Autor: Werner Kaschel
Cumpre-me declarar, inicialmente, que o tema “Pentecostismo: Evangelização e Protestantismo”, de natureza eminentemente prática, e de interesse para os evangélicos em geral, não merecerá, neste trabalho o tratamento devido, por questão de limitação de tempo dado a seu preparo. Um mês e meio de prazo não me permitiram a realização de pesquisa de amplitude nacional, neste terreno, pesquisa essa que teria concorrido não somente para sugerir diferentes ângulos de aproximação, como também teria contribuído para dar maior validade às afirmações.
Propus-me, todavia, a não fugir à solicitação generosa do Secretário Executivo da ASTE, que naturalmente se vê assoberbado com mil problemas para promover um simpósio como este, e aceito a incumbência cabalmente cônscio das muitas imperfeições do trabalho.
Servirá, se não para outra coisa, pelo menos de roteiro para a discussão a seguir, quando a experiência e o talento dos companheiros suprirá a contento as lacunas e imperfeições de meu arrazoado.
Consideremos, primeiramente, o tópico evangelização.
Por evangelização entendemos a ação evangelística, isto é, os processos de ganhar as almas para Cristo, em primeiro lugar, seguindo-se os esforços no sentido de ser levado o convertido a unir-se a uma igreja local, em cujo ambiente há de crescer na fé, no conhecimento doutrinário e na prática das virtudes cristãs. Nessa atividade evangelística, não há negar, os crentes pentecostais levam a palma.
Revelam, por isso, os grupos pentecostais maior índice de crescimento numérico do que qualquer outro ramo evangélico no Brasil. Várias razões podem ser mencionadas para explicar esse crescimento.
Ardor e entusiasmo dos crentes pentecostais salta à vista. Sua fé simples e sincera os leva a comunicar a outros sua experiência de salvação, com o intuito de ganhá-los para Cristo. Referindo-se a essa “autêntica espontaneidade” da experiência dos pentecostais, Assim se expressa o Rev. Key Yuasa: “Uma evidência desse “conhecer” o Evangelho e “crescer” nele está no seu desejo de dar testemunho daquilo que já receberam, a par da disposição de ouvir novas pregações do Evangelho”(1).
Também merece menção o apego dos crentes pentecostais à Bíblia.
É comum vê-los, aos domingos, dirigindo-se à casa de oração, sempre portando o “Livro de Capa Preta” debaixo do braço, o que não acontece com membros de outras denominações mais antigas, muitos dos quais vão ao templo sem levar nem Bíblia, nem hinário.
A espontaneidade e simplicidade já referidas podem levar-nos a uma indignação que me tem ocorrido mais de uma vez durante meu ministério de vinte e dois anos: a ausência de interesse teológico, a falta de cultura teológica dos pastores pentecostais não seria elemento a pesar favoravelmente na balança de seu entusiasmo, e do de suas greis, pela Causa e de seu amor pelos perdidos? Não estaria, porventura, a teologia moderna e contemporânea contribuindo para intelectualizar nossa fé, destruindo-lhe ou mirando-lhe freqüentemente os próprios fundamentos?
A vida de testemunho do neo-convertido é elemento de valor na evangelização. Na pesquisa feita pelo Rev. Key Yuasa verificou-se que a população não pentecostal opinou, em geral, favoravelmente aos pentecostais, mencionando como suas características positivas: “transformação de suas vidas pela conversão, honestidade, abandono de vícios, pontualmente nos deveres, esforço no trabalho, regularidade, preocupação pelos outros, abertura para com os subordinados, julgamento correto e falta de ambição pelo poder econômico ou político”(2).
De outro lado observa-se que os pentecostais são um tanto afoitos em levar às águas batismais seus convertidos, os quais nem sempre se encontram em situação civil regular ou ainda não provaram ser realmente convertidos.
Tratemos, a seguir, do culto. Parece que os evangélicos radicais do Brasil a mais tempo tendem a restringir a participação dos fiéis nos atos do culto, os quais ficam sob a responsabilidade do ministro e do côro.
Limita-se, cada vez mais, o canto congregacional em nossas igrejas. Numa reunião pentecostal o povo participa, e como! Cantam com entusiasmo, dão testemunho das bênçãos recebidas, e oram, sempre confusamente, com gritos e gemidos. Mas o fato é que o povo participa.
Emotivo como é o latino, cá misturado com o índio e o negro, dá-se bem nesse tipo de ajuntamento, em que é melhor esteja, do que em sessões espíritas ou em danças de macumba.
Considera-se ainda a espécie de música usada nos cultos pentecostais, com acompanhamento ruidoso de conjuntos e bandas, o que não agradar às pessoas medianamente cultas, mas causa efeito apreciável nas massas que acorrem aos templos pentecostais.
É fato notório que os leigos são utilizados em grande escala nas igrejas pentecostais. Irmãos humildes, com instrução primária, saem a pregar nas casas, nas ruas e nas praças. E os outros, homens e mulheres, os acompanham. Aliás, a incultura desses pregadores, e de outros que se abalançam a falar até através de emissoras radiofônicas, cometendo as maiores atrocidades em relação à língua Portuguesa, provoca o afastamento ou reserva das classes média e alta.
As considerações anteriores nos conduzem naturalmente a esta outra afirmativa: o pentecostismo é religião de pobres. Jesus, pregando em Nazaré, disse: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar aos pobres”(Lc.4:18). Respondendo à consulta de João Batista, afirmou: “Aos pobres está sendo anunciado o Evangelho” (Mt.11:5). Mesmo que não estejamos acordes quanto à interpretação destas passagens, não podemos negar o fato de que os pobres, pobres mesmo, pouco recebem nossas congregações tanto em matéria de atenção pessoal, como de alimento espiritual ministrado à altura de sua compreensão.
