Igreja Universal do Reino de Deus, Protestantismo, globalização, privatização

Autor: Autor Desconhecido
Bati um ótimo papo com a professora Elizete da Silva, onde ela teve oportunidade de falar sobre o fenômeno do crescimento do protestantismo no Brasil, em particular da Igreja Universal do Reino de Deus, uma igreja autóctone, que conta agora com cerca de 4 milhões de fieis, a maioria mulheres muito pobres. Apesar de estar envolvida em vários escândalos recentes, a IURD continua uma entitade multimilionária. Nesta entrevista conversamos sobre o papel deste tipo de corporação transnacional religiosa, que atua num mundo em processo de globalização, intensa privatização, e crescentes iniquidades econômicas, sociais e políticas.

Elizete abordou várias questões intrigantes sobre o nexus de religião/política/pobreza/desenvolvimento, como o porquê do crescimento explosivo desta nova forma de protestantismo, o complexo jogo de forças políticas/econômicas no qual grupos religiosos atuam, e por que um grupo como este tem mais sucesso no “mercado” religioso de cultos competindo entre si dentro de camadas populares, assim como os vários papeis de participação da mulher em diversas hierarquias religiosas.

A entrevista ocorreu em 15 de Novembro de 1997 após a apresentação da Elizete no quarto encontro da BRASA, Associação de Estudos Brasileiros, que se deu em Washington, DC.

Tópicos principais: religião e política no Brasil, Igreja Universal do Reino de Deus, Protestantismo, globalização, privatização.

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VB) Então, me conta um pouco do seu trabalho e aquilo que você pesquisa?

O meu trabalho especificamente é sobre o Protestantismo e a relações com a sociedade brasileira.

Atualmente, eu tenho me preocupado muito com esta vinculação do Protestantismo com esta questão política, porque pelo menos até os anos 40, os protestantes se consideravam apolíticos. Quer dizer, eles votavam, porque o voto no Brasil é obrigatorio, mas eles não se envolviam muito com política. Eles chegavam a dizer que política não era coisa de “crente”, como os católicos normalmente designam os protestantes no Brasil, que não era esse o campo de atuação. O campo de atuação do Protestante era o campo da atuação da evangelização, para que as pessoas realmente conhececem o evangélio. E através do evangélio, a sociedade se transformaria, os problemas seriam resolvidos pela via individual, na medida que cada um se convertesse, na medida que cada homem transformasse a sua vida, a sua prática social, a sociedade resolveria os problemas sociais e, por sua vez, as questões políticas.

Mas isso na minha opinião, era quando o protestantismo era ainda muito restrito no Brasil. Na medida que o protestantismo cresce e se torna um eleitorado sedutor para políticos, os políticos de fora descobrem que este é um eleitorado importante.

Na Igreja Universal, por exemplo, eu assisti um culto onde o Bispo que estava dirigindo o culto disse: “O Nosso Deus é um Deus que provem todas as coisas, mas nós precisamos ter os nossos representantes políticos. Foi-se o tempo onde a gente não falava em política. Agora nós vamos ter os nossos representantes.” E ele disse assim com toda a ênfase: “Nós vamos dobrar a nossa bancada!” E ele já tem atualmente na Bahia cinco vereadores, uma deputada estadual e um deputado federal, que estão de forma muito enfática defendendo os interesses da Igreja Universal.

VB) E qual seriam estes interesses?

Olha, do ponto de vista político, eles se consideram evangélicos que podem melhorar, do ponto de vista ético, a política. Você sabe que no Brasil o político é tido no imaginário popular quase como sinônimo de corrupto. Então eles pensam que o evangélico na política pode melhorar a política, ele pode ter um comportamente mais ético, mais sóbrio, e no geral, esse pessoal se vincula aos partidos de direita.

VB) Direita-centro, extrema direita, qual direita?

