Autor: Sérgio Fonseca Cruz
Dias atrás, ouvi o vocalista da banda Charlie Brown Jr., o Chorão, dizer uma frase que chamou minha atenção: “É melhor ser odiado por aquilo que a gente é, do que ser amado por aquilo que a gente não é”. Ele disse estas palavras num programa de tv, em meio a um contexto de separação da antiga formação da banda.
É interessante perceber como as relações humanas transitam entre estes dois pólos: amor e ódio. Algumas pessoas chegam a falar que “o ódio é uma palavra, é um sentimento muito forte”. Pena que para estas pessoas o amor não seja uma palavra, ou um sentimento tão forte quanto. Talvez isto se dê em razão de ser “mais fácil” mobilizar nossos sentimentos negativos, na direção do outro, dependendo do que ele(a) nos tenha feito. Odiar, em determinadas situações, não exige de nós nenhum grande sacrifício. Diante de nossas dores e ressentimentos, das nossas feridas abertas, das nossas decepções em relação às pessoas que nos causaram mal, podemos perceber, de forma mais clarificada, como uma relação de amor pode se transformar numa relação caracterizada por sentimentos hostis, culminando no ódio. Parece que nestas circunstâncias, odiar é mais fácil.
Mas onde e como fica a força do amor? O livro bíblico de Cantares dá ênfase à força do amor ao nos dizer que “o amor é forte como a morte” (8:6). Contudo, sabemos que, mobilizar nossos sentimentos e afetos positivos na direção daqueles que nos feriram de alguma forma, não é nada fácil! Logo, volto a dizer que dependendo das circunstâncias é muito mais fácil odiar. Talvez tenha sido por esta razão que Jesus ensinou a seus discípulos que: “Se amais os que vos amam… se fizerdes o bem aos que vos fazem o bem, qual é a vossa recompensa? Amai, porém, os vossos inimigos…” Já nos é extremamente complicado “amar” aqueles aos quais amamos, que dirá “amar” aqueles que nos odeiam. Seria muito mais fácil se Jesus não tivesse nos dito isso, não seria? Amar exige de nós uma força tal, que paradoxalmente revela a fragilidade do nosso amor. É justamente neste momento que precisamos aprender a depender da graça de Jesus, porque o poder de Deus se aperfeiçoa na fraqueza (2Co 12:9).
Rubem Alves, pensando esta realidade dinâmica de amor e ódio, nos diz que: “O ódio produz casamentos duradouros. O ódio não suporta a idéia de ver o outro voando livre, para longe… O ódio segura, para que o outro não seja feliz. O ódio gruda mais que o amor. Porque o amor deixa o outro voar… Amar é ter um pássaro pousado no dedo. Quem tem um pássaro pousado no dedo sabe que a qualquer momento ele pode voar”. Podemos amar alguém, mas não podemos exigir que uma pessoa nos ame. Nesta perspectiva o amor é uma escolha pessoal, se contrapondo a uma exigência alheia. Amor é escolha e entrega pessoal; é uma relação sujeito e objeto. Ou seja, num momento sou o amante (aquele que ama), logo sujeito; noutro momento sou o amado (aquele que recebe o amor e interage com ele de forma positiva ou negativa), logo objeto.
Para finalizar, quero retomar a colocação do início deste artigo: “É melhor ser odiado por aquilo que a gente é, do que ser amado por aquilo que a gente não é”. O que está em questão nesta afirmação é o olhar do outro, permeado por expectativas ao nosso respeito, que tem por finalidade nos moldar ao desejo deste outro, para sermos amados. Será que podemos viver sempre em função daquilo que “os outros” esperam de nós para sermos “amados”? Será que podemos viver em função destas expectativas e exigências perversas que muitas vezes uma pseudo “relação amorosa” nos impõe? Será que como exigência deste “amor” temos que nos transformar numa outra pessoa que não somos na realidade? Amar e ser amado não é algo tão simples. Amar é algo complicado. Que Deus nos abençoe e nos ajude a trilharmos os caminhos do amor!
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