Educação Religiosa das Crianças

Autor: Bispo Alexander (Mileant) Igreja Ortodoxa
Traduzido por Olga Dandolo / Natalia Martynenko

Conteúdo: Introdução. Educação e instrução. O objetivo da educação Cristã. Quando iniciar a educação espiritual? A luta com as más tendências. Fundamentos espirituais na educação. Aspectos da educação doméstica. Coação. A significação da Igreja. Escola paroquial. Estrutura familiar. Dificuldades na educação. Conclusão. Oração pelas crianças.

Introdução

Todos aspectos da vida do homem: seu caráter, senso de responsabilidade, bons e maus hábitos, habilidade para enfrentar as dificuldades e o grau de religiosidade — em muito são determinados pela educação na infância. As lembranças claras da infância alimentam e aquecem o indivíduo nos momentos difíceis da vida, e ao contrário, as pessoas que não tiveram uma infância feliz, não podem preenchê-la com nada. Quando nós encontramos pessoas assim — órfãos, que não conheceram o carinho dos pais; enteados e enteadas, com a alma despedaçada em conseqüência de dificuldades domésticas; filhos ilegítimos, abandonados aos cuidados de estranhos — sentimos as almas deles marcadas pela impressão de dolorosas feridas. A ausência da educação religiosa na infância seguramente se faz sentir no caráter do indivíduo: no conjunto espiritual deste indivíduo, percebem-se rupturas notórias. A criança é extraordinariamente susceptível às impressões religiosas: ela se envolve instintivamente a tudo aquilo que divulga a beleza e o sentido do mundo ao redor. Tire isto da criança — e sua alma ficará fosca; ela ficará num mundo vazio com seus pequenos interesses cotidianos. Algo similar acontece também com o corpo: se esta criança vive num ambiente úmido e sombrio, ela cresce pálida e doentia, sem forças e sem alegria em seu corpo mal desenvolvido. Em ambos os casos, a culpa do não desenvolvimento e das doenças (da alma ou corpo), recai sobre os pais.

Por outro lado, vejam as biografias de célebres homens da sociedade contemporânea e descendentes: a maioria deles saiu de famílias grandes e que trabalhavam muito e foram educados dentro das tradições religiosas.

Acontece que uma juventude turbulenta parece que desmorona a fé em Deus adquirida na infância. A pessoa se afasta da religião e da Igreja, pelo visto sem nenhuma esperança de retornar. Porém Deus não abandona a pessoa que carrega dentro de sí a semente do amor e às vezes o Senhor toca seu coração. E quando ocorre algum abalo em sua vida, a pessoa começa a reconhecer suas limitações, seu desamparo e começa a refletir sobre sua vida. Aí então as impressões e instruções de sua infância, esquecidas revivem com nova força e ela volta para Deus. Assim, as lembranças santificadas dos tempos de infância, ajudam a encontrar a sua meta e objetivo na vida. Eis porque é muito importante que os pais freqüentemente se esforcem para alicerçar em seus filhos os fundamentos espirituais. Quando forem adultos, os filhos darão valor ao esforço dos pais e lhes serão gratos pelo resto da vida.

Nesta brochura falaremos sobre o alvo da educação cristã e explicaremos em que ele consiste; explicaremos a importância da família, da Igreja e escola paroquial no desenvolvimento das crianças; falaremos a respeito de algumas dificuldades e erros na educação familiar.

Educação e instrução

Educação: — é o processo do fundamento espiritual e moral da criação e a Instrução: — é o processo do desenvolvimento da capacidade mental da criança. Estas são duas atividades diferentes. Não existe nenhuma razão em pensar que a instrução (desenvolvimento da educação escolar) automaticamente facilita o desenvolvimento moral da criança. É possível encontrar pessoas totalmente mal educadas e sem espiritualidade, e por outro lado, — camponêses com pouca ou nenhuma instrução ou simples operários porém, bem educados na espiritualidade e na moral.