Nas últimas eleições eles elegiram basicamente os partidos que estão coligados ao atual governo federal e estadual também. E os partidos de “oposição” para eles não são uma boa coisa. Inclusive, na outra eleição presidencial prévia, Lula foi considerado assim como um demônio. E o Bispo Edir Macedo da Igreja Universal do Reino de Deus fez propaganda de Collor explícita dentro da Igreja e chegava a dizer que Lula era o demônio, que ia se coligar com a Igreja Católica, com a parte da Igreja Católica mais progessista que participa do PT.

VB) Então eles demonizam a Igreja Católica também?

Sim, também. Então, na visão deles, o Partido dos Trabalhadores, que é o partido de esquerda que mais sobresai no Brasil, a gente ainda usa essa expressão “esquerda”, então para a Igreja Universal, estes candidatos são potencialmente satânicos. Não é para ser votado.

Então sua política é assim, por exemplo, a questão do aborto, eles foram contrários, e aí, se juntaram aos católicos. A Lei Ambiental, outro exemplo, que tem uma vinculação muito forte com as igrejas, porque eles estão considerando que a partir de 10 horas da noite não pode mais fazer barulho em locais públicos. E os cultos das Igrejas Universais, e mesmo de outras Igrejas assim mais carismáticas, são cultos assim muito parcipativos, muito emocional, eles cantam, oram, tem instrumentos barulhentos. Então eles dizem que isto vai afetar profundamente a continuidade dos cultos.

VB) E quanto à distribuição de classe, o que você encontra na Igreja Universal?

Eu lhe diria baseado nas pesquisas que tenho feito, e em outras pesquisas, que a Igreja Universal é formada basicamente das classes mais baixas da população brasileira.

VB) E isto inclue os mais, mais pobres, os favelados, etc.?

Sim, sim, favelas, paupérrimos, o “lumpen”…

VB) Não só aquele proletariado urbano que tem uma casinha…

Não, o “lumpen” também, inclusive eles tem um serviço assistencial. Eles tem uma entidade que eles chamam ABC, Associação Beneficiente Cristã, que eles distribuem sopa, cesta básica, então é o pessoal desassistido mesmo, e basicamente mulheres.

Me impressiona muito, sempre que eu vou aos templos participar dos cultos, você olha e ve práticamente 80%, até 90% dos fieis que estão alí são mulheres, e no geral, rostos sofridos, de mulheres pobres…

VB) E essas mulheres são em geral as chefes de família, ou elas tem marido, um homem na casa, etc?

No geral, elas são chefe de família. São mulheres que trabalham como domésticas, ou vivem de um biscate de vender coisa na rua, como camelô mesmo, ou então, não tem nada na vida e chegam na Igreja e pedem ajuda. E eles não negam.

Um dia eu participei de um culto num bairro bem popular e chegou uma senhora negra, basicamente a população pobre na Bahia é composta por negros, na sua grande maioria, e essa mulher chegou com criança na mão, ela tinha um aspecto mesmo de mendiga, com a roupa suja, esfarrapada, e ela foi lá, e eles pediram a oração por ela e queriam que o “demônio da pobreza” que perseguia aquela mulher, o “demônio da fome”, fosse posto pra rua. E aí eles dizem: “Xô! Satanás! Deus, liberta esta mulher da pobreza e da miséria!”

Então, alem da “oração forte”, como eles dizem, eles fazem este trabalho assitencialista. E eu concordo com os autores que tem trabalhado esta visão de que práticamente, estas igrejas neo-pentecostais, elas tem uma função de dar assistencia a este pessoal. Não é a toa que eles estão dentro da Igreja Universal. Tem um significado.

VB) E você sente que este discurso sustenta a fé deles?

Sustenta sim, porque é um discurso que traz retorno e é um retorno material, factível.

VB) Eu já li que eles distribuem literalmente toneladas de alimentos. Como é o trabalho de assistencia social deles?

