David Livingstone (1813 – 1873)

Autor: Autor Desconhecido
Jamais houve nos anais de lenda missionária um homem tão celebrizado quanto David Livingstone. Ele foi o herói que a Inglaterra vitoriana precisava tão desesperadamente e o reconhecimento que lhe foi concedido serviu para manter ativas as missões africanas por mais de um século. Ele tornou-se um herói a ser seguido por todas as gerações e “depois de sua morte e sepultamento na Abadia de Westminster, a reputação de David Livingstone ficou livre dos ataques de todos, exceto o mais ousado herege. Ainda em meados do século XX, os historiadores continuavam a considerá-lo o maior dentre todos os missionários. Durante quase um século ele teria seu lugar no panteão dos cristãos de fala inglesa como urna figura de santidade e dedicação inspiradoras, a ser considerado no mesmo plano de Francisco de Assis e joana D’Arc”.

Há pouco a discutir sobre a influência sem paralelos que Livingstone teve no campo das missões africanas, mas quanto à sua própria obra missionária as dúvidas persistem. Livingstone não foi o “super santo” criado por tantas das suas primeiras biografias. Pelo contrário, era um ser humano frágil e temperamental, com várias falhas de personalidade que prejudicaram seu ministério durante toda a sua vida. Mas apesar de suas fraquezas, ele foi um homem mais usado por Deus que qualquer outro para focalizar a atenção do mundo nas espantosas necessidades da África.

Livingstone nasceu na Escócia, terra natal de tantos “grandes” missionários (inclusive Robert Moffat, a quem ele seguiu até a África; Mary Slessor e Charies Mackay que o sucedeu). Da mesma forma que seu sogro, Robert Moffat, Livingstone foi criado em um lar humilde, mas ao contrário do sogro, sua mente brilhante e desejo insaciável de aprender o impeliram a buscar uma posição mais elevada na vida. Seus longos dias de trabalho (das 6 da manhã às 8 da noite) numa tecelagem, desde os dez anos, não interromperam sua educação. Ele comprou uma gramática latina com sua primeira semana de ordenado e continuou a estudar, matriculando-se em cursos noturnos. Ele conseguiu superar seus anos difíceis de aprendizado lançando olhares apressados a um livro apoiado em seu tear e debruçando-se sobre as tarefas de casa até meia-noite.

Livingstone foi criado em uma família piedosa que freqüentava a igreja. Durante a sua juventude, seus pais deixaram a igreja anglicana estabelecida para juntar-se a uma capela independente. Depois de sua conversão na adolescência, ele planejou tornar-se um médico missionário na China; mas as prioridades familiares impediram que continuasse estudando até 1836, quando tinha 23 anos. Até mesmo esta educação foi restrita. Ele estudou durante o tempo de inverno na Faculdade Anderson, em Giasgow, e passou os verões de volta na tecelagem. Ele estudou tanto medicina como teologia e, em 1840, aos 27 anos de idade, estava pronto para começar sua carreira missionária.

Livingstone foi aceito pela Sociedade Missionária Londrina em 1839, mas seus planos de viajar para a China foram frustrados pela política internacional. O trabalho missionário na China estava sendo cortado pela SML devido ao atrito entre a Inglaterra e a China que finalmente levou à Guerra do Ópio. Os diretores do SML achavam melhor que Livingstone fosse em vez disso para as Índias Ocidentais, mas nesse intervalo de tempo Livingstone tinha sido apresentado ao alto ao surpreendente missionário Robert Moffat. Este teve profunda influência sobre o entusiasta candidato a missionário e tentou-o com as excitantes oportunidades para a evangelização além de Kuruman na “vasta planície ao norte” onde ele “vira algumas vezes, ao sol da manhã, a fumaça de mil povoados, onde nenhum missionário jamais estivera”.