É necessário ainda delimitar o entendimento da educação leiga e a educação religiosa. Qualquer educação separada da religião — seja aquela familiar ou escolar — segue os objetivos habituais temporários, relacionados com as necessidades da família, da sociedade ou estadual. Assim, por exemplo, a escola americana contemporânea, é baseada no princípio da “educação livre,” e o sistema de educação nos países totalitaristas faz de tudo para tornar as pessoas obedientes ao manejo governamental. E em ambos os casos a verdadeira educação está ausente, pois aqui, como meta de educação aparece não o próprio indivíduo e seu bem maior, mas sim os interesses estaduais ou sociais. A situação política altera-se — mudam os princípios pedagógicos e as crianças tornam-se vítimas das experiências escolares.

Outra tarefa da educação religiosa, a qual precede o desenvolvimento da alma, é fundamentada nos eternos princípios Divinos. Neste caso, a meta da educação cristã não se modifica de acordo com as novas idéias políticas ou filosóficas, e sim, baseia-se na sinceridade Divina. Por este motivo, na educação das crianças é preciso guiar-se na palavra de Deus, e não de acordo com a moda ou exigências políticas. Passam os séculos, mudam as condições sociais, mas a natureza da alma humana continua a mesma.

Objetivo da educação Cristã

A educação cristã almeja dar direção espiritual à criança, para que ela seja capaz de resistir às diversas tentações e seguir o caminho certo na vida. Para isto é preciso que ela desde a tenra infância conheça, não apenas regras de comportamento, mas também deva possuir integridade interior a qual lhe mostraria claramente a diferença entre o bem e o mal.

Esta meta da educação cristã revela-se nas orações do sacramento do Batismo. O sacerdote, entre outras, lê as seguintes palavras: “Oh Mestre, Senhor Deus nosso, chama Teu servo (nome da criança) à Tua Santa Iluminação… afasta dele a antigüidade de sua natureza pecadora e renova-o para a vida eterna… Para que ele no futuro não fique escravo de sua carne, mas se torne filho (ou filha) do Teu Reino.”

No Mistério do Batismo a pessoa se transforma no seu interior: ela morre para a vida pecaminosa e nasce para a vida espiritual. Ao recém batizado abre-se a possibilidade de ser uma nova pessoa, espiritualizada, que ama a Deus e o bem. Estas qualidades o fazem assemelhar-se ao Filho de Deus encarnado conforme se canta quando é dada a volta ao redor da pia batismal: “Aqueles que foram batizados em Cristo, tomaram Sua forma” (epístola do Apóstolo Paulo aos Gálatas). A responsabilidade da implantação e do fortalecimento das virtudes espirituais na criança é incumbida aos pais, parentes e padrinhos.

Pelo fato da natureza do homem ser composta de corpo e alma, a criança tem necessidade, não apenas do alimento físico, mas também do espiritual. Se os pais se limitam apenas à alimentação física da criança e menosprezam a espiritual, essa criança cresce “uma criança da natureza,” escrava dos anseios carnais.

São João Crisóstomo diz o seguinte a respeito da responsabilidade dos pais cristãos: Educar o coração das crianças na bondade e virtuosidade é dever sagrado dos pais. A violação desse dever os torna culpados de infanticídio espiritual. Esta obrigação é tanto do pai como da mãe… Existem pais, os quais não poupam esforços, para proporcionar satisfação aos filhos, como herdeiros ricos: mas para que os filhos deles sejam cristãos — para isto os pais não têm urgência. Cegueira criminosa! Por causa disto acontecem tantas desordens pelas quais geme a sociedade… Se pelo menos os pais se esforçassem em dar aos seus filhos uma boa educação, não haveria necessidade de leis, julgamentos ou castigos. Prisões existem porque não existe moralidade.”

