonho sintomático. É uma tentação sugerir que os mitos, e muitas vezes, até lendas, parecem como sonhos porque de fato eram sonhos quando foram contados pela primeira vez. É uma tentação argumentar, mais ainda, que os heróis da cultura representam uma condensação da figura do profeta e do ser sobrenatural com quem ele sonhou.

De fato, pode-se argumentar que todas as religiões organizadas são relíquias de movimentos de revitalização antigos, sobrevivendo em forma rotinizada nas culturas estabilizadas, e que o fênomeno religioso em si originou-se (se ainda é permitido nos dias de hoje falar sobre as “origens” dos principais elementos da cultura) no processo de revitalização – i.e., nas visões de um novo modo de vida por indivíduos sob extremo stress.

A estrutura processual

Um princípio básico metodológico empregado neste estudo é aquele da análise dos eventos (Wallace 1953). Esta perspectiva emprega um método de comparação controlada para o estudo dos processos envolvendo sequências diacrônicas maiores ou menores (vide Eggan 1954 e Steqard 1953). Está postulado que eventos ou acontecimentos de vários tipos têm estruturas genotípicas independentes de diferenças culturais locais; por exemplo, que a sequência de acontecimentos se após um desastre físico severo em cidades do Japão, Estados Unidos, e Alemanha, irá exibir um modelo uniforme, colorido mas não obscurecido pelas diferenças culturais. Estes tipos de eventos podem ser chamados de unidades de comportamento. Sua uniformidade é baseada nos atributos genéricos humanos, tanto físicos quanto psicológicos, mas é necessário um estudo analítico e comparativo extenso para elucidar a estrutura de qualquer um deles. Os movimentos de revitalização constituem tal unidade de comportamento, e então, num nível menor de abstração, também os vários subtipos dentro da classe maior, tais como cultos de carga e reavivamento. Nós estamos, então, interessados em descrever a estrutura genérica dos movimentos de revitalização considerados como uma unidade de comportamento, e também da variação das dimensões características do tipo.

A estrutura do processo de revitalização, nos casos de percurso total consiste de cinco fases da alguma forma que de certo modo se sobrepõem: 1) o estado estável; 2) o período de stress individual; 3) o período de distorção cultural; 4) o período de revitalização (em que ocorrem as funções da reformulação do labarinto, comunicação, organização, adaptação, transformação cultural e rotinização), e finalmente, 5) o novo estado estável. Estas fases são descritas brevemente nas seções seguintes.

I. O estado estável. Para a vasta maioria da população, técnicas, culturalmente reconhecidas para satisfazer as necessidades operam com tanta eficiência que o stress crônico dentro do sistema varia dentro de limites toleráveis. Algum stress severo, mas ainda tolerável, pode permanecer de forma geral na população, e uma incidência razoavelmente constante de pessoas sob, o que seria para elas, stress intolerável pode empregar técnicas “divergentes” (e.g., psicóticas). A modificação gradual ou até a substituição rápida de técnicas para satisfazer algumas necessidades pode ocorrer sem perturbar o estado estável, desde que: 1. não se interfira seriamente com as técnicas para satisfazer outras necessidades, e 2. o abandono de uma dada técnica para reduzir uma necessidade em favor de uma técnica mais eficiente não deixe outras necessidades, que a primeira técnica tenha sido também instrumental em satisfazer, sem qualquer prospecto de satisfação.