Foi com grandes expectativas que Livingstone navegou para a África, em dezembro de 1840. Depois de passar treze semanas estudando a língua a bordo do navio, ele chegou ao Cabo em março de 1841 e permaneceu ali durante um mês antes de começar sua viagem para kuruman, onde deveria ajudar com o trabalho, até que os Moffat voltassem. Livingstone imediatamente apaixonou-se pela África e gostou muitíssimo de sua viagem por terra para Kuruman, descrevendo-a como “um sistema prolongado de recreação”. Ele não ficou tão bem impressionado no entanto com o trabalho missionário na África, criticando severamente e com razão, a obra na Cidade do Cabo, onde um número excessivo de missionários se concentrava numa pequena área, desencorajando a liderança indígena. Novas decepções o aguardavam em Kuruman. Com a imagem mental de “mil povoações”, ele ficou surpreso ao encontrar a região escassamente povoada e chocou-se ao descobrir a desavença entre os missionários. “Os missionários no interior, sinto dizer, são um grupo lamentável… Ficarei contente quando seguir para a região além – longe de sua inveja e calúnias.” A presença de Livingstone só complicou a situação e a maioria dos missionários estava ansiosa para que ele “partisse para a região além”. Ele queixou-se de que não “havia mais afeto cristão entre a maioria dos ‘irmãos’ (caso não fossem todos) e ele, do que entre seu ‘boi de montaria e sua avó”.

Enquanto aguardava a volta dos Moffat das férias, Livingstone fez diversas viagens de carroça na direção norte para explorar a área. Nos dois anos e meio de aprendizado em Kururnan, mais do que um ano foi passado longe de sua base, e esta prática de afastar-se continuou durante o resto de sua carreira. Em 1843, Livingstone afastou-se e não voltou. Ele dirigiu-se para a região arborizada e bem irrigada de Mabosta, 300 quilômetros ao norte, a fim de estabelecer uma segunda kururnan. Roger Edwards, um missionário-artesão de meia-idade e sua esposa, que tinham servido durante dez anos em Kuruman, o acompanharam. Houve problemas desde o início. Edwards ressentiu-se da liderança imposta de Livingstone, que não só era novato no cenário africano, corno também 18 anos mais moço.

Mabosta tornou-se o primeiro lar africano de Livingstone, Ele construiu ali uma cabana “substancial de 15 x 5m”, com janelas de vidro levadas de kuruman. Foi ali também que encontrou pela primeira vez os perigos sempre presentes da seiva africana. Enquanto tomava parte numa caçada de leões, ele foi atacado por urna das feras e ficou muito machucado. Embora estivesse grato por ter sobrevivido, graças a seus valentes companheiros africanos e um casaco grosso, seu braço direito ficou gravemente ferido e deformado para sempre.

Em maio de 1844, três meses depois do incidente, Livingstone estava se sentindo bem o suficiente para viajar – especialmente por tratar-se de um negócio importante. Ele dirigiu-se a Kururnan “(a fim de prestar seus respeitos” à filha mais velha dos Moffat, Mary, que aos 23 anos acabara de voltar com seus pais da Inglaterra. O período de convalescença de Livingstone sem dúvida convenceu-o de que havia algumas desvantagens em ser solteiro e durante esse verão ele então “reuniu coragem para fazer a pergunta debaixo de uma das árvores frutíferas”. A resposta imediata de Mary não se sabe ao certo, mas, mais tarde naquele ano, Livingstone escreveu a um amigo “Ao que parece, devo afinal de contas ligar-me a Srta. Moffat”, a quem ele descrevera a outro amigo como sendo uma “dama forte e decidida”.

O casamento realizou-se em Kuruman em janeiro de 1845, e em março os Livingstone partiram para Mobosta; mas a permanência deles ali foi curta. Surgiram novos problemas com os Edward, tornando impossível o trabalho conjunto das duas famílias. Naquele mesmo ano, depois do nascimento de seu primeiro filho, Livingstone arrumou suas coisas e mudou com sua família para Chonwane, 64km para o norte. O período passado em Chonwane foi feliz para os Livingstone, mas só durou dezoito meses. Uma seca severa na região fez com que eles precisassem mudar com a tribo para o nordeste, junto ao rio Kolobeng. No verão de 1847, depois do nascimento de seu segundo filho, os Livingstone mudaram-se para a sua terceira casa.

