Missão se faz com oração (e jejum também!)

Autor: Josivaldo de França Pereira

“E, servindo eles ao Senhor e jejuando, disse o Espírito Santo: Separai-me, agora, Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho chamado. Então, jejuando, e orando, e impondo sobre eles as mãos, os despediram” (At 13.2,3).

José Martins disse corretamente: “A oração é a essência da obra missionária. Não é só uma atividade necessária ao sucesso da obra – é a obra  em  si. É  a  prática  mais missionária possível, quando vivida de maneira bíblica”.[1] É evidente que Martins não quer dizer que oração e missões são a mesma coisa, e sim, que essas duas atividades devem vir interligadas uma na outra. Nunca é demais enfatizar a importância da prática da oração na obra missionária.
Quando o Espírito Santo ordenou que a igreja de Antioquia separasse Paulo e Barnabé para a obra que os tinha chamado, a igreja estava em oração. Esta verdade está implícita e explícita em Atos 13.2 e 3, respectivamente.
Implicitamente porque o versículo dois diz o seguinte: “E, servindo eles ao Senhor, e jejuando…”. O fato da igreja estar jejuando subentende-se que  ela  estava também orando. Seria incoerente pensar que uma igreja que estava adorando a Deus e jejuando não estivesse em oração. Nem toda oração é feita em jejum, mas todo jejum bíblico é feito com oração.  Além disso, temos uma evidência explícita de que a igreja de Antioquia realmente orava naquela ocasião: “Então, jejuando e orando…” (v3). Não sabemos ao certo se o jejum do verso 3 é o mesmo do verso 2. Pela urgência do chamado do Espírito, tudo indica que sim. Mas se é o mesmo ou deixa de ser, não é tão importante sabermos. Basta saber que a igreja de Antioquia era uma igreja de oração e que fazia da oração a base de sua missão.
É provável que o exemplo da igreja de Antioquia tenha marcado positivamente o ministério de Paulo. Paulo foi um homem de oração e recomendava às igrejas que orassem por ele e pela expansão do evangelho de Jesus Cristo.
Agora, mais do que simplesmente orar, a igreja de Antioquia era uma igreja que exercia a prática do jejum. É impressionante a ênfase que Lucas dá ao jejum na igreja de Antioquia. Em Atos 13.2 ele diz que a igreja jejuava, e não menciona a oração, embora sabemos que ela também orava, conforme dissemos acima. No verso 3, do mesmo capítulo 13, Lucas coloca a palavra “jejuando” na frente de “orando”. No texto grego é a mesma coisa: nestéusantes kai proseuxamenoi. A ordem das palavras é significativa e não pode ser menosprezada, como parece fazer a maioria dos autores que consultamos.
A ênfase de Lucas é importante por duas razões pelo menos: 1) Não devemos pensar que a igreja de Antioquia jejuava porque trazia resquícios do judaísmo. Esta não seria uma forma  interessante  de se pensar,  primeiro  porque  Lucas era gentio (provavelmente da cidade de Antioquia da Síria)[2] e, por  isso  mesmo,  qual  o  interesse  dele  em  dar  tanta ênfase a uma prática estritamente judaica? Segundo, a igreja de Antioquia foi uma das igrejas mais anti-judaicas do passado, naquilo que se refere às práticas religiosas do judaísmo. Direta ou indiretamente o Concílio de Jerusalém de Atos 15 aconteceu em  razão  desse  anti-judaísmo-cerimonialista. 2) Acreditamos que Lucas fez questão em enfatizar a prática do jejum pela igreja de Antioquia, primeiramente para mostrar que jejum e oração não são incompatíveis na vida de uma igreja e, em segundo lugar, mostrar como esta prática era (e deve ser) valorizada no meio de uma igreja verdadeiramente missionária.
Se muitas de nossas igrejas têm falhado na prática da oração, e falhado mais ainda em rogar ao Senhor da seara que mande trabalhadores para a Sua seara, em interceder pelos missionários e orar pela obra missionária de um modo geral, o que dizer então da prática do jejum em nossas igrejas?
Acredito que as igrejas históricas têm falhado até agora em subestimar a importância do jejum na vida do povo de Deus. Quantos são os membros destas igrejas que jejuam? Quantos de seus pastores jejuam? Muitos de nós mal oramos, diga-se de passagem.
Na minha própria denominação, Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB), aprendi: “Sem o propósito de santificar de maneira particular qualquer outro dia que não seja o dia do Senhor, em casos  muito  excepcionais  de  calamidades  públicas, como guerras, epidemias, terremotos, etc., é recomendável a observância de dia de jejum ou, cessadas tais calamidades, de ações de graças” (Princípios de Liturgia, XI). Se o povo de Deus tiver que jejuar “em casos muito excepcionais de calamidades públicas, como guerras, epidemias, terremotos, etc.”, conforme prescrevem os princípios de liturgia da IPB, dificilmente existirá um dia de jejum neste país! Que o jejum deve ser praticado em dias de calamidades públicas não questionamos, pois a Bíblia nos dá vários exemplos disso. Mas será que devemos jejuar somente em casos muito excepcionais  de calamidades públicas?  Da  forma  como  foi  redigido  o  princípio para a prática de jejum na IPB, ao invés de estimular o crente a praticá-lo, ele faz exatamente  o  contrário.  Não que o  princípio  fora  escrito  com o objetivo  de desestimular quem quer que seja, porém, na prática é o que tem acontecido. Creio que o capítulo sobre jejum deveria ser revisto pela IPB, primeiro porque ele não expressa corretamente a realidade brasileira e também por não apresentar uma definição mais completa do verdadeiro conceito bíblico de jejum.
Apesar da Igreja Primitiva ter vivido momentos de muitas provações, nada indica que naquela ocasião especial de Atos 13 a igreja de Antioquia estivesse jejuando e orando porque passava por momentos difíceis. Pelo contrário, o contexto próximo (cap. 12) indica que a Igreja Primitiva, de modo geral, estava vivendo um dos seus melhores dias. Pedro havia sido libertado milagrosamente da prisão e um dos maiores inimigos da igreja, o rei Herodes Agripa I, foi morto mediante a intervenção de um anjo do Senhor. Enquanto isso, “a palavra do Senhor crescia e se multiplicava” (At 12.24).
A igreja de Antioquia buscava a presença de Deus pelo simples prazer de estar servindo a Deus. E continuou assim quando enviou seus missionários e os sustentou com fervorosas orações.
Que Deus conceda à igreja brasileira a graça de ser uma igreja que se alegre em estar em Sua presença, intercedendo dia após dia pela obra missionária do Brasil e do mundo.

O autor é pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil em Bragança Paulista. Bacharel em Teologia pelo Seminário
Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição – SP
Licenciado em Filosofia pelas Faculdades Associadas do Ipiranga – SP – Mestre em Missiologia pela Faculdade Teológica Sul Americana de Londrina – PR
Doutorando em Ministério pelo Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper/Mackenzie – SP e Reformed Theological Seminary – EUA

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[1]José MARTINS, A oração dominical e missões. In: Missões e a igreja brasileira: perspectivas teológicas, p. 67. V. t. Durvalina B. BEZERRA, A missão de interceder: oração na obra missionária. Londrina: Descoberta, 2001, p. 229-244.
[2] Cf. Simon J. KISTEMAKER, New Testament Commentary: Exposition of the Acts of the Apostles. Grand Rapids: Baker Book House, 1990, p. 20,21..

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