II. O período de stress individual crescente. Por muitos anos, os membros individuais de uma população (que pode ser “primitiva” ou “civilizada”, ou toda uma sociedade ou uma classe casta, grupo religioso, ocupacional, em processo de aculturação, ou outro grupo social definível) experimentam um stress cada vez mais severo, como resultado da eficiência decrescente de certas técnicas para redução do stress. A cultura pode permanecer essencialmente imutável ou ela pode sofrer consideráveis mudanças, mas em qualquer um dos casos há uma contínua diminuição em sua eficiência para satisfazer as necessidades. As agências responsáveis pela interferência na eficiência do sistema cultural são várias; mudança de flora, fauna, clima; derrota militar; subordinação política; pressão extrema para a aculturação, resultando num conflito interno cultural; problemas econômicas; epidemias; e assim por diante. Muitas vezes, mas não necessariamente, a situação é uma aculturação, e os agentes aculturadores podem ou não ser representantes de culturas européias ocidentais. Embora o indivíduo possa tolerar um grau moderado de aumento de stress, e ainda manter sua maneira habitual de se comportar, chega-se a um ponto em que algum modo alternativo deve ser considerado. Entretanto, uma consideração inicial de um modo substituto provávelmente aumentará o stress porque aumenta a ansiedade sobre a possibilidade de que o modo substituto sejá menos efetivo que o original, e que ele possa também interferir ativamente com a execução de outros modos. Em outras palavras, ele representa a ameaça da desintegração do labirinto. Além disto, a admissão de que uma técnica principal é inútil, é extremamente ameaçadora porque implica que todo o sistema do labirinto pode ser inadequado.

III. O período da distorção cultural. Pessoas diferentes respondem de modo muito diferente à experiência prolongada do stress, produzida pelo fracasso das técnicas em satisfazer as necessidades e pela ansiedade sobre o processo de padrões comportamentais que estão mudando. As pessoas rígidas aparentemente preferem tolerar altos níveis de stress crônico ao invés de fazer mudanças adaptativas sistemáticas no labirinto. As pessoas mais flexíveis tentam várias mudanças limitadas de labirinto nas suas vidas pessoais, tentanto reduzir o stress através da adição ou substituição dos elementos de labirinto com mais ou menos interesse pela Gestalt do sistema. Algumas pessoas se voltam a inovações psicologicamente regressivas; a resposta regressiva empiricamente se exibe nas incidências crescentes comportamentos tais como o alcoolismo, extrema passividade e indolência, o desenvolvimento dos relacionamentos de dependência altamente ambivalentes, violência intragrupal, desprezo de regras costumeiras quanto ao parentesco e ao sexo, irresponsabilidades nos oficiais públicos, estados de depressão e auto-censura, e provavelmente uma variedade de desordens psicossomáticas e neuróticas. Alguns desses sistemas de ação regressivos se tornam, com efeito, novos padrões culturais.

Nesta fase, a cultura está internamente distorcida; os elementos não se relacionam harmonicamente mas são mutuamente inconsistentes e interferentes. Por esta razão somente, o stress continua aumentando. O comportamento “regressivo”, como é definido pela sociedade, irá trazer consigo o senso de culpa e então aumentar o nível de stress ou pelo menos mantê-lo num alto nível; e o processo geral da substituição cultural por partes irá multiplicar as situações de conflito mútuo e de mal entendido que por vez aumentará o nível de stress novamente.

Finalmente, à medida que a inadequação dos modos existentes de agir para reduzir o stress se torna mais e mais evidente, e que as incongruências internas do labirinto são percebidas, sintomas de ansiedade sobre a perda de um modo de vida significativo, também se tornam evidentes; logo vêm a desilusão com o labirinto e a apatia para com os problemas de adaptação.

IV. O período de revitalização. Este processo de deteriorização pode , se não for checado, levar à morte da sociedade. A população pode cair até o ponto de extinção, como resultado das crescentes taxas de morte e as decrescentes taxas de natalidade; a sociedade pode ser derrotada na guerra, invadida, sua população dispersada e seus costumes suprimidos; as disputas de facções podem devorar áreas e segmentos da população. Mas estes terríveis eventos são frequentemente evitados, ou pelo menos adiados, por um movimento de revitalização. Muitos dos tais movimentos são de caráter religioso, e tais movimentos de revitalização religiosa devem realizar pelo menos seis tarefas principais:

