Autor: I. Howard Marshall
Em sua narração da missão de Paulo
em Antioquia da Pisídia, Lucas relata como Paulo virou-se dos judeus, que rejeitaram o Evangelho, para os gentios: os últimos ‘alegraram-se, e glorificavam a palavra do Senhor; e creram todos quantos estavam ordenados para a vida eterna.’ Esta linguagem soa fortemente predestinacionista,[1] mas é improvável que devemos pressioná-la para que signifique que as pessoas em questão creram e receberam a vida eterna porque tinham sido individualmente predestinadas a fazer assim.
Pois, primeiro, os versículos anteriores falam da voluntária rejeição do Evangelho pelos judeus que não creram; a passagem não diz nada sobre eles terem sido predestinados a fazer assim. Certamente é o caso que a dureza de coração dos judeus foi predita por Isaías (6.9-10) em uma passagem expressamente citada em At 28.25-28, mas esta citação diz respeito à nação como um todo; na mesma passagem ouvimos de alguns judeus que creram no Evangelho pregado por Paulo e em cujo caso, portanto, a profecia não foi cumprida (At 28.24).
Em segundo lugar, pode ser que aqueles que são descritos como sendo ordenados à vida eterna eram gentios que já eram prosélitos e adoradores de Deus. Antes disso, em Atos, Cornélio já era um homem religioso quando Deus tomou a iniciativa de levar um pregador das boas novas de Jesus a ele, e o mesmo é verdadeiro do eunuco etíope que tinha vindo para Jerusalém para adoração. Em ambos os casos, estamos lidando com pessoas que já estavam buscando a salvação e tinha ido até o ponto que a religião judaica poderia levá-los. Agora, em At 13.43 somos informados que ‘muitos dos judeus e dos prosélitos religiosos seguiram Paulo e Barnabé; os quais, falando-lhes, os exortavam a que permanecessem na graça de Deus.’ Seriam estes que já estavam ‘na graça de Deus’ os que foram alistados para a vida eterna e agora foram levados a crer nas boas novas de Jesus?[2]
Em terceiro lugar, sendo correta ou não a sugestão precedente, o contexto do versículo mostra que ele trata da transição no plano de Deus dos judeus para os gentios. O plano de Deus necessitava que o Evangelho fosse primeiro pregado aos judeus, mas também, quando eles como comunidade o rejeitassem, aos gentios, conforme Is 49.6. Pois o propósito de Deus incluía a reunião dos gentios em um reino. Foi esta profecia que se cumpriu na resposta dos gentios em Antioquia. Pela razão dos gentios, como tais, terem sido ordenados à vida eterna – sob a condição de fé – que agora eles creram. A afirmação de Lucas, portanto, não se preocupa em delimitar um grupo particular de gentios que, distinto de outras pessoas, foram particularmente ordenados a crer, mas em demonstrar que quando Deus tomou a iniciativa e ofereceu salvação aos gentios, conforme Seu propósito de chamar um povo para Si mesmo dentre os gentios, eles responderam com fé. Os gentios têm tanto direito no plano de Deus à vida eterna quanto os judeus.
Tradução: Paulo Cesar Antunes
[1] F. F. Bruce, The Book of the Acts (NLC), 1953, p. 283, n.; cf. os paralelos em SB, II, pp. 726p. Muitos eruditos têm argumentado que ησα ντεταγμενοι pode ser traduzido como forma média com o significado ‘tantos quantos se alinharam para a vida eterna’ (R. J. Knowling, Acts (EGT), II, p. 300; E. M. Blaiklock, Acts (TNTC), 1959, p. 110). Não há nenhum paralelo para esta tradução. No Novo Testamento a voz média de τάσσω tem o mesmo significado que a voz ativa (At 28.23; Mt 28.16), e o sentido sugerido exigiria o pronome reflexivo (1Co 16.15); cf. LS, s.v. II, 4.
[2] A dificuldade desta idéia é que a introdução de um novo grupo de pessoas no v. 44 pode militar contra uma identificação dos dois grupos nos vs. 43 e 48. Em todo caso, entretanto, o grupo no v. 48 inclui os prosélit
os no v. 43.