Eu reputo como um trabalho de porte. Lá na Bahia, por exemplo, eles distribuem cestas básicas, sopa, nos bairros mais carentes, para cada bairro popular, eles tem um local de reunião. Geralmente em cinemas, ou em locais de antigos clubes. Vários cinemas se transformaram na Bahia em Igreja Universal e isto é significativo, porque o cinema era o local onde passava os filmes pornograficos e “satânicos”. Agora “é um lugar abençoado por Deus”. E ele fazem esta estratégia em outros países também, em Londres, por exemplo, fizeram o mesmo…

VB) Então pode-se dizer que, com esta onda de privatizacões de serviços que antes eram fornecidos mal e mal pelo governo no Brasil e outros países da América Latina, e que estes serviços vão sendo destruídos a medida que você privatiza, porque as empresas visam o lucro e o atendimento a esta população paupérrima não dá lucro e então eles são abandonados pelo sistema, podemos então dizer que a Igreja Universal preenche esta lacuna?

Sim, preenche, inclusive o exorcismo que faz parte da teologia deles, não é só tirar os demônios, mas também curar, curar doenças. E a população brasileira vive em miséria em termos de saúde pública. Além do “sopão”, da cesta básica, eles tem um serviço jurídico grátis, tem advogado lá de plantão. Eles oferecem trabalhos em cadeias públicas, eles vão lá, não só pregar o evangelho, como também dão mantimentos; vão em orfanatos. Na área de saúde, eu não consegui perceber nada, agora no canal de televisão deles, eles tem um programa chamado “Médico da família” falando sobre vários problemas, educação básica de saúde.

E com isto também, isto se torna uma forma de conter uma explosão social, o protesto social de fato em torno das carências que vive a população brasileira.
VB) E qual a reação das elites brasileiras, que são não maioria, Católicas, mas que também tem muito interesse em conter esta explosão social?

Bem, a Igreja Católica tem uma briga eterna com eles, claro, porque a Igreja Universal bate duro na Católica. Mas a elite brasileira não gosta deles, ela nunca gostou de pobre, ela quer sempre ser voltada para a Europa e branca, não negra. Então eles tem realmente horror à Igreja Universal. Por outro lado, certas alas de outras Igrejas protestantes não aceitam a Igreja Universal como cristã. Eles dizem que é uma mistura, cheia de elementos de magia, fetichismo…que é um sincretismo, no sentido pejorativo.

VB) E essas outras Igrejas Protestantes são também todas politicamente de direita?

Não, não. Na minha visão, a Teologia da Libertação, ela também perpassou um pouco os setores progressistas do Protestantismo. Na eleição de ’89, existiu um comité Evangelico pró-Lula e isso era impossível a 30 anos atras. E por que isto? Porque há, dentro de alguns setores das Igrejas Protestantes históricas, uma visão mais aberta de problemas sociais, políticos. Inclusive existem parlamentares do PT que são evangélicos históricos.

Então eu lhe diria que há um grande perigo de você generalizar, não é bem assim.

VB) E você vê, então, tanto este trabalho assistencial, como a doutrinação de direita, se encaixando neste processo de globalização que nós estamos vivendo?

Sim, é político, claro. Talvez eles nunca chegassem a sentar e marcar uma estratégia de ação. Eu não vou dizer isto porque eu não tenho nenhum documento que me prove isto, historiador tem que trabalhar em cima de documentos, nem usar a imaginação santa (risos). Mas eu lhe diria que no fundo, eles acabem a preencher este papel mesmo.

E no dia que eu comentei que o pastor disse “Nós vamos dobrar nossa bancada, não é irmãos?” E todos gritavam “Amen, Jesus!”, e batiam palmas e diziam que sim! Então este é um eleitorado cativo. A Igreja Universal tem um governo autoritário, não é um governo democrático, então quem a Igreja indicar, está eleito!

VB) E é uma estrutura autoritária chefiada por homens?

Sim, basicamente por homens, existiam algumas mulheres no início da década de 70, quando eles fundaram no Rio, e estas mulheres foram alijadas. A elite também é basicamente de brasileiros, mesmo nos outros locais que ela esta se desenvolvendo agora, a Igreja Universal só’ não está na Oceanía, nos outros continentes ela já está.