Durante sete anos, os Livingstone tiveram uma vida semi-nômade na África. Algumas vezes, Mary e os filhos ficavam sozinhos em casa, enquanto outras vezes ela levava os filhos e acompanhava o marido peregrino. Nenhuma das situações era satisfatória. Certa ocasião, quando Livingstone se achava ausente de Chonwane durante um longo período de tempo, ele escreveu: “Mary acha a sua situação entre as ruínas um tanto lúgubre, pois me escreve que os leões estão retomando a sua propriedade e andam em volta de nossa casa à noite”. Porém, acompanhar o marido era dificilmente a resposta. Em 1850, depois de uma viagem de exploração com ele, Mary deu à luz o seu quarto filho, que morreu logo depois, enquanto ela sofria de paralisia temporária. Tudo isso foi demais para os Moffats mais sedentários de Kuruman tolerarem. Em 1851, quando souberam, através de sua filha (que estava novamente grávida), que Livingstone planejava levá-la com as “queridas crianças” em outra viagem pela selva, a Sra. Moffat escreveu a seu genro uma carta, ao estilo característicos de algumas sogras:

Mary me assegurou todo o tempo que se estivesse grávida você não a levaria, mas permitiria que viesse para cá depois de sua partida… Mas para meu espanto recebi agora uma carta – no qual ela escreve: “Devo novamente seguir meu penoso caminho para o interior e, talvez dor à luz no campo. ó Livingstone o que você está pensando – já não foi bastante perder o seu lindo bebê e salvar com dificuldade os outros, enquanto a mãe voltou para casa ameaçada de paralisia? E você vai expô-la de novo, e a eles, a outra expedição de exploração? O mundo inteiro condena ainda a crueldade da coisa, para não mencionar a indignidade da mesma. Uma mulher grávida com três crianças pequenas, percorrendo as estradas com pessoas do outro sexo – através das selvas da África entre selvagens e feras! Se você tivesse encontrado um lugar para o qual desejasse ir e dar início a um trabalho missionário a questão seria diferente. Eu não diria uma palavra mesmo que fossem para as montanhas da lua – mos seguir com um grupo de exploradores, a idéia é um absurdo. Despeço-me, bastante preocupada. M. Moffat.

Se a carta faria Livingstone mudar de idéia é impossível afirmar. Mas o fato é que ele não a recebeu senão quando já tinha partido com toda a família. A 15 de setembro de 1851, um mês após a partida, Mary teve seu quinto filho no rio Zouga, a cujo evento Livingstone só dedicou uma linha em seu diário, deixando mais espaço para a empolgante descoberta de ovos de crocodilo. Ignorando aparentemente sua própria participação, Livingstone queixava-se das “gestações freqüentes” da esposa, comparando os resultados à produção de uma “grande fábrica irlandesa”. Ele, todavia, amava genuinamente os filhos e anos mais tarde lamentou não ter passado mais tempo com os mesmos. Em 1852, Livingstone chegara à conclusão que viagens de exploração na África não eram próprias para uma mãe com filhos pequenos. Ele tinha antes justificado o risco. “É uma aventura levar mulher e filhos a um país onde a febre – a febre africana – prevalece. Mas quem, crendo em Jesus, se recusaria a enfrentar essa aventura para um tal Capitão?” Ele não pôde porém suportar mais as críticas de seus sogros e de outros e, em março de 1 852, viu Mary e os filhos partirem da Cidade do Cabo para a Inglaterra. Como poderia sacrificar sua família pelas explorações da África? “Nada senão uma forte convicção de que isso será para a glória de Cristo me faria deixar órfãos meus filhos.”

Os cinco anos seguintes foram deprimentes para Mary. Um biógrafo escreveu que ela e as crianças não estavam apenas “sem casa e sem amigos”, mas também “vivendo quase sempre à beira da pobreza em alojamentos baratos”. Circularam também boatos entre os missionários residentes da SML, que Mary tinha caído em trevas espirituais, afogando sua miséria no álcool.” Para Livingstone, no entanto o período foi de alegria e sucesso, muito mais estimulante do que sua vida anterior na África. Ele tinha pouco a mostrar pelos seus primeiros onze anos. Não havia convertidos firmes, nem posto missionário, nem igreja. Era um explorador frustrado, limitado pelo ambiente e preso pela família. Mas agora podia mover-se à vontade. O interior da África o chamava.

A primeira e maior expedição de Livingstone o levou através do continente africano ao longo do rio Zambesi. Depois de despedir-se da família do Cabo, ele voltou vagarosamente para o norte, parando em Kururnan e seguindo depois para a sua tribo favorita, os rnakololos, onde recrutou vários deles para acompanhá-lo na expedição. Partindo da África central, eles seguiram o rio para o nordeste até a costa em Luanda. Foi uma viagem arriscada, com ameaças contínuas de tribos inimigas e o perigo mortal da febre africana, mas Livingstone jamais pensou em voltar. Embora fosse em primeiro lugar um explorador, ele nunca abandonou por inteiro a evangelização. Carregava em sua bagagem uma “lanterna mágica” (uma versão antiga de um projetor de “slides”) corri figuras mostrando cenas bíblicas. Estava plantando a semente para o futuro trabalho missionário. Depois de seis meses de viagem árdua, Livingstone e seus homens fizeram história ao chegarem vivos à costa.

