Autor: Ligon Duncan
Justificação pela fé desafia toda tentativa de domesticá-la e modificá-la.
Muitos de nós estamos familiarizados com a história inspiradora do audacioso monge alemão, Martinho Lutero, pregando suas Noventa e Cinco Teses na porta da igreja em Wittenberg, em 31 de Outubro de 1517. Muitos de nós sabemos que uma das suas grandes preocupações foi a doutrina da justificação pela fé somente. E alguns de nós sabemos que esta verdade tem sido uma marca da pregação evangélica fiel, desde então. Mas, nós podemos nunca ter apreciado exatamente como esta verdade radical é.
Preparando para Ouvir uma Verdade Radical
Justificação pela fé é uma das coisas mais impressionantes que nós jamais ouvimos. Mas, deixemos certo que entendemos todos os termos e conceitos claramente:
† Justificado significa que somos declarados justos, não feito justos.
† Quando dizemos que somos justificados pela fé, enfatizamos que somos declarados justos, não porque nós mesmos somos justos, mas antes, somos declarados justos por outra razão.
† Justificado pela fé não significa que somos justificados com base na nossa crença, por causa da nossa crença, ou sobre o fundamento da nossa própria crença – que seria apenas outra forma de dizer que somos justificados por algo que somos ou fazemos. Não, “justificado pela fé” significa que fé é o instrumento ou o meio pelo qual recebemos a justificação graciosa de Deus, uma declaração baseada em algo fora de nós mesmos.
† Assim, a doutrina da justificação pela fé não é meramente que somos justificados pela nossa fé em oposição às nossas obras. Não é que a nossa fé que nos salva, ao invés de nossas obras, ou que nossa fé é a base de nossa salvação, ao invés de nossas obras. Pelo contrário, a doutrina da justificação pela fé diz que somos justificados pela graça de Deus, não por causa de nossas obras, mas por causa da obra de Cristo – os benefícios salvadores que recebemos pela fé.
Em outras palavras, a razão pela qual Deus nos aceita e nos perdoa não é encontrada em nós! Não é porque nós somos bons. Não é porque nós somos melhores do que os outros. Não é porque Deus previu boas obras em nós. Não é porque Deus previu fé em nós. Ela é baseada sobre o que Deus viu em Cristo e creditou em nossa conta.
Esta é uma verdade gloriosa e radical. Mas, nós a temos aceitado sem questionar, temos esquecido-a e domesticado-a, e alguns hoje estão até mesmo tentando modificá-la. Repetidamente durante o passar dos anos, temos visto falsos mestres tentarem mover algo furtivamente do nosso avanço na justificação. Uma razão para isto: As pessoas não podem imaginar que Deus declararia pecadores serem justos. Isto é contra a intuição. Mas isto é precisamente o que Paulo diz que Deus faz. Nós naturalmente nos inclinamos a pensar que Deus justifica aqueles que são justos. Mas Paulo está dizendo que Deus aceita e perdoa aqueles que não merecem ser aceitos e perdoados, declara justos aqueles que são injustos, declara aceitos aqueles que não devem ser aceitos, e declara que pecadores em rebelião contra Ele são aceitos num relacionamento justo com Ele. Isto é quão radical a justificação pela fé é. Assim, é bom que voltemos para Paulo e ouçamos novamente esta verdade maravilhosa. Uma das explicações mais claras na Bíblia está em Romanos 3:21-28;
A Provisão Graciosa e Justa para os Pecadores
Note como Paulo primeiro explica que a salvação graciosa de Deus é justa: “Mas agora se manifestou aparte da Lei a justiça de Deus, tendo o testemunho da Lei e dos Profetas; isto é, a justiça de Deus através da fé em Jesus Cristo para todos e sobre todos os que crêem” (Romanos 3:21,22). Você poderia esperar Paulo dizer algo como isto: “Embora estivéssemos mortos em nossos delitos, e embora estivéssemos debaixo do justo julgamento de Deus, Deus demonstrou Sua graça em nos salvar através da fé”. Mas, em vez disso, Paulo diz que Deus demonstrou Sua justiça. Paulo enfatiza que a salvação graciosa de Deus é tanto justa como misericordiosa. Sua misericórdia não compromete, mas antes magnífica, a Sua santidade. Do mesmo modo que Deus nos aceita e nos perdoa, diz Paulo, Deus manifesta Sua justiça.