1. A reformulação do labirinto. Quer o movimento seja religosos ou secular, a reformulação do labirinto geralmente parece depender da reestruturação dos elementos e subsistemas que já aceitos ou mesmo em uso na sociedade, e que sejam conhecidos pela pessoa que irá se tornar um profeta ou líder. A ocasião da sua combinação numa forma que constitui uma estrutura internamente consistente, e da sua aceitação pelo profeta como guia para a ação, é abrupta e dramática, geralmente ocorrendo como um momento de insight, um breve período de consciência dos relacionamentos e oportunidades. Estes momentos são muitas vezes chamados de inspiração ou revelação. A Reformulação também parece ocorrer normalmente em sua forma inicial na mente de uma só pessoa ao invés de crescer diretamente das deliberações dos grupos.

Com raras excessões, todos os movimentos de revitalização religiosa que conheço foram originalmente concebidos em uma ou várias visões alucinatórias por uma só pessoa. Um ser sobrenatural aparece à pessoa que se tornará um profeta, explica os seus próprios problemas e os da sociedade como sendo inteira ou parcialmente resultado da violação de certas regras, e promete revitalização social e individual se as injunções forem seguidas e os rituais praticados, e ao mesmo tempo uma catástrofe social e pessoal, se não. Estes sonhos expressam: 1) o desejo do sonhador de uma figura paterna satisfatória (o conteúdo sobre o espírito-guardião sobrenatural), 2) fantasias sobre a destruição do mundo (o conteúdo milenar, apocalíptico), 3) sentimentos de culpa e ansiedade (o conteúdo moral), e 4) desejos do estabelecimento de um estado ideal de relações estáveis e satisfatórias entre seres humanos e o sobrenatural (o conteúdo utópico ou de fantasia de restituição. Num sentido, tal sonho também funciona quase como um ritual fúnebre: o modo “morto” da vida é reconhecido como morto; os interesses se voltam para um deus, para a comunidade, e para um novo meio. Uma nova Gestalt do labirinto é apresentada, com mais ou menos inovações nos detalhes do conteúdo. O profeta sente uma necessidade de contar a outros sobre a sua experiência, e pode ter sentimentos definidos de obrigação missionária ou messiânica. Geralmente, ele mostra evidências de uma mudança radical interior na personalidade logo após a experiência da visão: uma remissão de velhas reclamações e problemas físicos crônicos, um modo de vida mais ativo e com propósito, maior confiança nas relações interpessoais, o abandono total de hábitos consolidados como o alcoolismo. Portanto podemos chamar estas visões de “sonhos de transformação da personalidade”.

2. Comunicação – O sonhador se empenha em pregar suas revelações às pessoas, num espírito evangelístico ou messiânico; ele se torna um profeta. As injuções de comportamento e de doutrina que ele prega giram em torno de dois temas fundamentais: que o convertido ficará sob os cuidados e proteção de certos seres sobrenaturais; e que tanto ele quanto sua sociedade irão se beneficiar materialmente de uma identificação com algum sistema cultural novo definível (quer seja uma cultura revivificada ou uma seita de carga ou um sincretismo de ambos, como é geralmente o caso). A pregação pode ter muitas formas (e.g., exortação de massa vs. persuasão individual silenciosa) e pode ser dirigida a vários tipos de audiência (e.g., a elite ou o povo). À medida que ele consegue discípulos, estes assumem muita da responsabilidade de comunicar a “boa nova”, e a comunicação continua sendo uma das atividades primordiais do movimento durante as fases posteriores de organização.

3. Organização – É o profeta que consegue convertidos. Alguns ficam histéricos, induzidos pela sugestão da multidão; alguns têm uma visão extática em particular; alguns são convencidos por argumentos mais ou menos racionais, alguns por considerações de vantagem e oportunidade. Um pequeno grupo de discípulos especiais (muitas vezes incluindo alguns homens já influentes) se agrupam ao redor do profeta e uma organização de campanha embriônica se desenvolve com três ordens de pessoal: o profeta, os discípulos, e os seguidores. Freqüentemente o programa de ação é efetivamente administrado a partir daí em grande parte por uma liderança política ao invés de religiosa. Como o profeta, muitos dos convertidos passam por uma transformação revitalizante da personalidade.