O Evangelho ensina que o principal na vida do homem é a condição correta de seu coração. Entende-se que “coração” é o centro da vida interior do homem, onde se concentram seus desejos e sentimentos e o qual determina sua vida moral. Se o Próprio Salvador disse, que “é do coração que provém os maus pensamentos” (Mat. 15:19), então, está claro que o homem não pode passar sem a educação do coração. Por esta razão dar um bom direcionamento ao coração da criança surge como a principal tarefa da educação.

Pelo fato do homem ser obrigado a viver no meio de diversas tentações, é muito importante para ele saber entender aquilo que é certo e o que não é. Para isto, os pais devem instigar na criança o amor pelo bem e sensibilidade interior, a qual ajudará a distinguir e superar as tentações. É muito importante ainda nutrir na criança o amor a Deus, desde a mais tenra idade, antes que essa criança perca sua receptividade espiritual.

Quando iniciar a educação espiritual?

As opiniões freqüentemente discordam na questão da idade em que se deva iniciar a educação espiritual das crianças. Alguns pais pensam que, nos primeiros anos de vida, a criança necessita apenas de cuidados externos; eles olham para ela como se fosse um gatinho engraçado, não receptível à influências espirituais, supondo que até os 2-3 anos o raciocínio da criança ainda não se desenvolveu para assimilar ensinamentos espirituais.

Tal ponto de vista é incorreto e contradiz tanto a ciência como o ensino cristão. A psicologia estabeleceu que a criança é receptiva para muitas coisas desde seu nascimento, Pela comparação de um estudioso, a alma da criança é semelhante a uma lente cinematográfica sensível, a qual fixa ininterruptamente todas sensações. A alma do nenezinho no berço já acumula impressões, capta sons, olhares, entonações das vozes e até o estado de espírito (humor) dos pais. De todas estas impressões, além da inteligência, continuamente é formado o subconsciente da criança. E tudo aquilo que ela absorve dia após dia, torna-se parte de sua personalidade e aí então, não é possível por nenhum meio fazê-la esquecer essas impressões.

Além disso, a psicologia contemporânea chegou a conclusão de que esta impressão do subconsciente na tenra idade, tem grande importância no desenvolvimento do homem. Por exemplo, algumas doenças da alma dos adultos explicam-se com as impressões doentias da tenra idade. Eis porque os pais devem se lembrar de que é preciso se aproximar das primeiras impressões do bebê com extrema cautela, pois desde o momento do seu nascimento, começa a se formar nele não apenas o corpo, mas também a alma.

É precisamente isto que nos ensina nossa fé. No Evangelho nós lemos: “Apresentaram-Lhe então crianças para que as tocasse; mas os discípulos repreendiam os que as apresentavam. Vendo-o, Jesus indignou-Se e disse-lhes: “Deixai vir a Mim os pequeninos e não os impeçais; porque o Reino de Deus é daqueles que se lhes assemelham. Em verdade vos digo, todo o que não receber o Reino de Deus com a mentalidade de uma criança, Nele não entrará.” Em seguida, Ele as abraçou e as abençoou, impondo-lhes as Mãos” (Mar. 10:13-16). Vamos prestar atenção no fato de que estas crianças não foram trazidas até Cristo e sim foram carregadas no colo, o que significa que elas eram muito pequenas ainda para caminharem sozinhas. Os discípulos não permitiriam a apresentação de criancinhas tão pequenas, evidentemente, pensando, igual aos muitos pais daquela época, que criancinhas pequeninas eram incapazes de assimilar qualquer coisa.

E como foi que o Salvador reagiu a isto? Ele indignou-Se com os Apóstolos. E nós sabemos que o Cristo dócil indignou-Se apenas nos momentos em que a verdade era suprimida por enganos; por exemplo: diante da hipocrisia dos fariseus, diante da profanação do templo pelos comerciantes, etc… E Ele disse aos discípulos: “Deixai vir a Mim os pequeninos e não os impeçais … porque é daqueles o Reino dos Céus.” Em outras palavras, as crianças, muito mais do que os adultos, são receptivas à bondade, ao amor e à graça. Elas instintivamente se direcionam a Deus. Depois Cristo abraçou e abençoou os pequeninos.

