A Igreja e a Sociedade (Missão Urbana)

Autor: Por Jose L G Pereira *
A Igreja tanto influencia a sociedade ao seu redor quanto é influenciada. Qual o cenário da religiosidade brasileira hoje? Qual o perfil do membro da Escola Dominical e do fiel nos átrios? A cidade de Atenas, na época do apóstolo Paulo, parece um bom exemplo para os dias de hoje. A religião era um bufê do qual o ateniense se servia a gosto. Mas era comida que em vez de saciar a fome, abria mais o apetite.

Sabemos que o Brasileiro lê 1,2 livros por ano e 40% são de esoterismo, 30% de auto-ajuda, 25% do Paulo Coelho. O que sobra? O que preocupa é que a educação popular cristã nas igrejas é para todos os excluídos. Mas, qual excluído? Excluído de que? Como sistematizar todos os tais excluídos? Temos os excluídos religiosos, por exemplo, os que são “andarilhos” e verdadeiros “itinerantes” espirituais, sem religiosidade definida com espiritualidade aguçada e sem saber em quem e como Ter fé. Pois, andam de religião em religião, é o que freqüenta um terreiro de macumba na Sexta-feira, faz uma romaria a Basílica de Aparecida do Norte no Sábado e vem ao culto na Catedral da fé da Igreja Universal do Reino de Deus no Domingo… E pode procurar um de nossos professores na Escola Dominical durante a semana…

Qual o evangelismo e a prática educacional correta que falará a língua deste carente religioso? Não devemos dar a este necessitado um cristianismo cômodo, como um cardápio de restaurante para que escolha o que pretende se servir, caso isto ocorra, corremos o risco de tudo acabar num simples “aleluia e glória a Deus!” 1 e, depois, ele vai embora…. Continua a romaria…

A experiência nos mostra que a missão da educação popular cristã é formado pelo conjunto das práticas educativas realizadas nas igrejas com e por membros que são dos setores populares e, vivem dentro de uma perspectiva bíblica, política, econômica, social e histórica de transformação do ser humano e da mudança social. Por sua vez, os membros, por serem populares pertencem ao conjunto plural dos grupos sociais explorados e excluídos tanto da administração do poder público como da distribuição desigual dos excedentes econômicos. O perfil sócio-econômico do Brasil é severo, com uma minoria de privilegiados, uma maioria de necessitados e uma classe média sufocada. Uma realidade distante do padrão social e ético de Deus.

A maioria dos oprimidos sociais, ou seja, os excluídos em potencial, pertencem ao conjunto multiforme e não organizado da classe operária, dos desempregados, dos desiludidos dos diferentes extratos sócio-econômico da pequena/média/alta burguesia, dos itinerantes religiosos, das mulheres em sociedade machista, dos indígenas, dos pequenos empresários, dos proprietários rurais, dos agricultores , dos sem-terra, dos discriminados por etnia, por raça, por idade, por gênero, por doenças mortais e infecto-contagiosa, deficientes, etc.. São todos protagonistas do cenário que a igreja, na perspectiva da Educação Cristã, é designada a inserirem no reino de Deus e, colaborar para que deles surjam uns como educadores e outros como educandos.

Sem dúvida, os excluídos em potencial estão necessitados do amor de Deus. Mas, um novo excluído surge, é o crente recém convertido que pratica desvio de comportamento, como exemplo; é flagrado em bares bebendo, ou retornando às drogas, etc. Mal visto pelos membros da congregação são criticados e “dedurados” aos pastores e expulso da igreja. Invalidando a finalidade da igreja. Mais tarde, quando estiver desesperado e com culpa, entregue de vez ao mundanismo e for abordado novamente por um irmão solidário e cheio de compaixão, fica comovido com a mensagem do evangelho, provando que não foi discriminado pelo Espírito Santo e, sim, pelos membros da congregação que o expulsaram.

Somado ao polêmico cenário, o educador das salas de aula das igrejas de Cristo deverá levar em conta que as práticas de ensino nas escolas seculares vivem um império de exageros e falta de moderação, falta de continuidade, falta de organicidade, fazer pelo fazer, inchaço de materiais didáticos desnecessários e sem renovação. Não existe objetividade, realismo, sistematização de procedimentos e prática pedagógica sem nexo com a filosofia da educação.

Para piorar a situação, a grande maioria dos jovens hoje cresce com muito pouco, ou com nenhum contato real com Jesus. Jovens inteligentes, assíduos leitores de obras esotéricas, uma grande ignorância da tradição cristã, como se nada tivesse existido antes.. A única coisa que lhes resta do cristianismo é uma imagem deformada e envelhecida, como de algo opressor, acompanhado de normas e condutas antiquadas.