O conceito de Max Weber sobre “liderança carismática” descreve bem o tipo de relacionamento do seguidor com o líder, característico das organizações dos movimentos de revitalização (1947). O elemento fundamental da visão, como eu já indiquei acima, é a entrada do visionário num relacionamento com o sobrenatural. Além disso, neste relacionamento o profeta aceita a liderança, o auxílio, e a dominância do sobrenatural. Muitos dos seguidores de um profeta, especialmente os discípulos, também têm experiências revelatórias extasiantes; mas eles e todos os seguidores sinceros que não tiveram uma revelação pessoal também entram num relacionamento paralelo com o profeta: como Deus está para o profeta, assim (quase) o profeta está para os seus seguidores. O relacionamento do seguidor com o profeta é provavelmente determinado pelo deslocamento da transferência de desejos de dependência para sua imagem; ele é considerado como uma pessoa misteriosa, de uma autoridade inquestionável em uma ou mais esferas de liderança, sancionada pelo sobrenatural. Max Weber denota esta qualidade de autoridade misteriosa e ascendência moral num líder como carisma. Os seguidores submetem-se ao líder carismático, não por causa do seu status numa estrutura de autoridade existente, mas por causa de um “poder” pessoal fascinante, a que se atribuem origens sobrenaturais e que são validadas por um desempenho de sucesso, semelhante ao “maná” ou “orenda” da literatura etnológica. Portanto, não apenas se permite, mas se espera que o líder carismático expresse seu apelo aos aderentes, como uma demanda a desempenhar um dever para com um poder superior ao humano. Weber indica corretamente que a “rotinização” do carisma é uma questão crítica na organização do movimento, porque se este “poder” não for distribuído a outras pessoas numa estrutura institucional estável, o movimento em si estará sujeito a morrer, com a morte ou fracasso do profeta individual, rei, ou senhor de guerra.

4. Adaptação. O movimento é uma organização revolucionária e quase que inevitavelmente irá encontrar alguma resistência. A resistência pode em alguns casos ser leve e passageira mas é mais comumente determinada e fértil em recursos, e é mantida ou por uma facção poderosa dentro da sociedade ou por agentes de uma sociedade estrangeira dominante. O movimento pode então ter que usar várias estratégias de adaptação: modificação doutrinária;; manobra política e diplomática; e força. Estas estratégias não são mutualmente exclusivas nem, uma vez escolhidas, são necessariamente mantidas durante todo o movimento. Na maioria dos casos, a doutrina original é continuamente modificada pelo profeta, que responde à várias críticas e afirmações através da adição, da ênfase, da diminuição e da eliminação de alguns elementos selecionados das visões originais. Esta reconstrução deixa a nova doutrina mais aceitável para os grupos de interesses especiais, pode lhe dar um melhor “ajuste” aos padrões de personalidade e de cultura da população, e pode levar em conta as mudanças ocorrendo no contexto geral. Nos casos onde a hostilidade organizada ao movimento se desenvolve, uma cristalização de contra-hostilidade contra incrédulos ocorre frequentemente, e a ênfase muda da cultivação do ideal para o combate contra o incrédulo.

5. Transformação Cultural. Quando a população ou uma parte dominante dela aceita a nova religião com suas várias injunções, uma revitalização social notável ocorre, marcada pela redução dos sintomas de deterioração pessoal dos indivíduos, por mudanças culturais extensivas, e por uma adesão entusiástica a algum programa organizado de ação de grupo. Este programa de grupo pode, entretanto, ser mais ou menos realista e mais ou menos adaptativo: alguns programas são literalmente suicidas; outros representam projetos bem sucedidos e bem concebidos de mais reforma social, política, ou econômica; alguns falham, não devido a alguma deficiência na concepção ou execução, mas porque as circunstâncias tornam a derrota inevitável.

