Autor: Daniel Rocha
“Então, Paulo, já indignado, voltando-se, disse ao espírito:
Em nome de Jesus Cristo, eu te mando: retira-te dela.
E ele, na mesma hora, saiu” (Atos 16.18)
Não são poucas as pessoas do meio evangélico que têm buscado em cultos, encontros e reuniões uma revelação especial vinda de Deus para as suas vidas. Alguns, talvez, enfrentando problemas de saúde, outros dificuldades familiares, outros precisando tomar uma decisão… enfim, tudo ficaria mais fácil se Deus usasse alguém para dizer o que fazer, que decisão tomar, e se vai dar tudo certo, lá na frente. No fundo, é um desejo (não admitido) de ter um conhecimento prévio do futuro, tal qual ocorre fora de nossos arraiais.
Isso nos leva a perguntar acerca desse comportamento. Em primeiro lugar, tal interesse é característica de uma fé fragilizada que não encontrou nas Escrituras a suficiente orientação divina. Mostra também alguém incapaz de buscar na oração o conforto que acalma a ansiedade do coração, incapaz de encontrar na igreja e nos irmãos o apoio necessário para o momento difícil, incapaz de ouvir na pregação pastoral a voz de Deus dizendo que Ele é Soberano e poderoso suficiente para descansarmos Nele.
Aproveitando-se dessa brecha, o inimigo tem se utilizado de homens e mulheres possuídos por um espírito adivinhador. Normalmente trata-se de uma palavra “adivinhatória” sobre um acontecimento passado, ou é a menção de uma doença que alguém da platéia possui, ou é uma promessa de cura (se o doente for curado todos se lembrarão, mas se não for, aquela palavra cairá no esquecimento), ou o adivinhador fala algo mais ou menos genérico que servirá para muitos, ou ainda vê uma cena enigmática, tipo da pitonisa de En-dor, onde ninguém sabe muito bem o significado. Jamais é uma palavra profética, com o poder e autoridade de um Isaías ou Jeremias, que começavam suas exortações dizendo: “assim diz o Senhor”. Também não é uma palavra profética nos moldes neotestamentários que tinha o propósito de “edificar, exortar e consolar” (1Co 14.3).
Numa recente entrevista um cantor evangélico diz textualmente que casou-se após ouvir uma palavra “profética” que “aquela” era a moça de sua vida. Agora, após a separação do casal depois de anos de angústia, ele reconhece que foi enganado por essas pessoas e por Satanás. Lembro-me de uma noite após o culto em minha igreja, um visitante possuído de um espírito adivinhador, colocou sua mão em meus ombros e disse-me que Deus havia lhe mostrado um grande ministério que eu desenvolveria em terras estrangeiras. Pensei comigo: “Puxa, Senhor, pensei que meu chamado e vocação fosse para essa terra tupiniquim, e agora terei de aprender uma nova língua?”. Duas décadas se passaram e a palavra adivinhatória não se cumpriu.
Em Atos 16 havia uma jovem “possessa de espírito adivinhador”, a qual, adivinhando, dava grande lucro aos seus senhores. A palavra “adivinho” vem do latim “divinu”, isto é, “aquele a quem se atribuem faculdades divinatórias”. Talvez seja por isso que tais faculdades sempre exerceram um grande fascínio no seio da Igreja, pois de alguma forma, saber coisas que estão ocultas são atributos divinos. Mas o texto a que nos referimos acima nos mostra que nem sempre é assim.
Aquela jovem passou a seguir os apóstolos por vários dias e dizia: “Estes homens são servos do Deus altíssimo e vos anunciam o caminho da salvação” (At 16.17). Batata! Acertou! Era isso mesmo o que eles eram e faziam! Fico até imaginando se essa moça vivesse em nossos dias, o quanto ela seria procurada por pessoas com os mais variados tipos de problemas. Mas não foi assim com Paulo. Embora ele soubesse que ela estava falando uma verdade, ele não se deixou impressionar. Ele percebeu “quem” estava por trás daquilo. E como servo do Deus Altíssimo não podia deixar de desmascarar o espírito adivinhador. Então Paulo, indignado, voltando-se, disse ao espírito (e não à moça): “Em nome de Jesus Cristo, eu te mando: retira-te dela” (At 16.18).
Deus não compactua com outros espíritos. O apóstolo João nos ensina: “Amados, não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai os espíritos se procedem de Deus” (1Jo 4.1). Haveria muito menos confusão nas igrejas se os espíritos fossem provados e desmascarados. Na Igreja de Cristo o único espírito que pode atuar é o Espírito Santo. Cristo elogia a igreja de Éfeso quando diz que ela pôs à prova “os que a si mesmos se declaram apóstolos e não são, e os achaste mentirosos” (Ap 2.2).
No AT há a história da mulher sunamita que perdeu o seu filhinho. Ela correu ao monte Carmelo para avistar-se com o profeta Eliseu. Ele, ao avistá-la ao longe, enviou a Geazi para encontrá-la no caminho e perguntar-lhe: “vai tudo bem contigo, com teu marido, com o menino?” E a sunamita respondeu a Geazi: “tudo bem”. Ele, o profeta de Deus, Eliseu, não sabia o que havia acontecido. Chegando ela, porém ao monte, abraçou-lhe os pés e chorou. Geazi tentou tirá-la, mas o homem de Deus lhe disse: “Deixa-a porque a sua alma está em amargura, e o Senhor mo encobriu e não mo manifestou” (2Rs4.27).
Os verdadeiros profetas de Deus não trazem palavras adivinhatórias. Profetas de Deus falam o que o Senhor lhes disse. Por isso começam suas falas com “Assim diz o Senhor”. E quase sempre são palavras exortativas, de repreensão, de pedido de mudança, de arrependimento, do rei, do povo, da nação.
Que a Igreja de Cristo ouça mais a pregação profética proferida pelo pastor da congregação. Que a Igreja de Cristo seja mais bereana e confirme nas Escrituras se é de fato assim aquilo que foi pregado. Que a Igreja de Cristo não se deixe impressionar por falsos “profetas”, pois Jesus já nos advertiu que eles viriam mesmo.
Daniel Rocha
Pastor da Igreja Metodista em Itaberaba, e psicólogo
dadaro@uol.com.br
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