O conjunto formado é o cenário que o Educador Cristão tem para aplicar o seu labor, a didática. O desafio da vida e das mudanças históricas é encarar partindo do sentido mais profundo das coisas, para exercitar seu verdadeiro destino e vocação, junto a igreja, de forma a ser acolhedor, solidário e de muita compaixão, pois, todos são atores e “sê sóbrio em todas as coisas, suporta as aflições, faze o trabalho de um evangelista, cumpre cabalmente o teu ministério”.

Os presentes escritos têm acima de tudo o valor de um documento. Penso que eles transcendem os horizontes do episódio dos projetos educacionais brasileiros e da análise da crise da educação no Brasil.

Longe de esgotar o assunto das técnicas pedagógicas. Proponho, com este estudo, chamar a reflexão o professor/educador popular cristão para reavaliar seu trabalho e sua análise de materiais didáticos nas Escolas Bíblicas Dominicais. Olhar as propostas pedagógicas mais utilizadas no Brasil com os óculos do nosso Senhor, a Bíblia, ou seja, à luz da Palavra de Deus.

Não podendo desfazer a necessidade de uma fé com engajamento social. Proponho buscar uma identidade evangélica brasileira através de um pentecostalismo lúcido e urbano, aproximando o templo da sociedade. O professor cristão, nas salas de aula das igrejas, devem viver os seus sonhos, pois, não podem mais negar uma ideologia para encarnar em um mundo melhor com seus alunos, seja ela via socialismo, ou social democracia, outros ainda em democracia cristã. Entretanto, todos deverão Ter uma coisa em comum, que é a lealdade aos valores do Reino de Deus. O que devem evitar é o sacramento de suas ideologias. Já chega os quinhentos anos de cristianismo em sua versão ibérica, espanhola e portuguesa, que resistiram até a Reforma Protestante com seus elemento modernizadores.

Um estudo recente realizado na Argentina prova que há uma população flutuante que se chama evangélica, mas não milita em nenhuma igreja evangélica. Por que? É importante recordar que a esperança cristã não depende do triunfo de um sistema econômico, seja ele qual for. Nem do crescimento da igreja. A triunfo cristão está baseado na ressurreição de Cristo, e é essa ressurreição o que nutre a nossa esperança.

Por outro lado, o povo latino está desvalorizado, pois, somo simples espectadores, esperando o cumprimento de certas profecias que só acontecem em terras distantes. Somos ignorados escatológicamente e de segunda classe no Reino… O povo latino, não deve se sujeitar as influências dos fundamentalistas da América do Norte e nem ao liberalismo da Europa, muito menos a uma alienação de uma escatologia que crê que os piores acontecimentos do mundo marcam, para cada vez mais perto a volta de Cristo – e que, por assim pensar, o protestante fica omisso de lutar para restaurar uma justiça social – foi este erro que levou a ditadura militar e ao avanço do nazismo.

Com relação as igrejas pentecostais no Brasil é importante não só na sua metodologia, na sua hinologia, na comunicação com as massas, mas também pela sua percepção das necessidades sociais, na medida em que trabalhavam nas periferias, entre pessoas pobres. Há liberdade para se falar em justiça socio-político e engajamento social, também, é igreja forte e expressiva. Portanto, como fazer para que ela tome consciência dos dramas sociais sem a loucura da teologia da prosperidade pregada pelas igrejas neopentecostais e as carismáticas radicais, individualizada e reacionária, injetando via púlpito a ganância do turbo capitalismo em considerar as missões apenas como mercado, a Ceia do Senhor como remédio, a falta de dinheiro do povo como um demônio em seu bolso, a doença negociada com o valor do dízimo, o dinheiro do dízimo e das ofertas para pagar o luxo dos pastores e os pomposos templos e nenhum para as missões !! Parece que o lema é “não ide pregar o evangelho e, sim, vendê-lo!!!”

Com relação as igrejas históricas o desafio tem algumas semelhanças com as pentecostais. Como fazer com que elas deixem de se acharem liberais progressistas, vanguardistas pseudo-academizados e elitistas, com pastores metidos a intelectuais e, voltem-se para as massas excluídas.

Ambas as igrejas devem valorizar a necessidade de desfazer a desigualdade social como prática da igreja e não como estratégia de evangelização. Pois, caso contrário, corremos o risco de qualquer missão virar colonialismo, amiga de ditadura e valorização do poder. Veja o exemplo de pastores que fazem obras sociais não como prática da igreja e, sim, como estratégia de candidatura ao senado!!

