Jó e a Despadronização do Juízo

Autor: Caio Fábio
Para que foi escrito o livro de Jó?

É uma questão. As respostas são muitas, e várias delas estão no meu livro O Enigma da Graça.

Há uma, no entanto, que eu desejo deixar com você aqui no site.

O livro de Jó foi escrito para relativizar o juízo de um homem contra outro!

Sim, o que nos custa a crer é que todo o esforço de Jó foi para “despadronizar” o juízo!

Ele cria na inescrutabilidade da relação de Deus com cada indivíduo.

E, justamente por isso, ele também afirma que se de um lado o homem pode alterar as leis universais; o que ele, de fato, sozinho, não consegue, é entender, e, muito menos ainda, alterar o seu próprio coração.

Jó, portanto, crê que cada indivíduo é julgado sozinho e de acordo “com suas próprias obras”.

E mais: ele crê que esse julgamento apenas compete a Deus, pois, de fato, a complexidade humana não admite padronizações exteriores ou morais para o julgamento.

E a razão é simples: a moral é a norma da maioria!

Mas e como seres únicos podem ser julgados pela maioria?

Maioria não é norma nem para animais, quanto mais para humanos.

Entre os humanos não é cada um segundo a sua espécie, mas cada um segundo as suas obras pessoais.

O que torna a compreensão de cada situação uma prerrogativa exclusivamente de Deus!

Então, depois disto, você pergunta: para o quê, então, serve a moral como o pensar da maioria?

Ora, serve para dar limites aos tímidos!

Todavia, em relação a Deus, ela não serve para nada— digo eu!—, exceto para dar aos humanos uma sensação de segurança e auto-justificação, além de oferecer um instrumento obtuso e injusto de juízo do próximo!

Já a verdade, a justiça e a equidade –que nem sempre têm qualquer coisa a ver com leis morais— nos são indispensáveis a fim de que haja igualdade de oportunidades mínimas entre os humanos, como sociedade e como indivíduos.

Além disso, Deus ama a verdade, a justiça, a equidade e, sobretudo, a misericórdia!

E, neste caso, a Lei tem utilidade muito maior que a Moral.

A Lei pode impedir o crime ou o punir uma vez realizado.

A Moral, contudo, não serve objetivamente para nada além de provocar a presunção do juízo de um homem contra o outro, ou, de toda uma maioria contra uma minoria!

Assim, a Moral, como o termo já diz, é a norma da maioria!

Já a Lei funciona para determinar as liberdades de um contra o outro e os limites das mesmas.

A Lei pode impedir a tirania!

A Moral a cria!

Ou seja: a Lei me proíbe de oprimir meu próximo!

Já a Moral, tentar clonar todos o que queiram ser reputados alguma coisa numa dita sociedade moral e de aparências padronizadas.

A Lei nos proíbe de não permitir o outro ser, mas nos garante que essa liberdade vai apenas até ao limite em que sua expressão de ser não violente um outro ser humano!

A Moral, todavia, nos impede de ser diferentes da maioria, portanto, mata a expressão do ser!

A Lei defende o meu próximo da tirania!

A Moral, todavia, dá ao meu próximo o poder de me julgar pela mediocridade—moral é a “lei da média”, portanto, é a lei da maioria e da imagem, criada pela maioria para regulamentar a “normalidade” humana—, fazendo de mim, na melhor das hipóteses, um sobrevivente da mediocridade.

Portanto, quanto mais submissão à lei moral, mais a mediocridade reina soberana, e mais a individualidade humana é desconhecida.
E quando isto acontece a generalidade dos códigos da maioria é transformada em norma para uma espécie que não pode ser normatizada; e, por uma única razão: ela foi feita à imagem e semelhança de Deus, e, por isto, é uma espécie de seres singulares.

A espécie humana é a única espécie onde cada indivíduo é um mundo à parte!

Ora, saber disso, faz cessar toda presunção de julgamento. Afinal, quem já foi o outro para entendê-lo e, presunçosamente, poder julgá-lo?

Toda padronização de julgamento implica na redução do outro a uma fabricação em série, o que, em si mesmo, nega a singularidade do indivíduo humano e, muito mais ainda, a “complexidade da imagem de Deus no próximo”.

Quem entende isto, no máximo, ora e ajuda ao próximo-irmão, mas jamais o julga, pois, nesse caso, julga a si mesmo e não ao suposto objeto de seu juízo!

A singularidade humana elimina a possibilidade de que qualquer juiz humano se apresente para julgá-lo diante de Deus!

Pode-se julgá-lo pela quebra da Lei que regula as relações entre homem e homem. Mas pára aí! Não se chama a Deus para o Tribunal!

O que disto passar é pecado e blasfêmia. Pois é mais fácil encontrar jazidas de pedras preciosas no coração da Terra que entender uma única fagulha do ser-sentir humano!

É só até aí que um homem pode andar na direção de um outro. Deve, todavia, saber que assim como é capaz de alterar a natureza para seus fins pessoais, pode, ainda com mais facilidade, alterar a existência do próximo com seus juízos e com suas presunçosas razões, destruindo-lhe, assim, a existência na Terra.

O Evangelho de Jesus dá testemunho de que falo a verdade!
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