Fica claro que Cristo ensinava que a educação religiosa deve ser iniciada desde a mais tenra idade. A experiência espiritual da Igreja se expressa na série dos ritos e costumes conectados com as crianças. Desde o nascimento da criança, a Igreja Ortodoxa a recebe com orações especiais: no primeiro dia (dia do nascimento), no oitavo (escolha do nome) e no quadragésimo (sua introdução na Igreja). Estas orações contém pedidos pela saúde do corpo e alma da criança e sua santificação pela Graça Divina. Após o batismo, a Igreja prescreve para que a criança tome a Comunhão com freqüência, que seja levada à Igreja; fazê-la beijar a Cruz e os Santos ícones. Tudo isto seria em vão, se a criança não fosse receptível a impressões espirituais.

Portanto, a época mais importante para a educação da alma; é a tenra idade. Propriamente, na infância forma-se o mundo moral do homem. A alma da criança na idade de 6-7 anos é como se fosse de barro, com o qual se pode modelar sua futura personalidade. Depois desta idade as principais características já se formaram e modificá-las torna-se quase impossível.

Por esta razão procedem bem aqueles pais que, desde a tenra idade aplicam na criança procedimentos religiosos estabelecidos pela Igreja. Por exemplo: quando a mãe a leva até os “‘ícones,” quando antes de dormir a abençoa com o sinal da Cruz, ou então, quando vencendo o cansaço a segura no colo durante todo o ofício religioso, ou reza sobre seu berço. Com todas estas ações manifesta-se a preocupação cristã da mãe com seu filho, conforme descreveu o poeta “Homiakov” na seguinte poesia:

Sucedia; na profunda meia-noite,

Pequeninos, virei contemplar vocês;

Sucedia; gosto de abençoar vocês com o sinal da Cruz,

Rezar, seja feita a graça em vocês,

O Amor de Deus Todo Poderoso.

A luta com as más tendências

Enganam-se os pais, quando vêem seu filho como um ser inocente, no qual ainda não há nenhum mal. A experiência mostra que a criança vem ao mundo não apenas com boas tendências, mas também com más. A ciência chama estas qualidades como hereditárias, e a Igreja — sementes do pecado original. Todos nascemos parcialmente impuros, com predisposição herdada para o mal. Por esta razão, a educação da criança seguramente deve incluir a luta com suas tendências más. Não a ensinando a lutar com elas, nós a deixaremos desarmada na batalha com as tentações. Quando a criança é abandonada aos seus próprios anseios, então não importa o quanto ela seja talentosa, todas suas boas qualidades podem ser abafadas por inclinações inferiores.

Sabe-se que cada criança possui semelhança na aparência com seus pais e antepassados: um se parece com o pai, o outro com a mãe, o terceiro — com a avó ou bisavó. Mas, igualmente com a hereditariedade física, a criança recebe os traços morais dos antepassados, tanto bons como ruins. As más qualidades se desenvolvem e reforçam rapidamente e podem sufocar as sementes do bem. No mundo vegetal, por exemplo, as ervas daninhas são muito mais resistentes e agressivas do que as plantas de jardins e as hortas. Para que qualquer planta em nosso jardim possa crescer saudável e útil, é necessário lutar contra as ervas daninhas.

Observando qualquer criança, é possível se convencer de que desde o berço começam a se manifestar nela características negativas: ora ela faz mãnha, ora fica brava, ora insiste em fazer algo proibido. Muito cedo as crianças começam a ter preguiça, usam de astúcias, enganam, manifestam a gula e crueldade com outras crianças. Aos 5 anos já torna-se possível notar as inclinações do futuro caráter da criança. Se os pais não a ensinam a lutar com suas tendências ruins, então, estas tendências se fortalecerão e se transformarão em paixões e vícios com os quais será muito difícil lutar. Às vezes os pais se queixam de seus filhos dizendo: “De onde vieram estas mãnhas, teimosia, atração por tudo o que é proibido? Afinal ela não tem nenhum outro exemplo; então, quem será que a ensina?” Aqui é preciso ressaltar que não há necessidade de ensinar o mal à criança: já está enraizado nela. Uma certa mãe, observando seu filho dizia: “ele manifesta as características negativas do pai.” Infelizmente as boas qualidades são adquiridas com esforço e constância, e as opostas igual às ervas daninhas, se desenvolvem sozinhas.