Tratemos, a seguir, do segundo tópico deste trabalho, a saber, do proselitismo. Define-se como proselitismo a atividade afanosa em fazer prosélitos, em convencer outros a aderirem a determinada doutrina ou sistema. O Cristianismo é essencialmente proselitista, missionário, visto que somente através de Cristo entendemos possa o homem ser salvo.
Neste trabalho, todavia, restringimos o sentido do termo proselitismo à ação dos pentecostais procurando atrair para seu seio crentes filiados a outras denominações evangélicas. Tenho a impressão de que esse proselitismo dos grupos pentecostais mais antigos arrefeceu.
Aliás, a tendência proselitista do pentecostismo se explica à luz da doutrina que esposam acerca do batismo no Espírito Santo. Para os pentecostais, “o batismo do Espírito Santo é uma experiência distinta que acompanha a salvação, para aqueles que crêem; todos os crentes tem o direito de o receber, todos devem busca-lo fervorosamente, pois a promessa é para todos”(3). O sinal inequívoco desse batismo é, segundo os pentecostais, o dom de línguas. Sendo assim compreende-se que um crente pentecostal se esforce por levar outro, pertencente a outra denominação a “ser batizado no Espírito Santo”, afim de completar em si mesmo a obra da salvação.
A história do início do Movimento Pentecostal no Brasil confirma o fato de sua natureza proselitista. Em Belém do Para, com elementos da Igreja Batista local, aliciados por dois pentecostais suecos vindos dos Estados Unidos, foi organizada a primeira igreja pentecostal no Brasil.
No seio das denominações históricas, no Brasil, tem surgido recentemente tendências pentecostais. Faço breve referência, aqui, à defecção dentre os batistas.
A coisa de quatro anos os arraiais batistas começaram a ser perturbados por movimento de natureza pentecostal, denominado Renovação Espiritual. Inicialmente não apresentava maiores perigos, pois o objetivo era alcançar um avivamento espiritual em nossa Pátria. Com o passar do tempo descambou, soe acontecer nesses casos, dando ênfase aos dons de cura, língua e profecia, havendo também reuniões caracterizadas por “confusão no ambiente, gritaria, descontroles físicos e outros excesso de emocionalismo”(4). A origem do problema se encontra, todavia, na diferença de compreensão quanto ao que seja o batismo no Espírito Santo. Enquanto as convicções doutrinárias divergentes, esposadas por alguns líderes, não se tornaram públicas nem notórias, não surgiram maiores problemas, visto ser da natureza do evangelho a liberdade de crer nas escrituras de acordo com as luzes da própria inteligência iluminada pelo Espírito Santo. Acontece, todavia, que o pentecostismo é proselitista por natureza; e, portanto, fraciona e provoca reações. O parecer da comissão dos treze, aprovado por duas assembléias seguidas da Convenção Batista Brasileira, faz referência a esses proselitismo nos seguintes termos: “A ênfase dada à doutrina do batismo no Espírito Santo como uma segunda bênção tem originado os seguintes abusos que sinceramente deploramos: …3) tentativa ostensivas ou veladas de proselitismo entre outras igrejas” (5).
A terceira recomendação suplementar da comissão dos Treze é vazada nestes termos: “Que as igrejas e pastores que se tem afastado das doutrinas batistas e se aproximado das doutrinas pentecostais sejam convidados com todo amor a um reestudo de sua posição à luz do parecer ora apresentado. Caso persista ponto de vistas contrário à posição doutrinária sustentada pela Convenção Batista Brasileira, sintam-se à vontade para uma retirada pacífica e honrosa, em benefício da paz na causa de Deus. Tal recomendação se limita àqueles que fazem de suas convicções divergentes motivo de atividade ostensiva, provocando inquietação, confusão e divisão”(6).
O Pr. Rubens Lopes, no antelóquio do livro referido, escreve: “Quanto aos métodos, o Parecer condena o proselitismo que Renovação Espiritual realiza nas igrejas batistas (Declaração, 6-3), fomentando divisões e desconfianças, estas, principalmente, em torno de obreiros que são rebaixados à condição de “carnais”, desde que não pactuem com as novas idéias (Declaração 6:2)” (7).
Para fecho deste trabalho creio que posso afirmar seja o anelo comum, dos evangélicos dedicarem-se todos os crentes à tarefa de buscar perdidos e ganha-los para Cristo. Buscar perdidos, isto é, os que não conhecem a Cristo, que se não apropriaram de sua graça pela fé. E se há multidões assim, porque malbaratar precioso tempo na tarefa ingrata de proselitar? Que o Santo Espírito encha de sabedoria os fiéis, a fim de que saibam sempre escolher o melhor, empregando suas fracas forças na extensão inteligente do Reino de Deus na terra.
Boletim Informativo da Associação de Seminários Teológicos Evangélicos, São Paulo, março de 1965, pag.6.
Id., pág. 9.
Emílio Conde, “Princípios e Diretrizes das Assembléias de Deus no Brasil”, em Cristianismo, março de 1951.
A Doutrina do Espírito Santo – Parecer da Comissão dos Treze, Rio de Janeiro, Casa Publicadora Batista, 1963, pág.18.
Id., págs. 18s.
Id., págs. 19s.
Id., pág. 8.
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