Do que eu sei, são pastores brasileiros que iniciam o trabalho e depois eles vão arrebanhando pessoas locais. O fundador, o Bispo Edir Macedo mora atualmente aqui nos Estados Unidos e diz que se mudou para os Estados Unidos para administrar melhor a Igreja. Porque a Igreja se quer Universal, não é só o nome, ela se quer mundial, expandindo…

Ele deu uma entrevista na Veja, onde o reporter perguntou, “Mas um americano médio, ele vai se interessar pela sua Igreja?” E ele respondeu, “Vai sim, porque as necessidades existenciais são universais e um homem no fundo do poço, ele procura qualquer coisa, e a Igreja Universal vai buscar as pessoas no fundo do poço. E ela está crescendo mundialmente de forma assustadora. Então na minha visão, este mercado mundial que a gente vive, ele também é um mercado mundial de problemas existenciais, psicológicos. Então o fundo do poço, tanto pode ser o fundo do poço para um negro na Bahia, como para um amarelo japonês no Japão.

VB) E a classe mais pobre, obviamente, não pode ir a um terapeuta que é a receita para as classes mais avantajadas para resolver muitos destes problemas de “fundo de poço”…

Exatamente, o pastor funciona como um terapeuta e na Igreja Universal muito mais. Em vários rituais que presenciei nos cultos, no final as pessoas estavam felizes, sorridentes, se sentem protegidas, abençoadas. É um espaço de sociabilidade sem dúvida, e tem esta função psicológica.

Eles também tem reunião de segunda a domingo. Então todo dia, o fiel está na Igreja e tem culto nas mais variadas horas. Tem culto desde as 8 horas da manha até o que começa as 8 horas da noite.

VB) Como a CNN, que oferece seu programa o dia todo, na hora que você quer ver a notícia, e não como era antes, que você que tinha que ir na hora marcada ver a notícia das 8…

E eles tem um poder de comunicação muito forte na mão. A televisão deles que eles começaram está se expandindo no Brasil todo e no mundo. O jornal deles, eles dizem que tem uma tiragem de 1.500.000. então, há todo um conjunto de elementos que vão de encontro para satisfazer as carencias psicológicas, sociais e, as vezes, emocionais mesmo, dos fieis, do dia a dia das pessoas.

VB) E dentro destes problemas, alguém fala sobre violência, ou doméstica ou de rua?

Sim, se fala de violência como decorrente do pecado, da miséria que as pessoas vivem, então “Se as pessoas tiverem Jesus no coração, se as pessoas tiverem realmente frequentando a Igreja, em paz com Deus, as pessoas não vão ser violentas, elas vão ser sorridentes, solidárias. Então, de fato, a busca à Igreja, ao evangélio, a você estar em comunhão com Deus, na ótica deles, é um pressuposto para você resolver todos os demais problemas.

VB) Então hoje, uma mulher poder ser pastora ou não?

Não, ela é uma “obrera” que ajuda dentro da liturgia, no culto, levando as pessoas, trazendo algum objeto do culto, o óleo santo, a água, para as cerimônias do ritual, mas pregar como um pastor e fazer as ordenanças ou sacramento, o batismo, são os homens.

VB) E existe alguma contestação quanto a isso, ou não chega nisso?

Não, eu acho que estas mulheres que estão la, se elas recebem esta assistência, elas estão felizes. A gente não pode dizer que nunca vai acontecer, pode ser. Está acontecendo em outras Igrejas históricas. A Igreja Anglicana ja tem pastoras, a Metodista também. E não foi dado de graça.