6. Rotinização. Se o programa de ação de grupo nas esferas não rituais consegue em reduzir as situações geradoras de stress, ele se estabelece como normal em várias instituições e costumes políticos, econômicos, e sociais. Raramente, a organização do movimento declara ou mantém um controle totalitário sobre todos os aspectos da cultura transformada; frequentemente uma vez que a transformação desejada tenha ocorrido, a organização contrata e mantém responsabilidade somente pela preservação da doutrina e pelo desempenho do ritual (i.e., torna-se uma igreja).

V. O Novo Estado Estável. Uma vez que a transformação cultural tenha se realizado e o novo sistema cultural tenha se mostrado viável, e uma vez que a organização do movimento tenha resolvido seus problemas de rotinização, pode-se dizer que um novo estado estável existe. A cultura deste estado provavelmente será diferente em padrão, organização ou Gestalt, bem como nos traços, do estado estável anterior; será diferente da cultura do período de distorção cultural.

Variedades e Dimensões da Variação

Eu explorarei quatro das muitas variações possíveis: a escolha da identificação, a escolha dos meios seculares e religiosos; nativismo; e o contínuo sucesso-fracasso.

1. A escolha da identificação. Três variedades já foram distinguidas com base nas diferenças de escolha da identificação: movimentos que professam reavivar uma cultura tradicional já caída em desuso; movimentos que professam importar um sistema cultural estrangeiro; e movimentos que não professam nem reavivamento e nem importação, mas que concebem que o estado final desejado para a cultura, que nunca foi desfrutado por ancestrais ou estrangeiros, será realizado pela primeira vez num futuro utópico. O Ghost Dance (A Dança Fantasma), o Reavivamento Xosa, e a Rebelião Boxer são professamente exemplos de movimentos de reavivamento; a Loucura de Vailala (e outras seitas de carga) e a Rebelião Taiping são professamente exemplos de movimentos de importação. Algumas formulações como a seita monoteísta de Ikhnaton no velho Egito e muitos programas utópicos, negam qualquer dívida substancial para com o passado ou o estrangeiro, mas concebem sua ideologia como algo completamente novo e sua cultura como pertencendo ao futuro.

Diferentes regiões culturais parecem ter maneiras características de lidar com o problema da identificação. A fantasia de carga, embora possa ser encontrada fora da área da Melanésia, parece encontrar seu lar nesta região; os profetas índios da América do Sul frequentemente pregavam sobre a migração para um céu-na-terra, livre de espanhóis e outros males , mas a fantasia da terra prometida é conhecida em outros lugares; os profetas índios da América do Norte mais comumente enfatizavam o reavivamento da velha cultura pela purificação moral e ritual, mas idéias de reavivamento de purificação existem em outras regiões também. A “necessidade” estrutural ou fatores de situação associados a uma área cultural podem ser os responsáveis. O contraste entre os relacinamentos nativo-branco na América do Norte (uma área de “reavivamento”) e na Melanésia (uma área de “importação”) pode estar associado com o fato de que os índios americanos ao norte do México nunca foram escravizados em grande escala, forçados a trabalhar em plantações, ou recrutados para o trabalho em troca de impostos, enquanto os melanésios foram muitas vezes sujeitos à pressão mais direta pela polícia estrangeira. A resposta melanésia foi uma identificação com o agressor (vide Bettelheim 1947). Por outro lado, os índios americanos foram menos dominados como indivíduos pelos brancos, mesmo em situações de derrota e injustiça. Sua resposta a esta situação diferente foi em grande parte uma identificação com um passado mais feliz. Isto sugere que uma variável importante na escolha da identificação é o grau de dominação exercido por uma sociedade estrangeira, e que os movimentos de revitalização orientados para a importação não irão se desenvolver até que um grau extremamente alto de dominação seja alcançado.