Apesar de ter recebido ofertas de capitães de navios para levá-lo à Inglaterra, Livingstone sentia-se sob a obrigação pessoal de devolver os homens de Makololo à sua terra e retrocedeu então Zambesi abaixo para a costa leste. A jornada para o leste foi mais lenta, prejudicada por inúmeros ataques de febre africana. Depois de onze meses chegou a Linyanti, seu ponto de partida original, e dali continuou até as grandes quedas que chamou de Vitória, em honra de sua rainha. A partir desse ponto, o único objetivo de Livingstone era explorar o Zambesi corno uma possível rota comercial para o Oriente. Quanto mais encontrava o desumano tráfico de escravos dos portugueses e árabes, tanto mais se convencia de que somente a combinação de “comércio e cristianismo” poderia salvar a África. Ele sabia que os escravagistas não poderiam manter o negócio sem a colaboração dos africanos (uma tribo capturando escravos de outra inimiga), e sua solução era levar à África o comércio legítimo. Ele acreditava entretanto, que isto só seria possível se uma rota comercial navegável pudesse ser encontrada.

Embora a expedição de Livingstone não seguisse todo o tempo o Zambesi, ele chegou à costa em maio de 1856, proclamando confiante (apesar de incorretamente) que o Zambese era navegável. Foi uma ocasião feliz, mas Livingstone ficou novamente decepcionado, como acontecera na costa oeste, por não encontrar uma carta de Mary em suas correspondências.

De volta à Inglaterra em dezembro de 1856, depois de quinze anos na África, Livingstone foi aclamado como herói nacional. Depois de passar apenas três dias com a família, partiu para Londres onde iniciou uma agitada viagem de palestras que durou um ano, diante de multidões de admiradores, aceitando vários dos mais altos prêmios da nação. No decorrer desse ano na Inglaterra, Livingstone também escreveu seu primeiro livro, “Missionary Travels and Researches in South Africa” (Viagens Missionárias e Pesquisas na África do Sul), inspirando a fundação de novas sociedades missionárias. Foi um ponto alto em sua vida e também um período de decisões. Antes de voltar à África em 1858, Livingstone cortou seus laços com a SML e aceitou uma comissão do governo britânico que lhe concedia mais fundos e equipamento.

Os últimos quinze anos da vida de Livingstone jamais puderam recapturar a glória de 1857. Ele voltou à África com um séquito oficial para a sua segunda expedição, apenas para descobrir que o rio Zambesi não era navegável. A parte do rio que ele não explorara na viagem anterior continha gargantas rochosas e corredeiras espumantes. Desapontado, voltou-se para o norte (mais próximo da costa leste) a fim de explorar o rio Shire e o Lago Nyasa. Infelizmente, os caçadores de escravos seguiram a pista deixada por ele e assim, durante algum tempo, sua descoberta ajudou mais a abrir a região para o tráfico de escravo do que para as missões. Missionários também seguiram seus passos até a região do rio Shire, mas não sem penoso sacrifício. A Missão Universitária para a África Central, fundada como resultado de um discurso estimulante de Livingstone em Carnbridge, entrou na área cheia de entusiasmo e falsas esperanças de condições de vida favoráveis. Livingstone não era um bom organizador e a missão logo se transformou num caos. O bispo Charies Mackenzie, clérigo-chefe do grupo, era uma figura controversa. Ele disse ter “chegado à África Oriental corri um bastão episcopal numa das mãos e um rifle na outra” e não hesitou em usar seu rifle e distribuir outros para os amigos africanos, a fim de lutarem contra a tribo ajawa que praticava o vil tráfico de escravos. “Seu comportamento criou um escândalo e prejudicou seriamente a MUAC. Em menos de um ano, todavia, Mackenzie morreu e outros do grupo missionário também pereceram, inclusive a mulher de Livingstone, Mary, que deixara os filhos na Inglaterra para juntar-se ao marido.

Livingstone voltou à Inglaterra em 1864, sendo dessa vez muito menos aclamado. Sua segunda expedição não tivera o sucesso que esperava e sua reputação ficara manchada. A maioria dos membros de seu grupo, antes enamorados de seu destemido líder, queixava-se agora amargamente de sua atitude autocrática e personalidade difícil.