VB) E poderíamos então dizer que, uma vez que esta contestação do papel de protagonista dentro de grupos religiosos para a mulher surgiu mais na Europa e Estados Unidos, que são países onde, comparados com o Brasil, não tem esta miséria avassaladora, então uma vez que sua sobrevivencia mínima esteja garantida, que a mulher parte para contestar outras desigualdades…

Sim, e conquistar outros espaços e outras necessidades que não estão dadas pra ela. E mesmo dentro de Igrejas históricas, por exemplo, a Igreja Batista no Brasil, ela já está discutindo este problema, que é algo que não se colocava a 30 anos atras. Tem basicamente 4 anos que eles discutem isto na convenção deles. E na última convenção que teve, eu fiquei muito intrigada porque nenhuma mulher levantou para fazer a defesa da ordenação feminina e todos os homens que falaram, falaram contra, que era inoportuno, que não era aquele momento. E na Igreja Metodista, eu sei que foi uma luta muito forte, e na Igreja Anglicana também, que tem um outro tipo de governo, no Brasil já existem mulheres pastoras efetivamente mantendo um pastorado e fazendo todas as tarefas.

VB) E já que esta Igreja Universal tem uma fórmula que se encaixa tão bem num momento e processo de globalização, o que a Igreja Universal tem que a faz mais atraente e competitiva que outras? Por que ela está crescendo tanto?

No Brasil, eu lhe diria que ela tem um apelo popular muito forte. Porque o protestantismo histórico, ele foi um protestantismo contra-cultura. Por exemplo, os missionários batistas que sairam aqui dos Estados Unidos para fundar a Igreja Batista no Brasil, eles consideravam a cultura brasileira como uma cultura cheia de pecados, cheia de paganismo católico.

Primeiro, eles não consideravam a Igreja Católica como cristã. Então, esta cultura brasileira permeada de Catolicismo e de outras práticas “fetichistas”, como eles consideravam as práticas de origem Afro, então esta cultura brasileira era rejeitada, eles viviam uma situação muito sectária. Então eles tinham uma visão onde o bem era a Igreja e o mal era o “mundo”, então é esta a visão de “contra-cultura” que eu estou colocando.

Agora, por que que a Igreja Universal cresce? Ela não é contra-cultura, ela não diz que você não deve fumar, não deve beber, que você não deve vestir calça comprida, o cabelo assim. As pessoas vão do jeito que acham que devem ir. Então ela não tem esta visão sectária, excludente. Eu li na “Folha Universal”, que é o jornal deles, um testemunho de um rapaz de 18 anos, ele disse assim: “Antes eu frequentava a Igreja Batista, mas lá eu não podia fazer nada, aqui não, aqui eu vou na Igreja, mas eu também vou no baile “funk”…

Então, na minha visão, a Igreja Universal, ela consegue ser mais abranjente em como atingir a pessoa. Inclusive, há um momento em que eles dizem que “dançam para Jesus”, que dançar não é pecado, ao contrário do protestantismo histórico que sempre diz que não podia nem fumar, nem beber, nem dançar.

Eles tem a idéia que vão prosperar, eles tem a “corrente da prosperidade”. Na Pituba, um bairro de classe média que agrega tanto uma classe média pauperizada, como uma classe média que quer ascender, onde tem uma Igreja Universal, o que que eles pregam? Eles pregam que Deus pode dar um celular pra eles, um computador, eu vi isto numa oração com todas as letras: “Deus vai lhe dar um computador… e você vai sair para jantar fora, que agora o dinheiro que você tem não dá nem pra fazer um sanduíche…”

VB) E como a Igreja Universal funciona na parte financeira?

Este é um problema difícil, isto não passa nas fontes deles. Então há muita especulação sobre o assunto, inclusive especulações muito pejorativas da grande imprensa. Mas nós temos que trabalhar com fontes e documentos seguros, e isto não temos.

VB) Também porque eles não pagam imposto de renda…

Não pagam, como nenhuma outra igreja no Brasil também não paga, estão isentas.

VB) Então toda esta informação financeira é totalmente secreta?