2. A Escolha dos Meios Seculares e Religiosos. Há duas variáveis envolvidas aqui; a quantidade de ação secular que há num movimento, e a quantidade de ação religiosa. A ação secular é aqui definida como a manipulação dos relacionamentos humanos; a ação religiosa como a manipulação dos relacionamentos entre seres humanos e o sobrenatural. Nenhum movimento de revitalização pode, por definição, ser verdadeiramente não-secular, mas alguns podem ser relativamente menos religiosos que outros, e os movimentos podem mudar de ênfase dependendo das mudanças de circunstâncias. Há uma tendência, que está implícita na discussão anterior sobre as fases, dos movimentos se tornarem mais políticos na ênfase, e agirem através de instituições seculares ao invés de religiosas, com o aumento das pressões oriundas dos problemas de organização, adaptação, e rotinização. A rebelião Taiping, por exemplo, começou como movimentos de interesse religioso; a oposição pela dinastia Manchu e pelos poderes estrangeiros a forçou a se tornar mais e mais política e militar na sua orientação.

Alguns poucos movimentos “puramente” políticos como a facção herbertista durante a revolução francesa, e o movimento comunista russo e seus derivados foram oficialmente ateístas, mas a qualidade da doutrina e dos relacionamentos entre líder e seguidor é tão semelhante, pelo menos ao nível superficial, à doutrina religiosa e às relações entre os seres humanos e o sobrenatural, que pode-se imaginar se não é uma distinção sem nenhuma diferença. Os movimentos comunistas são comumente identificados como tendo a qualidade de movimentos religiosos, embora não apelem para uma comunidade sobrenatural; e coisas como o desenvolvimento de um evangelho marxista com uma exegese elaborada, o embalsamento de Lenin e a preocupação com a conversão, confissão, e pureza moral (como definidos pelo movimento) tem as marcas distintivas da religião. A Revolução Comunista de 1917 na Rússia foi quase típica, em estrutura, dos movimentos de revitalização religiosa: havia uma sociedade muito doente, os profetas apelaram para uma autoridade venerada (Marx), fantasias utópicas e apocalípticas foram pregadas e o fervor missionário animou os líderes. Além disto, muitos movimentos de reforma social e política, embora não sejam ateístas, atuam através de meios seculares ao invés de religiosos e invocam a sanção religiosa apenas superficialmente. Não desejo elaborar a discussão agora, entretanto, além do ponto de sugerir novemente que as distinções óbvias entre os movimentos religiosos e seculares podem ocultar semelhanças fundamentais do processo sócio-cultural e da psicodinâmica, e que embora nem todos os profetas seculares tenham tido visões de transformação da personalidade, alguns provavelmente tiveram, e outros tiveram uma experiência semelhante na conversão ideológica.

As questões humanas ao redor do mundo parecem ser mais e mais comumente decididas sem referência a poderes sobrenaturais. É uma pergunta interessante se a humanidade pode dispensar com sucesso o elemento essencial que é o processo de revitalização religiosa antes de alcançar uma utopia sem stress ou tensão. Embora os movimentos religiosos possam envolver emoções primitivas e poderosas e fantasias irracionais de interação com seres não-existentes, e possam de vez em quando levar a conseqüências práticas infelizes nas relações humanas, as mesmas fantasias e emoções poderiam levar a conseqüências práticas ainda piores para a paz mundial e a prosperidade humana quando direcionadas a pessoas impropriamente percebidas e a órgãos de ação política e ideologias culturais. A resposta pareceria ser que como cada vez menos homens fazem uso do processo de deslocamento religioso, terá de haver uma redução correspondente da incidência e severidade da neurose de transferência, ou os relacionamentos humanos serão cada vez mais contaminados por desordens de caráter, demonstrações neuróticas e a divinização paranóica dos líderes e das ideologias políticas.

