Autor: Luiz Augusto C. Bueno
A Reforma Protestante teve um profundo e importante papel na restauração da Doutrina do Sacerdócio Universal de Todos os Santos. Não somente os crentes tem o pleno e irrestrito acesso a Deus por meio de Jesus, e assim a sua redenção e perdão de pecados, mas esta condição dá aos discípulos de Jesus a oportunidade de exercerem uma função sacerdotal do ponto de missionário.
A figura de Israel como povo eleito no Antigo Testamento era também o de reino de sacerdotes para que os povos da terra conhecessem a Elohim como o Deus Criador de toda a terra e de todos os povos (Ex 19.4-6). Por outro lado, a Igreja do Novo Testamento é chamada com o mesmo papel, não somente substituindo Israel, mas em sua plenitude exercendo também uma função sacerdotal, a fim proclamar as virtudes daquele que a chamou das trevas para a sua maravilhosa luz (I Pe 2.9).
Mas nesta condição de servos que ministram, a Igreja também exerce a missão como Corpo de Cristo. Esta visão de Corpo se dá por meio da unidade, diversidade e da mutualidade, características do batismo e da habitação do Espírito Santo. Esta unidade do Corpo de Cristo como um povo de ministra para si e para o mundo, deve ser recheada com o amor ágape. A koinonia é a base desta visão ministerial.
Ao mesmo tempo que a comunidade dos discípulos de Cristo nutre o amor fraternal, estes vivenciam o novo mandamento. A declaração de Cristo é a chave para a formação do caráter ministerial da Igreja: “Novo mandamento vos dou: que vos amei uns aos outros, assim como eu vos amei, que também vos ameis uns aos outros. Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros” (João 13.34,35).
Mas é interessante notar que Jesus relaciona o amor promovido pela comunhão como fator preponderante para que a Igreja cumpra sua finalidade missionária. “Nisto conhecerão todos”, expressa a funcionalidade e a finalidade pelo qual se ama e se relaciona: a missão a todos. É interessante ainda ressaltar que o fato da Igreja expressar a sua comunhão, ao mesmo tempo, reflete o amor relacional da própria Trindade. Charles Barrett afirma com muita propriedade que o verdadeiro amor “corresponde ao mandamento que regula a relação entre Jesus e o Pai”.
Johannes Bavinck comenta assertivamente: “A igreja quando vive uma comunhão espiritual, em organismo pleno, tem poder para fazer crescer o corpo”.
Quando o Corpo de Cristo vive a comunhão verdadeira há manifestação dos dons espirituais, e o crescimento e expansão do Reino no mundo.
O caráter ministerial envolve a natureza missionária da Igreja, pois a manifestação de ministérios no Corpo é condição para sua existência. Não pode haver um membro sequer desta Igreja sem viver o processo do descobrimento, exercício e desenvolvimento de seus dons para o ministério. Portanto, é imprescindível que uma filosofia de ministério exista dinamicamente na vida da Igreja.
Assim, a Igreja é a fonte incrementadora de ministérios. Uma Igreja missionária é aquela que gera e desenvolve ministérios de maneira que todos os “chamados”, são considerados e valorizados igualmente. A Igreja que vive sua missão ao mundo consagra os seus missionários, profetas, evangelistas, mestres, tanto quanto ordena seus pastores.
Há um déficit ministerial na Igreja. Os missionários e pastores tem perdido a motivação para perseverar no campo. Muitos tem fracassado ministerialmente porque não têm aprendido a prevalecer. Isso porque tanto organicamente como estruturalmente a Igreja não trata seus missionários e pastores no mesmo nível.
O crescente profissionalismo do púlpito atinge a liderança e a visão ministerial deixa de ser o meio para expansão do Reino Deus, para se tornar um fim em si mesmo, expandindo ministérios personificados e narcisistas. Esta condição que vive a Igreja contemporânea é resultado da diluição de sua natureza missionária deixando-se ser seduzida pelo estilo de vida do mundo.
Há uma concorrência denominacional e ministerial não somente entre igrejas, mas também entre pastores. O estilo de marketing tem sido absorvido, mesmo que inconscientemente pelos ministros, levando a uma superficialidade do que seja vida de discipulado em Cristo e cooperação na obra de Deus. Frank Dietz fala corretamente sobre o assunto: “Os missiólogos nos ensinam que a primeira onda missionária foi iniciada com Guilherme Carey e liderada principalmente pelos europeus. A segunda onda surgiu com Hudson Taylor e foi liderada principalmente pelos norte-americanos. Uma das coisas que foi definitivamente exportada pelo ocidente para o terceiro mundo foi o espírito de competição. Se é verdade que esta terceira onda de missões será liderada pelos dois terços do mundo, então é muito importante que exorcizemos esse demônio de competição”.
Outra questão que deve ser avaliada dentro do caráter ministerial que forma a natureza missionária da Igreja é a motivação e a filosofia da formação ministerial e missionária. Há um dado extremamente sério a esse respeito. Nos últimos anos, 71% dos missionários enviados para campos transculturais tem abandonado o campo por razões que poderiam ser evitáveis. No caso do Brasil o índice é de quase 25%. Em conseqüência disso, não somente a tarefa missionária fica prejudicada, mas os missionários envolvidos que não perseveram e abandonam seus campos, caem em crises profundas, desde a frustração pessoal como o abandono da Igreja.
Mas a Igreja deve ter um papel importante aqui. Tudo se baseia na filosofia de vida para a formação dos seus pastores e missionários. Assim explica a missionária Margaretha Adiwardana:
“Tendências culturais modernas que podem ter influência negativa na capacidade de missionários perseverarem no campo de missão incluem o espírito de independência e auto-suficiência, a expectativa de resultados instantâneos, a obsessão de eficácia no uso do tempo, o desejo de realização pessoal e a orientação para o sucesso. Isso é verdadeiro para muitas culturas, tanto para a ocidental quanto para a asiática e a latino-americana. Se missionários emergem desse contexto e cresceram com essas atitudes, para eles é difícil enfrentra uma situação em que a sua liberdade pessoal é restrita, em que precisam fazer sacrifícios e estar mais preocupados com outros que consigo mesmos, e que têm de continuar atuando mesmo quando parece haver poucos resultados.”
Cabe à nós como Igreja, restaurarmos o seu caráter ministerial, reavaliando os enfoques de sua formação tanto pastoral como missionária. Tanto pastores como missionários em campos nacionais ou transculturais devem ser não apenas bem preparados teológicamente, mas sobretudo, devem receber formação baseada em uma teologia prática de contextualização, para que seus ministérios não sejam trocados pela vida fácil, tendo ministérios de curto prazo e tornem-se envolvidos pelo consumismo e mercantilismo da fé que paira sobre as igrejas de hoje. Que nestas conferências misssionárias cada um de nós, fiquemos abertos para o Espírito Santo a fim de respondermos pessoalmente o chamado para servir na pluralidade de ministérios. Uma igreja missionária é conhecida quando seus membros reconhecem os seus ministérios nas mais variadas formas. Busquemos ser uma igreja saudável espiritualmente e veremos os resultados da colheita de Cristo.
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