Autor: Caio Fabio
15/09/03
Para meditação: Romanos 5: 1-6
Um dos conflitos humanos mais doloridos é aquele no qual a bondade do coração tem que lidar com a possibilidade de causar dor em quem se ama.
Ouço isso toda hora.
Já experimentei diversas vezes o sentimento nas duas pontas do processo.
Gente ruim de entendimento e com disposição mental reprovável, não sofre nunca essa dor.
Aliás, tais pessoas não conhecem a dor; conhecem apenas contrariedade.
Mas o cara gente boa de Deus sofre mesmo quando tem razão.
Ele não quer ter razão.
Ele não quer que haja razão nenhuma a se ter.
Quem é da paz, é assim…
Então, mesmo quando busca o bem, muitas vezes, por mais que não deseje machucar ninguém, acaba machucando; e mesmo que não querendo mexer com a alma de ninguém, acaba mexendo.
A gente olha para o Evangelho, e isto está lá.
Veja Maria. Ela é avisada de tudo. Ela junta os pedacinhos. Ela dispõe de muito mais informação que qualquer um; à menos que tivesse dúvida acerca de sua própria história. Mas não era o caso.
Entretanto, mesmo sabendo que uma espada lhe transpassaria o coração, e que aquele menino era objeto de contradição—a fim de que se manifestassem os pensamentos de muitos corações—; ainda assim, quando o filho vira o Filho, ela perde a cabeça.
Marcos 3 e 6 nos conta a história na seqüência.
A família ouvira falar que Jesus curava a todos; que não se alimentava direito; que dormia pouco; e que as multidões o sugavam.
Eles também ouvem falar das ameaças de morte; das imprudências de Jesus; da sua total falta de diplomacia na divulgação de quem era.
E pior: eles ouvem o comentário das vozes de Jerusalém; e eram já os ecos da morte.
E como nem mesmo os Seus irmãos criam Nele, mobilizaram-se em família, capitaneados pela mãe; e, juntos, partiram para prender a Jesus.
É isto que diz o evangelho de Marcos.
Saíram para prendê-lo!
Quando chegaram Jesus estava dentro de uma casa falando com um monte de gente.
Alguém diz: Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e te chamam.
Ele olha em volta, nos rostos de cada um dos presentes; e, então, responde: Eis aqui a minha mãe e meus irmãos!
Todo mundo estava sofrendo de amor naquela família.
Uns com “pena” do mano que surtou.
Outros por “não entenderem” porque de súbito uma pessoa tão equilibrada se lançara naquela aventura.
Outros por genuína “preocupação”.
E, a mãe, por saber sem querer admitir o que sabia; puxando com todas as forças a espada; tentando não deixar que o menino de torna-se objeto de tanta contradição; e, fazendo assim, enganava a si mesma de modo maternal, pensando que vida longa seria vida ainda mais eterna!
Aliás, ela sabia apenas que não podia negar o que lhe acontecera, mas não sabia realmente o que aquilo era.
Maria pode ter falado o seu cântico na hora em que o falou—quando da consciência de sua gravidez divina—, todavia, ela somente o cantou com genuína consciência, quando a tumba se abriu.
Foi então que a Crucificação de seu filho, virou Cruz de Seu Salvador para ela.
Antes disso, havia a poesia da gratidão ante a total impossibilidade de negar para si mesma que Deus a visitara como um veículo de redenção.
Mas a consciência da Redenção não lhe vem ainda em plenitude quando o filho, ao morrer, pede que João, o amigo, a acolha como mãe.
Essa consciência se transforma em adoração de criatura gratamente redimida quando a morte explode em Vida no terceiro dia após a Crucificação.
Então, a cruz de Jesus se tornou a Cruz de Cristo Jesus para Maria!
Mas Jesus não conseguiu não fazê-los sofrer. Eles todos.
Todos que o amavam.
Todos os que Ele amava.
E Jesus não quer que eles sofram.
Mas sabe que é impossível aprender o amor sem que se aprenda a sofrer de amor.
Nesse mundo caído há de tudo em dores. Mas de todas, a maior delas, é a dor do amor.
Ninguém ama sem dor.
Sim, é impossível amar sem dor.
No caso de Maria era o instinto materno brigando contra a consciência do divino.
Assim é que as grandes vitórias nessa vida são conquistadas como dádivas da dor do amor.
Na contradição da dor do amor!
E aqui falo de amor, amor mesmo. Não há alusão especifica a qualquer tipo de amor.
Falo daquela semente de amor que mesmo que pequena, já está plantada em nós; e que tem na Graça o potencial de um dia virar I Coríntios 13.
Nesse mundo caído nem todo amor implica encontro; mas todo genuíno encontro, implica em amor.
Nesse mundo caído, nem todo amor correspondido, é a resposta; e nem toda resposta, é a correspondência.
Nesse mundo caído, a bondade do amor não tem nenhuma garantia de vitória.
O amor concede apenas o privilégio de ser!
Nesse mundo caído, nunca o mesmo som, emitido por bocas diferentes, será na mesma freqüência do outro.
E mais:
Nesse mundo caído, até nos mais verdadeiros encontros há desencontros.
E só-mente os covardes têm medo de sentir tão deliciosa agonia.
A grande covardia na vida é aquela que vem do medo de amar.
O amor, por mais dolorido que seja, é o único caminho pelo qual um espírito humano se matem digno.
Mesmo que isso signifique perda aos olhos de todos.
O verdadeiro amor enxerga sempre a quem ama, apenas com seus próprios olhos; e nunca se deixa impressionar pelo que os outros pensam ou dizem ver.
O verdadeiro amor não é cego!
O verdadeiro amor não se envergonha de ser quem é; e nem de amar a quem ama.
Por isto Deus não se envergonha de ser chamado de “nosso” Pai.
Nós, nesse caminho do amor, muitas vezes, temos que experimentá-lo como contradição, assim como Maria.
Jesus viera para discernir os corações; e, para muitos, Ele seria objeto de contradição.
O amor revela os segredos dos corações.
Por amor o impensável e o impossível acontecem.
Mesmo que seja como contradição.
O fato é que o amor expõe os limites da consciência e da humanidade confiante.
O amor ensina que quem não sofre, não cresce. Mas, sobretudo, ele nos ensina que quem não ama, não vive!
Quem consegue crescer na direção do amor, está crescendo em Deus.
Para o homem, Deus é amor.
Para Deus, o amor é.
Enquanto nenhum de nós chega lá, vamos, pelo menos, tentar não fugir do amor aqui, agora, e já.
E muitas vezes isso implica em dor.
No entanto, nessas tribulações aparecem novas forças; e dessas forças procedem muitas compreensões; e dessas compreensões explodem esperanças; e essas esperanças são manifestações do amor de Deus, derramando-se sobre nós, pela obra do Espírito Santo, que já vive em nós.
Por isto é que amamos.
Bem-aventurados…
Eles são!
Caio
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