O Problema do Pecado
Segundo, Paulo, ao nos lembrar da gravidade do nosso problema, aumenta nosso senso de necessidade de resgate nos versos 22 e 23. O problema é o pecado. Tendo explicado este problema extensivamente em Romanos 1 e 2, ele sumariza: “Não há diferença; porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Romanos 3:22b,23). Em outras palavras, seja você um privilegiado israelita ou um gentio pagão, você tem sido pesado por Deus na balança e achado em falta. Ninguém jamais guardou a lei de Deus. Ninguém jamais viveu como imagem de Deus. Todos nós temos falhado. Este é o problema humano básico. É vital para nós parar e relembrar isto. Paulo diz que o nosso grande problema é o pecado; por causa dele, nós merecemos a condenação de Deus. Merecemos ser lançados fora da Sua presença. Merecemos o Seu julgamento. Paulo nos diz isso para deixar claro como cristal que a solução para o nosso problema não é encontrada em nós – na realidade, o problema é encontrado em nós!
O Plano da Justificação
Agora Paulo explica os meios pelos quais Deus nos perdoa. Nós somos “justificados gratuitamente pela Sua graça, através da redenção que há em Cristo Jesus” (Romanos 3:24). Paulo nos diz que a declaração gratuita de Deus de nossa inocência é a resposta ao nosso problema. Note que esta justificação não é baseada em algo em nós – nem nossos obras, nem nossa bondade, nem nossa fé, nem nossa fé ou obras previstas, nem nossa futura fidelidade. Ela é baseada em outra coisa, fora de nós. Você não obtém, merece, é digno ou contribui para o dom de Deus. Você o recebe pela fé como um dom de Sua graça.
Mas Paulo não pára aqui; ele enfaticamente aponta nossos olhos para longe de nós mesmos, para a cruz de Cristo para justificação. Nós somos, ele diz, “justificados gratuitamente pela Sua graça, através da redenção que há em Cristo Jesus; ao qual Deus apresentou como uma propiciação em Seu sangue pela fé…para demonstrar a Sua justiça” (Romanos 3:25,26). Isto é, o fundamento da solução para o nosso problema é a satisfação de Cristo da penalidade devida dos nossos pecados sobre a cruz – o fato dEle ter suportado a ira de Deus em nosso favor. Este é o motivo pelo qual é tão importante ver que a justificação não é baseada em algo dentro de nós: não nossas obras; não nossa bondade; não nossa fé. Ela é baseada sobre a pessoa e obra de Cristo! Pela fé, tiramos os olhos de nós mesmos, e olhamos para Ele. Confiamos no que Ele fez. Este é o motivo pelo qual Deus escolhe a fé como o instrumento da justificação, pois a fé salvadora é inerentemente auto-renunciadora.
Dessa forma, Deus está mostrando ser justo na salvação. Como, então? Pois, embora Deus mostre misericórdia ao não-merecedores e conceda Seu favor para o ímpio, Ele o faz sobre a base de uma justiça perfeita – os benefícios da qual recebemos pela fé. Seu Filho pagou por cada partícula de nosso pecado em nosso lugar. Jesus obteve nossa salvação pela Sua obra, para que Deus seja tanto misericordioso como justo. Ele é tanto justo como justificador daqueles que têm fé em Jesus (Romanos 3:26b).
Os Resultados de Nossa Justificação
E quais são os resultados de tudo isto? A jactância é excluída, por uma coisa (verso 27). Como você pode se gabar sobre algo numa salvação livremente lhe concedida somente em Jesus Cristo, e baseada em nada em você, antes ou depois da conversão? A justificação pela fé significa que somos justificados por causa de Cristo! Significa receber o mérito e a bondade das obras de Cristo, creditados em nossa conta, meramente por confiar no Cristo do evangelho. Esta é a notícia mais radical no mundo, e ela mudará sua vida.
Entender isto também nos ajuda a preservar a clareza do evangelho. No cerne das boas novas está a anúncio inesperado e gracioso de que Deus salva pecadores: Ele declara o ímpio justo por causa de Cristo. Este anúncio exalta a graça de Deus e humilha o pecador-crente redimido, pois nenhum crente pode apontar para as suas próprias ações como tendo lhes salvado. E ela assegura o cristão, pois enquanto a nossa certeza de aceitação e perdão com Deus depender de algo em nós, nós nunca, jamais, estaremos certos com segurança. Nossa certeza de salvação descansa, no final das contas, em Cristo. E se ela não descansar ali, não há lugar para descansar de forma alguma, pois nossa vida instável não pode sustentar uma segurança eterna. Por esta razão, e mais, a justificação pela fé é uma verdade que necessidade ser redescoberta pela igreja hoje.
Ligon Duncan é ministro sênior da Primeira Igreja Presbiteriana, em Jackson, Mississippi, e professor adjunto de teologia no Seminário Teológico Reformado. Ele é atualmente o moderador da Assembléia Geral da Igreja Presbiteriana na América, e Ph.D. pela Universidade de Edimburgo, New College, Scotland.
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Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto
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