Não é generalizado, mas, hoje, os evangélicos tomaram consciência de que o Evangelho precisa resgatar a pessoa na sua integridade, muito mais ampla do que nas décadas de 60 ou 70. Temos inúmeras igrejas envolvidas em projetos sociais. Toda igreja quer Ter sua creche, seu consultório médico, seu programa de distribuição de alimentos, o que é extremamente benéfico. É a Igreja tomando consciência da fome, da miséria, da angústia que aflige o país. Os problemas são mais de ordem política. Essa prática social ainda é muito assistencialista, imediatista, não há consciência da realidade política do país, da injustiça. Mas não vejo muito na ajuda ao pobre, muito pouco no tema da justiça, que é central na Bíblia. Nós não podemos ser cristãos sem trabalharmos na luta contra a injustiça.

Se isso deveria ser papel do Estado sozinho sem o envolvimento da igreja eu não sei. Mas, necessitamos de a assistência social nas igrejas de forma mais abrangente e vir junto com a conscientização política. No momento em que uma igreja grande desperta para a tarefa social, o Estado se encolhe e se exime um pouco mais de sua responsabilidade.

A Igreja não tem alternativa, senão a de estender a mão, porque isso é evangélico e, ao mesmo tempo, a tarefa da denúncia profética, que é a denúncia política. A Igreja tem de exigir um Estado no tamanho exato da sua necessidade. Não pode ser inchado, e sim enxuto. O Estado precisa ser voltado para o pobre, assim como a Igreja. Isso é evangélico, isso é teológico. Ela não pode se retirar de sua tarefa social, mas não deve cobrir o papel que é do Estado. A Igreja precisa lembrar o Estado disso. A dimensão política é uma das grandes lacunas na vida da Igreja.

A igreja pode ser o grande empecilho para as missões pois é sua tendência, como instituição, voltar-se para si mesma, num processo de auto-encantamento. As igrejas, no Brasil, cresceram e assumiram nova postura no cenário nacional. Isso as levou ao encantamento consigo mesmas.

A Igreja gosta de olhar no espelho da sua própria existência, canta-se a si mesma. É perigoso. Quanto mais se institucionaliza, mais se burocratiza e precisa lutar pela própria sobrevivência. Isso contamina até a forma do seu proselitismo, que passa a ser voltado para outros crentes. Coisas do tipo “eu roubo o membro da sua igreja porque você rouba o da minha”. Para sustentar todo esse aparato, é preciso agressividade no marketing e pouca ética. Esse tipo de proselitismo não é evangelização, é desrespeito pelo outro e a negação da irmandade.

Como diz Ariovaldo Ramos 8 , “A igreja prega, mas, só o Espírito Santo converte; não dá, portanto, para Ter garantias de crescimento, a menos que se troque o verdadeiro Evangelho de arrependimento por técnicas de manipulação de massas. A menos que, em lugar da cruz, ofereçamo-se técnicas de auto-ajuda; que se substitua a busca prioritária do Reino pelo conforto descompromissado dos filhos de rei; que, ao invés da comunhão, que exige humildade, forme-se um clube e, em lugar do Senhor Jesus, apresente-se um Jesus gênio da lâmpada pronto para atender qualquer pedido, de todo aquele que conheça o segredo de como esfregá-la – não sei, porém, se algo assim, pode ser chamado de igreja cristã.”

Concluindo, a salvação que o pastor, o educador cristão e o evangelista tem a oferecer é integral, ou seja, a da alma que é a ressurreição em Cristo para a vida eterna e a do corpo que é a vida na sociedade buscando a justiça, a compaixão, a solidariedade e a ética de Cristo.

Sabemos que o pobre conscientizado continua sendo um pobre. Mas é um pobre articulado para transformação social. É assim com qualquer membro de qualquer classe social numa igreja comprometida com a cultura. O pobre que se torna um não pobre do pentecostalismo é o equivalente ao pobre conscientizado da teologia da libertação. Aos alunos das escolas dominicais e aos fieis mostraremos que a fé é a aceitação do perdão e da graça de Deus, na Justificação, é o começo de uma nova interação com Deus, daquilo que se perdera no controle da vida e da sociedade.

