Pois teu é o Reino, o poder e a glória

Autor: Ricardo Barbosa de Souza
Uma das grandes dificuldades que enfrentamos hoje é a de viver num mundo que é maravilhosamente belo, ao mesmo tempo em que é terrivelmente feio. Onde encontramos tantos gestos nobres e ao mesmo tempo convivemos com a corrupção e a violência. Nossos olhos se encantam com a exuberância da criação, ao mesmo tempo em que choram pela devastação irracional do meio ambiente.

A oração do Pai Nosso nos oferece um caminho para nosso relacionamento com Deus no mundo em que vivemos. É a oração onde o céu e a terra se encontram (assim na terra como no céu), onde o presente antecipa o futuro (venha o teu reino), onde Deus e o homem se encontram (teu reino e nosso pão). É uma oração que nos conecta com a realidade (Deus e a criação).

A doxologia final da oração resume toda a oração e todo o ensino de Jesus: “pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre”. O nosso Senhor nos ensina a orar a oração que o Pai sempre ouve e responde, porque nesta oração encontramos aquilo que está no coração do Pai. Vimos que o eixo que percorre toda a oração é o desejo de Deus de que tudo seja na terra assim como é no céu.

O tema central de todo o ensino e da oração de Jesus é o reino de Deus. Jesus anuncia a chegada do seu reino em meio à presença do reinado de César. O império romano dominava grande parte da Europa e do oriente. César era o grande imperador. Roma ditava as regras e a cultura. É dentro deste cenário que Jesus anuncia a chegada do reino de Deus. Um reino presente em meio ao reino pagão de Roma.

Porém, a natureza do reino de Deus fica clara na conversa de Jesus com Pilatos. Ele afirma que a agenda do seu reino não é a mesma do reino de César: “Meu reino não é deste mundo”. Na terceira tentação, Jesus rejeita a oferta do Diabo, que lhe oferece “os reinos deste mundo e a autoridade sobre eles”. Quando Jesus foi inquirido sobre o pagamento de impostos, disse: “dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

Precisamos reconhecer o processo revolucionário do reino de Deus. É um reino que não vem de forma muito visível, ele é como uma semente de mostarda, pequena, enterrada, mas que cresce e se transforma numa árvore. Ele acontece em meio aos outros reinos deste mundo. Em sua oração sacerdotal, Jesus afirma que o seu povo não é deste mundo, mas que permanece nele. Ele não ora para que sejamos tirados deste mundo, mas para que sejamos libertos das armadilhas do grande tentador. O palco onde o reino de Deus acontece é sempre na história, em meio a outros reinos, muitos deles cruéis e corruptos.

Nossa identidade primeira, a partir do momento em que reconhecemos em Jesus o Rei que veio, é a de servos do Rei. A declaração apocalíptica de que “O reino do mundo se tornou de nosso Senhor e do seu Cristo, e ele reinará pelos séculos dos séculos” (Ap 11:15), é típica do Novo Testamento: Deus é Rei, e os reinos do mundo lhe foram submetidos. O crucificado e ressurreto Jesus de Nazaré é o Senhor dos senhores e Rei dos reis. Ele encontra-se reinando a destra de Deus Pai e virá novamente para consumar o seu reino, abolindo todos os inimigos, incluindo o pecado e a morte.

Precisamos relacionar estas visões apocalípticas do reino com a vida pública. Daniel e José se recusaram a qualquer compromisso com os reinos deste mundo (Babilônia ou Egito) e, num dado momento, foram usados por Deus em postos de comando nestas nações pagãs. Eles mantiveram a identidade primária. Sua fidelidade era para com Deus e não para Nabucodonosor ou outro Faraó qualquer. Trabalharam nestas nações pagãs, fizeram o melhor que podiam para o bem do próximo, mas sua lealdade sempre foi à Deus. Outros, em virtude da mesma fé e lealdade, foram martirizados, mas nunca privatizaram a fé. Viveram com fidelidade a Deus mesmo estando em reinos pagãos.

É por isto que Pedro afirma que o juízo sempre começa pela casa de Deus: “Porque a ocasião de começar o juízo pela casa de Deus é chegada; ora, se primeiro vem por nós, qual será o fim daqueles que não obedecem ao evangelho de Deus?” (I Pd 4:17). Os reinos deste mundo vêm e vão. Deus levanta e derruba. Esta é a compreensão que os profetas de Israel tinham dos reinos deste mundo.

Foi assim que aconteceu com Ciro, com Nabucodonosor e tantos outros que vieram. Cumpriram aquilo que Deus havia designado e foram “dispensados”.

Vivemos num mundo onde ainda convivemos com o belo e o feio, com Roma e o Reinado de Cristo. Enquanto aguardamos a vinda do nosso Senhor para consumar seu propósito redentor, vivemos em fidelidade ao nosso Rei, porque dele é o reino, o poder e a glória para sempre.

Ricardo Barbosa – Pastor da IPP em Brasília, escritor e conferencista

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