Autor: Presb. Hélcio Passos
…disse Eliseu: Distribui-os aos homens para que comam! Seu ajudante replicou: Como poderia eu distribuí-los para cem pessoas? Eliseu repetiu: Distribui-os aos homens para que comam! Assim fala o Senhor: Comerão e ainda há de sobrar. O ajudante distribuiu os pães em presença do povo. Eles comeram, e ainda houve sobra, de acordo com a palavra do Senhor (2 Rs 4.42-44).
A atitude de Eliseu, o homem de Deus, está diretamente ligada a atitude de Jesus, o filho do Homem, que nos evangelhos, com olhos de compaixão, vê a multidão faminta: Dai-lhes vós mesmos de comer… (Marcos 6.37). A voz profética é inconfundível: distribui-os aos homens para que comam…
Interessante notar, contudo, em nossas bíblias, que quase todas as passagens, tanto do Antigo quanto do Novo Testamento, que relatam esta atitude de compaixão de alimentar multidões recebem o título de “a multiplicação dos pães”. E é realmente difícil “escapar” desta interpretação que se cristalizou nos inúmeros sermões e publicações. Entretanto, temos visto outro caminho que o da multiplicação milagrosa: o da partilha responsável.
Em nenhuma das passagens bíblicas onde a multidão é alimentada (2 Reis 4.42-44; Mateus 14.13-21; 15.32-39; Marcos 6.30-44; 8.1-9; Lucas 9.10-17; João 6.1-14) aparece o termo: multiplicação. Com isto não estamos negando as incontáveis pregações que falaram, e falam, da multiplicação dos pães; mas devemos considerar que idéia da multiplicação milagrosa não faz parte da preocupação primeira daqueles que relataram a ação divina nestes casos. A palavra comum é justamente a distribuição.
Pessoas em trânsito tinham garantido, por lei, o direito de colher espigas, de alimentar seu rebanho, de apanhar os grãos caídos durante a vindima; a esmola, recomendada aos pobres destinava-se, em especial, àqueles que caminhavam à Jerusalém. Mesmo assim, havia pessoas famintas, sem ter o que comer… A distribuição do pão preservou, através dos evangelhos principalmente, a compaixão do Reino de Deus: Deus se preocupa com os fracos, famintos e peregrinos.
Como símbolo de fé, o alimento partilhado, revela o padrão do Reino de Jesus quanto a justiça social: todos comem e são saciados! Não há distinção! Não há sectarismo! Não há contendas! Não há privilégios… Na distribuição dos alimentos há harmonia fraterna (o cerne do Reino que “criará novos céus e nova terra” reúne o novo povo) que nasce da presença do Reino. Uma presença abençoadora: “tomou os pães e, após ter dado graças, partiu-os e os distribuiu…” A atmosfera de bênção faz de qualquer deserto um lugar de aproximação e de reconciliação.
Que haja hoje a mesma voz profética, o mesmo coração de compaixão, que crê na providencia divina e que diz: “Comerão e ainda há de sobrar!”
Faça um comentário