3. Nativismo – Porque grande parte do programa de muitos movimentos de revitalização tem sido de expulsar as pessoas ou costumes dos invasores ou dos senhores estrangeiros, eles são amplamente chamados de “movimentos nativistas”. Entretanto, a quantidade de atividade nativista nos movimentos é variável. Alguns movimentos — as seitas de carga, por exemplo — são anti-nativistas do ponto de vista cultural, porém nativistas do ponto de vista do pessoal. Lago Formoso só foi ligeiramente nativista; ele procurou uma acomodação das culturas e personalidades ao invés de expulsão, e favoreceu a entrada de certos tipos de pessoas brancas e de conteúdo cultural. Mesmo assim, muitos dos movimentos clássicos de reavivamento foram rigorosamente nativistas, do modo ambivalente discutido anteriormente. Por conseguinte, o nativismo é uma dimensão de variação ao invés de uma propriedade elementar dos movimentos de revitalização.

Mais uma complicação é introduzida pelo fato de que o componente nativista dum movimento de revitalização geralmente está muito baixo no momento de sua concepção, mas aumenta abruptamente depois que o movimento entra na fase de adaptação. As formulações doutrinárias iniciais enfatizam amor, cooperação, compreensão, e o profeta e seus discípulos esperam que as autoridades sejam razoáveis e os aceitem. Quando estas autoridades interferem com o movimento, a resposta é capaz de tomar a forma de um componente nativista crescente na doutrina. Aqui novamente, os fatores da situação são importantes para uma compreensão do curso e caráter do movimento.

4. Sucesso e Fracasso – O esboço das fases apresentadas anteriormente é propriamente aplicável a um movimento de revitalizaçãoque bem sucedido. Muitos movimentos são abortivos; seu progresso é interrompido num ponto intermediário. Isto levanta uma pergunta taxonômica: quantas fases o movimento deveria alcançar para poder se qualificar para a inclusão na categoria? Logicamente, enquanto a concepção original for uma doutrina de revitalização pela mudança cultural, não deveria haver nenhum número exigido de fases. Na prática, nós só selecionamos movimentos que tivessem passado pelas primeiras três fases (concepção, comunicação e organização) e entrado na quarta (adaptação). Isto significa que a grande parte da nossa informação sobre o sucesso e o fracasso irá lidar com as circunstâncias da adaptação relativamente tardia, ao invés do que com assuntos tais como bloqueio inicial da comunicação e interferência com a organização.

Duas variáveis principais mas relacionadas parecem ser muito importantes na determinação da sorte de um dado movimento: o “realismo” relativo da doutrina; e o tamanho da força exercida contra a organização pelos seus oponentes. O “realismo” é um conceito difícil de definir sem invocar o conceito de sucesso ou fracasso, e a não ser que ele possa ser assim definido, ele não é de nenhuma utilidade como uma variável explicatória do sucesso ou fracasso. Também não se pode usar o critério de convencionalidade de percepção, já que os movimentos de revitalização são, por definição, não convencionais. Embora uma grande parte da doutrina em todo movimento (e, de fato, no labirinto de toda pessoa) seja extremamente não realista, de tal forma que as predições de eventos baseados em suas pressuposições serão mais ou menos erradas, há apenas uma esfera de comportamento na qual tal erro é fatal para o sucesso do movimento de revitalização: a predição do resultado das situações de conflito. Se a organização não pode predizer com sucesso as conseqüências dos seus próprio atos e dos atos dos seus oponentes numa luta de poder, se fim é quase certo. Se, por outro lado, ela é prudente com relação ao conflito, ou se a quantidade de resistência for baixa, ela pode ser extremamente “irrealística” e extremamente inconvencional em outros assuntos sem correr o risco de um colapso prematuro. Em outra palavras, a probabilidade de fracasso parece estar negativamente correlacionada ao grau de realismo nas situações de conflito e diretamente correlacionada à quantidade de resistência. Aonde o realismo-conflito é alto e a resistência é baixa, o movimento provavelmente alcançará a fase de rotinização. Se a sua cultura será viável além deste ponto, entretanto, irá depender de se as suas formulações de labirinto levam a ações que mantêm um baixo nível de stress.