Pais jovens tendem a olhar para estas “ervas daninhas” com imprudência, considerando-as como imaturidade da criança. “Quando ela crescer um pouco — pensam os pais, — ela por sí mesma entenderá que isto não é bom e saberá melhorar.” Raciocinando assim, eles estão deixando estas outras tendências sem atenção, e não ensinam a criança a lutar com elas. Estes pais preferem satisfazer todos os caprichos do filho, adotando a famosa atitude: “Qualquer coisa para entreter a criança desde que não chore!”

Porém, a psicologia e a religião nos ensinam que qualquer manifestação do mal na alma deve ser vencida logo no início, enquanto ainda não se fortaleceu. Caso deixemos de dar atenção a esta manifestação, ela se tornará um hábito. Depois os pais se arrependem amargamente por terem sido excessivamente dóceis ou por extremo amor pelo filho; tiveram pena de puní-lo. Aí então fica difícil reeducá-lo e o filho cresce relaxado e indisciplinado.

Eis o que escreveu, em seu tempo, São João de Kronstadt: “Pais e educadores, protejam seus filhos contra os caprichos, com todo cuidado. Caso contrário eles contaminarão seus corações com a maldade, perdendo cedo o amor sagrado, e, ao atingirem a idade adulta se lamentarão com amargura de terem tido muita conivência em seus caprichos. Capricho — germe que corrompe o coração.”

Os pais devem educar seus filhos para que sintam desde a tenra idade aquilo que é permissível e o que é proibido. Proibições sensatas e castigos leves são absolutamente indispensáveis. Estejam certos que mesmo a criança bem novinha compreenderá que existem coisas permissíveis e proibidas. Entendendo que as coisas proibidas atrairão conseqüências desagradáveis, a criança irá evitar tudo aquilo que é proibido. Com estas atitudes vocês infiltrarão na criança um forte fundamento para a educação futura. Sua vontade infantil apenas começando a se formar, estará preparada para que possa na vida se submeter a regras estabelecidas.

Fundamentos espirituais na educação

As crianças, por natureza são meigas, misericordiosas, inofensivas e sinceras. Estas boas qualidades ainda são frágeis e são necessárias no desenvolvimento e fortalecimento. Além disso, conforme a criança vai crescendo, os pais devem reforçar nela disposição ou sentimento que possam lutar com as tendências para o mal, e apoiem as boas manifestações. Por sorte, o homem possui uma qualidade maravilhosa conhecida com consciência. A missão dos pais é desenvolver em seus filhos uma mente apurada e ensiná-los a ouvirem a voz da consciência.

Isto é preciso ser feito não teórica e distraidamente, e sim apoiando-se na base religiosa: a fé em Deus e na nossa relação com Ele — no amor, gratidão e responsabilidade por nossos procedimentos. Sem o fundamento religioso a educação se tornará instável e pouco sólida.

Algumas pessoas pensam que o entendimento a respeito de Deus, do bem e do mal, etc, são muito complicados e abstratos para a criança. Entretanto, a experiência mostra que estas noções são completamente acessíveis às crianças de 3-4 anos quando são apresentadas em forma demonstrativa, por exemplo, os ícones pendurados sobre o bercinho, o sinal da Cruz, a mais simples oração, etc. A alma pura da criança associa os primeiros conhecimentos religiosos com a voz de sua consciência, e assim cria-se nela uma religiosidade simples, porém completa.