Em 1865, Livingstone voltou à África pela última vez, a fim de começar sua terceira e última expedição, desta vez com o propósito de descobrir a origem do Nilo. Ele não levou europeus em sua companhia e de fato não viu outro europeu durante quase sete anos. Foi uma época difícil para Livingstone. Seu corpo estava devastado pela desnutrição, febre e hemorróidas que sangravam. Seus suprimentos foram muitas vezes roubados pelos mercadores árabes de escravos. Todavia, ao mesmo tempo, não foi um período infeliz de sua vida. Embora fracassasse em descobrir a fonte do Nilo, ele fez outras descobertas significativas e se achava em paz consigo mesmo e seu ambiente (exceto pelo contínuo tráfico de escravos que torturava sua consciência). Com o passar do tempo os africanos se acostumaram com o velho barbado, desdentado e de aspecto selvagem que freqüentemente lhes falava de seu Salvador.

Rumores da morte de Livingstone surgiram muitas vezes durante seus últimos anos na África. Apesar de sua reputação ter-se perdido em parte, o mundo ainda o reverenciava e tinha uma estranha curiosidade a respeito desse velho excêntrico nas selvas africanas. Foi essa curiosidade que levou o editor do jornal “New York Herald” a enviar seu versátil e ambicioso repórter, Henry Stanley, para encontrar Livingstone vivo ou morto. Depois de vários meses de busca, Stanley alcançou Livingstone em Ujiji ‘ perto do Lago Tanganica, em fins de 1871. O primeiro encontro foi embaraçoso. Ao desmontar do cavalo, Stanley inclinou-se e pronunciou a frase ridícula (que logo se tornaria parte do anedotário): “Dr. Livingstone, eu presumo”.

Stanley foi uma visita bem-vinda para Livingstone. Ele levava consigo remédios, alimento e outros (tens de que Livingstone precisava desesperadamente. E, talvez mais importante ainda, transmitiu notícias do mundo exterior e serviu de companhia. Os dois homens desenvolveram um relacionamento íntimo e terno. Numa comovente homenagem, Stanley descreveu os meses que conviveram:

Durante quatro meses e quatro dias, vivi com ele na mesma cabana ou no mesmo bote, ou na mesmo tenda, e jamais descobri qualquer defeito nele. Fui para a África com tantos preconceitos contra a religião quanto o pior pagão de Londres. Para um repórter como eu, que só tratava de guerras, reuniões de massa e encontros políticos as questões, sentimentais estavam completamente fora de minha província. Mas tive muito tempo para refletir ali. Eu me achava afastado do ambiente mundano. Vi aquele homem solitário naquele lugar e me perguntei: “Por que ele fica aqui? O que o inspira?” Durante meses depois de nos encontrarmos, me descobri prestando atenção às suas palavras, meditando a respeito daquele homem idoso que transmitia a mensagem: “deixe tudo e siga-me”. Aos poucos, vendo a sua piedade, sua gentileza, seu zelo, sua sinceridade, e como ele desempenhava silenciosamente suas tarefas, fui convertido por ele, embora não tivesse tentado isso.

Livingstone viveu pouco mais de um ano após a partida de Stanley. Seus empregados africanos o encontraram morto, ajoelhado junto a seu leito na manhã de 19 de maio de 1873. Eles amavam aquele velho e não puderam pensar num meio melhor de prestar suas honras do que enviar seu corpo e papéis pessoais aos seus ex-associados na costa. Depois de sepultar seu coração sob uma árvore Mpundu, o corpo foi secado sob o forte sol africano até ser mumificado e depois o levaram por terra, numa viagem de 160km até a costa. Na Inglaterra, Livingstone teve um funeral com honras de estado na Abadia de Westminster, ao qual compareceram dignatários de todo o país. Foi um dia de luto para seus filhos, que foram despedir-se do pai que jamais tinham conhecido realmente; mas foi um momento particularmente triste para o idoso Robert Moffat, já com 78 anos, que caminhou vagarosamente pela nave diante do caixão que levava o homem que décadas antes naquela mesma cidade havia recebido a visão de “milhares de povoados, onde missionário algum estivera antes”.

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Bibliografia:

‘…Até aos confins da terra.’ Uma História Biográficas das Missões Cristãs – Editora: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova

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