É, como nas outras Igrejas também. Por exemplo, numa Igreja Batista, cada fiel dá o dízimo, que é 10% do salário…

VB) Que é algo que tinha no Catolicismo também…

Sim, mas é Protestante também. Inclusive era importante manter o dízimo porque quando eles chegam lá no Brasil, eles não tinham nenhum apoio oficial, a Igreja Católica tinha o apoio oficial. Então, para se manter, eles tinham que arrecadar. Agora, a Igreja Universal, ela dá mais esta ênfase, no sentido do sacrifício, “se você der uma oferta para Deus, Deus vai lhe dar em dobro”, tem um versículo bíblico que fala isto. Eu acho que eles fazem uma leitura tendenciosa do texto bíblico. Então quando outras pessoas perguntam, “Por que estes fieis são tão explorados e dão a oferta?” Elas dão, porque elas são convencidas a dar, porque “o pouco que ela pode dar, Deus vai abençoar e vai transformar em muitas coisas…”

E qual é o sonho de um pobre? É ter onde comer, é ter onde morar, é ter um emprego. Então eles oram para que as pessoas tenham emprego, para realmente saiam da situação de miséria… Eu ouvi um pastor numa pregação na Bahia dizer: “Deus não quer dar favela para as pessoas, Deus quer dar uma “big” casa! Os filhos de Deus não são ratos para viver dentro da favela!” E a maioria daquelas pessoas moram nas favelas.

VB) E aí está um grande contraste com o tradicional da Igreja Católica, daquela doutrinação de submissão à pobreza…

Exatamente. Então, pra mim, esta teologia da prosperidade, que é adptada para o grande empresário, Deus vai dar lucro e, para o pobre, vai dar comida, vai dar casa e vai dar emprego. O que é a comida, casa e emprego? São as necessidades básicas de sobrevivência de qualquer José da Silva (pra usar o meu sobrenome…) no Brasil.

Vive como a grande parte da população brasileira? Vive mal, come mal, quando come, a maioria é faminta mesmo, mora mal ou não mora, “se esconde”, como se diz normalmente e ainda existe a grande onda de desemprego que a gente ve hoje.

Então para a Igreja Universal, o Reino dos Ceus é aqui e agora. Esta visão escatológica que o protestantismo histórico tinha de que a benção de Deus vai ser o Ceu futuro, isso se diluiu completamente na mensagem deles. Para a classe média pauperizada o Reino dos Ceus é um telefone celular.

VB) Mas este Reino dos Ceus em forma de telefone celular vai vir assim aleatoriamente? Vai vir de Deus, como que funciona?

Vai vir de Deus e da sua fidelidade como fiel. Você frequentando a Igreja, você dando a oferta, dando do dízimo… Em troca, Deus vai lhe abençoar.

VB) Você mencionou também que eles agora estão entrando na política com seus próprios candidatos. Eu imagino que eles não estimulem a maioria dos fieis a sairem por aí fazendo política e se tornando ativos candidatos políticos, que eles escolham dentro da elite da Igreja. Está certo?

Eu descobri pela “Folha Universal”, que existe um articulador político dentro da Igreja Universal. Tem um bispo indicado para ser o articulador político. Então neste momento pré-eleitoral, eles fazem as articula&ctilde;ões como qualquer partido político. Eles tem uma categoria de “pré-candidatos” que são escolhidos pela cupula da Igreja e claro, vão acontecer debates, discussões, pra ver se este candidato realmente preenche os critérios que eles querem, se é “ungido de Deus”, se tem “o óleo Santo”, e só depois deste processo que ele vira realmente candidato da Igreja. Então é um processo muito autoritário. E aí, um belo dia chega o pastor e diz: “O nosso candidato é o Irmão Fulano” e todos aplaudem, batem palma e votam no Fulano e isto facilita a eleição de candidatos.

VB) Voltando à questão financeira, se imaginarmos somente com 4 milhões de fieis no Brasil, se cada um der somente R$1 por mes, são 4 milhões de Reais todo mes, sem pagar imposto…

E não é só isto, eles incentivam… Eu assisti um culto em que o pastor disse assim: “Eu estou desafiando a pessoa que traga R$1000″… Eu disse, ele ficou louco? Aqui ninguém tem mil Reais… Aí, ele vai diminuindo a oferta, “R$500… R$200… você que só tem o dinheiro do transporte,” eles dizem assim com toda crueza, “traga porque Jesus vai aumentar, Ele quer lhe dar muito mais do que você tem…” E as pessoas dão, sim.

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