Não podemos ensinar o duelo entre Deus e o mal, pois o cristianismo não é dualista e, sim, monista. O nosso Deus é o Senhor de todas as criaturas “…Como está escrito: Por minha vida, diz o Senhor, diante de mim se dobrará todo joelho, e toda língua dará louvores a Deus”, nada está em “pé de igualdade” com Ele. É uma grande farsa ensinar duelo entre Deus e demônios. É voltar a idade média. É ensino bíblico falso. É colocar o Poderoso Deus no mesmo nível do mal. É explorar o consciência mítica das pessoas para persuadi-las através do medo do sobrenatural. Jesus é acima de duelos. Já criou o mundo a seu comando, puxa e manipula a história para sua finalidade. A guerra é do homem em seu duelo interno do homem novo regenerado e sua velha natureza.

Talvez, nossos professores de escolas dominicais e os nossos pastores estejam lendo livros de duelos, de exorcismo e cheio de orações de combate. Em busca de ação instantânea de Deus na derrubada do inimigo… E, esquecendo de fazer crescer o seu cristianismo no conhecimento das coisas de Deus. Na Sistematização de seus estudos bíblicos. É perfeito o ensinamento deixado pelo educador e pregador C. S. Lewis que diz, “…uma das estratégia prediletas do diabo é, assim, desviar a atenção do educador cristão das coisas essenciais e evitar que ele procure compreendê-las; não deixá-lo refletir sobre as coisas como realmente são, fazendo-o prestar atenção somente nas manifestações externas ou na forma como ele mesmo as percebe subjetivamente. A percepção da realidade objetiva ou concreta das coisas é, em suma, o grande “perigo” do qual o diabo foge a todo custo (pois é precisamente esta experiência concreta, totalmente humana e existencial que Deus e os homens têm em comum, e que pode, de repente, aproximá-los): (…) Há dois erros acerca dos demônios, nos quais nossa espécie pode cair. Um é não acreditar em sua existência. O outro é acreditar e nutrir um interesse excessivo e doentio por eles. Os próprios diabos ficam igualmente satisfeitos com ambos os erros e saúdam o materialista ou o mágico, com o mesmo deleite. ”

A melhor maneira de o educador cristão preparar-se para o século XXI é “ver as coisas como são,” aplicando a educação relacional e a literatura, método ainda pouco desenvolvido na educação cristã, como meio para abrir oportunidades à discussão de conceitos fundamentais, tais como realidade, razão, fé e imaginação.

Dessa maneira, se poderá construir um projeto pedagógico capaz de nortear todos os educadores cristãos interessados em aprender a fazer frente aos desafios futuros, equipando-se com fé, razão, coragem e muita imaginação.

Bibliografia

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STOTT , John. Ouça o Espírito ouça o mundo – como ser um cristão contemporâneo. 2ª Ed. São Paulo: ABU, 1998

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RAMOS , Ariovaldo. IGREJA – E eu com isso? Compreendendo a igreja para poder vivê-la. 1ª Ed. São Paulo: SEPAL, 2000.

FERNANDEZ-ARMESTO , Felipe & Wilson Derek. Reforma – o cristianismo e o mundo 1500-2000. Rio de Janeiro: Record, 1997

CESAR & SHAULL, Waldo e Richard. Pentecostalismo e o futuro das igrejas cristãs – Promessas e Desafios. 1ª Ed. Petrópolis, São Leopoldo . Vozes e Sinodal, 1999.

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CAMPOS , Leonildo Silveira. Teatro, Templo e Mercado. 2ª Edição São Paulo: Vozes, UMESP e Simpósio.. 1999.

CAIRNS, Earle E. O Cristianismo através dos séculos – uma história da igreja cristã. 2ª Ed. São Paulo: Vida Nova, 2001.

GEISLER e NIX, Norman e William . Introdução Bíblica – como a Bíblia chegou até nós. 3ª Ed. São Paulo: Vida, 2000.

O´CONNOR, Jerome Murphy. Paulo – Biografia crítica. 1ª Ed. São Paulo: Loyola, 2000.

CÉSAR, Elben M. Lenz. História do Evangelismo do Brasil – dos jesuítas aos neopentecostais. 1ª Ed. Viçosa, MG: Ultimato, 2000.

Nova Iguaçu, RJ em 10 de junho de 2001.

1 Comentário

  1. Ejesus, conheça um trabalho sério e necessário em favor do Reino de Deus:

    “Toda a missão que Deus dá ela diz mais sobre repartir do que reter.
    Se alguém diz que recebeu de Deus uma missão mas retém mais do que reparte, saiba que esta tarefa não tem nada haver com deus. Reter é carnal, humano; Pois Deus não nos chama para acumular, mas para repartir. Hoje homens abastados usam o nome de Deus para acumular ainda mais.
    São só ricos, porém miseráveis!”

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