Autor: Autor Desconhecido
Publicado no Jornal O Estado de S. Paulo em 15/04/2001
Igreja ganha fiéis em áreas tradicionalmente dominadas por outras religiões
KENNETH WOODWARD – Newsweek
É domingo em Agbor, um afastado povoado no sudoeste da Nigéria, onde as galinhas ciscam em ruas de terra e há mais bicicletas do que carros. Durante toda a manhã, mulheres vestidas com roupas de colorido vivo, crianças de olhos grandes segurando as mãos de seus pais que trajam camisas brancas e calças pretas, seguem em bandos para igrejas.
Há mais de 20 templos no espaço de 1 quilômetro quadrado na cidade. Muitos deles católicos, anglicanos e protestantes – frutos da ação de missionários ocidentais. Mas, em sua maioria, são de origem puramente africana, como a Igreja Celestial de Cristo, a Igreja do Milagre Apostólico e a Capela dos Vencedores. O mesmo ocorre em todo o subcontinente africano, onde o cristianismo faz parte da vida de quase um terço da população.
O papa João Paulo II visitou a África dez vezes – mais do que qualquer outro continente fora da Europa – e por um bom motivo. Lá, o cristianismo está se espalhando mais rapidamente do que em qualquer outra época ou lugar. Entre os mais notáveis cristãos africanos está o cardeal Francis Arinze, um nigeriano funcionário do Vaticano, considerado um dos principais candidatos a tornar-se o primeiro papa negro da história.
Em 1900 – o início do que os protestantes norte-americanos batizaram como o século cristão -, 80% dos cristãos eram europeus ou norte-americanos. Hoje, 60% deles são cidadãos da África, Ásia e América Latina. “O centro do cristianismo mudou para o sul”, diz Andrew Walls, da Universidade de Edimburgo, na Escócia, especialista em história das missões cristãs. “Os acontecimentos que estão moldando o cristianismo do século 21 ocorrem na África e na Ásia.”
Pós-cristã – A Europa é agora uma sociedade pós-cristã. Na Escócia, menos de 10% dos cristãos vão regularmente à igreja, enquanto nas Filipinas esse número é de quase 70%. Só na Nigéria, os anglicanos são sete vezes mais numerosos do que os episcopalianos em todo Estados Unidos. Lá, há também quatro vezes menos presbiterianos que na República da Coréia.
A maré crescente dos cristãos não-ocidentais está alterando o mapa do cristianismo mundial e revertendo também a influência dentro do mundo católico e protestante.
Em fevereiro, o papa ampliou o Colégio dos Cardeais e, dos 135 aptos a eleger seu sucessor, 41% são de nações não-ocidentais. E, à medida que o cristianismo se torna uma religião verdadeiramente global, os teólogos da Índia e outras partes da Ásia estão desenvolvendo novas interpretações da fé, baseadas em seus contatos com tradições hindus e budistas.
O surgimento do cristianismo não-ocidental tem muitas causas convergentes.
Na Índia, por exemplo, o crescimento é principalmente entre os pertencentes às castas mais desprezadas, que encontram no cristianismo a esperança e a dignidade, negadas a eles pelo rígido sistema.
Em toda a parte onde se espalha, o cristianismo é também encarado como a religião do Ocidente bem-sucedido. Os missionários norte-americanos jamais foram tão ativos no mundo em desenvolvimento como agora, atingindo, por meio da televisão, os lares humildes com mensagens de milagre e salvação. Como resultado, pela primeira vez na história, o cristianismo tornou-se uma religião particularmente dos pobres, dos marginalizados, dos destituídos de poder e dos oprimidos.
Seminaristas – Os cristãos do Ocidente já estão experimentando os efeitos dessa grande mudança demográfica. Países que antes eram considerados terras cristãs transformaram-se em territórios de missão do novo milênio. Evangelizadores procedentes da América Latina e da África fazem hoje cruzadas em Londres e Berlim. Em Roma, os seminaristas de antigos países de missão são agora tão numerosos quanto os da Europa e da América do Norte. Os Estados Unidos costumavam ser a fonte primária de novos recrutas para os jesuítas. Atualmente, a Índia é o maior fornecedor dos seus noviços.
Mas, para milhões de cristãos na África e na Ásia, palavras como “protestante” e “católico” inspiram pouco. Segundo David Barrett, co-autor da Enciclopédia Mundial Cristã, existem agora 33.600 denominações cristãs diferentes. Como no passado, os novos cristãos de hoje tendem a tirar da Bíblia tudo o que atende a suas necessidades e a ignorar o que não combina com suas tradições. Na Índia, onde o pecado é identificado com o “mau carma” nesta vida e em vidas anteriores, muitos convertidos interpretam a cruz como um sacrifício de Jesus que retira suas próprias falhas cármicas, libertando assim suas almas de futuros renascimentos.
Em algumas partes da África, onde a urbanização dissolveu a antiga moralidade tribal, muitos novos cristãos substituíram essa moral pelo rigoroso “código de pureza” que rege o comportamento pessoal que eles encontram esboçado no Livro do Levítico.
Faça um comentário