Sumário

Este documento programático esboça os conceitos, pressuposições, e descobertas iniciais de um estudo comparativo dos movimentos de revitalização religiosa. Os movimentos de revitalização são definidos como sendo esforços deliberados, cientes, esforços e organizados por membros de uma sociedade para criar uma cultura mais satisfatória. O movimento de revitalização como um tipo geral de evento ocorre sob duas condições: alto stress para membros individuais da sociedade, e desilusão com uma Gestalt cultural distorcida. O movimento segue uma série de fases funcionais: reformulação do labarinto, comunicação, organização, adaptação, transformação cultural e rotinização. Os movimentos variam ao longo de várias dimensões, das quais a escolha da identificação, o grau relativo da ênfase religiosa e secular, nativismo, e sucesso ou fracasso são discutidos aqui. O movimento é normalmente concebido nas visões revelatórias de um profeta, que lhe proporcionam uma relação satisfatória com o sobrenatural e delineiam um novo modo de vida sob sanção divina. Os seguidores alcançam satisfação similar de necessidades de dependência na relação carismática. Sugerimos que a origem histórica de uma grande proporção de fenômenos religiosos está nos movimentos de revitalização.

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NOTA:

1. O projeto Lago Formoso, amplamente apoiado por uma bolsa da Faculdade de Pesquisa do Conselho de Pesquisa em Ciências Sociais, com fundos suplementares do Conselho de Pesquisa Comprotamental e a Comissão para o Avanço de Pesquisa da Universidade da Pennsylvania, tem servido de um estudo piloto, e a investigação maior é agora amplamente financiada pelo Instituto Nacional de Saúde Mental (Serviço de Saúde Pública dos E.U.A.), Grant M-883, com fundos suplementares da Sociedade Filosófica Americana e do Instituto Psiquiátrico do Leste da Pennsylvania. Eu gostaria de expressar a minha gratidão a Sheila C. Steen (que tem sido a “diretora de campo” do projeto, responsável por muitas das pesquisas empíricas e participante na formação conceitual) e aos assistentes de pesquisa e os secretários Josephine H. Dexon, Herbert S. Williams e Ruth Goodenough. As Pessoas cujos comentários e sugestões no primeiros resumo deste estudo têm sido de valor na sua revisão incluem Margareth Mead, Theodore Schwartz, Walter Goldsmith, A. I. Hallwell, David F. Aberle, Betty S. Wallace e Goodenough, O movimento Lago Formoso será descrito com detalhes num livro que o escritor está preparando agora. Para outros tratamentos agora em impresso, vide Parker, 1913; Deadorff, 1951; Voget, 1954; e Wallace, 1952a e 1952b.

2. Este artigo não é um lugar para apresentar uma discussão geral das noções de ordem, campo, função e equilíbrio, a analogia organísmica, o conceito de homeostase, e certas idéias da cibernética, do aprendizado e da percepção, e da fisiologia stress, que seria necessária para justificar e elucidar totalmente as pressuposições em que em que a hipótese da revitalização é baseada. Vide, entretanto, Wallace 1953, 1955 e 1956 para maior desenvolvimento da visão sagrada e mais discussões extensas do conceito do labirinto.

3. Depois que nós inventamos o termo “movimento de revitalização”, descobrimos que Marian Smith, num artigo sobre os Indios Shakers (Smith 1954) usa o termo aproximadamente relacionado “movimentos vitalistas” (“um movimento vitalista pode ser deffinido como qualquer tentativa consciente e organizada, por parte dos membros de uma sociedade para incorporar em sua cultura os aspectos selecionados de outra cultura, que estejam em contato com ela”). Entretanto, ela usa este termo para o que eu chamo de movimentos de revitalização não-nativistas com ênfase na importação (ao invés de reavivamento).

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