Para aqueles que duvidam da força religiosa das crianças apenas anotamos o seguinte: a fé em Deus não foi inventada pelas pessoas; ela nasce junto com elas. É por isso que ela é acessível e compreensível por todos, independente de suas idades e desenvolvimento mental. Qualquer ser, desde o mais humilde e ignorante ao maior estudioso e intelectual, pode crer em Deus. Cada fiel compreende e experimenta sua fé à medida de sua capacidade, e à medida que a pessoa se desenvolve — cresce e se aprofunda sua idéia sobre Deus.

O parentesco entre a fé cristã e a alma do homem permite que a fé seja desenvolvida nas crianças ainda pequeninas, construindo a educação delas. É de se admirar como as crianças recebem a fé em Deus com facilidade e profundamente, e de como ela influencia a criança beneficamente. A fé em Deus não apenas ajuda a criança a lutar com suas más tendências, mas também a ajuda a resolver questões de princípios, as quais são inexplicáveis em termos humanos: referentes ao bem e ao mal, ao surgimento do mundo, às metas da vida, etc… O mais importante mesmo é, que a fé em Deus é a chave para o desenvolvimento de todas as qualidades positivas na criança — piedade, amor, compaixão, sensibilidade, pudor, arrependimento e o desejo de se aperfeiçoar.

Cada pai e cada mãe podem se convencer, com sua própria experiência de que o conhecimento a respeito de Deus lhes coloca nas mãos poderosos meios para a educação dos filhos. Quando nós falamos de Deus como origem de todos os bens e Juiz Supremo da humanidade, trazemos para dentro do mundo interior da criança, noções corretas sobre o bem e o mal. E fazemos isto não na forma de regras formais, e sim para ajudá-la a perceber a Personalidade Viva, que permanece sobre o mundo, e da qual nós todos somos responsáveis. Este Ser Supremo nos atrai para o bem e nos afasta de tudo o que é perecível. Assim, a criança assimila o entendimento sobre o pecado, o que é vergonhoso e desnecessário sujeito a castigo. Diante disto, é preciso considerar que, o entendimento sobre o pecado não apresenta-se totalmente estranho à criança, pois, em sua natureza já está alojado o sentimento de culpa, vergonha e sentimento confuso para diferenciar o bem e o mal. A demonstração cristã a respeito de Deus clareia e fortalece estes sentimentos profundos.

A concepção do pecado, abre para a criança o caminho para a escolha moral e o reconhecimento de sua responsabilidade diante de Deus. Agora a criança reconhece que suas más ações não apenas transgridem as exigências dos pais, mas também a ordem estabelecida por Deus. E não apenas o pai ou a mãe podem castigá-la pelos pecados, mas também o Pai Celestial. Do mesmo modo, todo bem espiritual e material, a criança recebe do Próprio Senhor Deus e não das mãos humanas. A Sagrada Escritura intitula tal condição espiritual como “temor de Deus” e ensina que isto é o princípio da sabedoria (Pro. 9:10).

Em nossos tempos a expressão “temor de Deus” para muitos é incompreensível e tentadora. Por esta razão é necessário nos determos neste ponto para uma explicação. O “temor de Deus” cristão — não o medo animal, o qual os selvagens enfrentam diante das forças tempestuosas da natureza. De acordo com o Evangelho, nosso relacionamento com Deus deve ser expressado no amor filial, e o verdadeiro amor não quer magoar a quem amamos. Por exemplo, um bom filho obedece e ouve seu pai não pelo medo de castigo, e sim por amor a ele, não desejando magoá-lo. Da mesma maneira na fé cristã, “o temor a Deus” é ligado à idéia de “Deus Pai,” a Quem nós não queremos ofender violando Seus mandamentos.

E assim, o “temor de Deus” é a disposição de venerar a Deus; é um sentimento saudável o qual todo cristão deve possuir. Esta disposição não tem nada em comum com o sentimento opressor do medo animal das pessoas sem fé, as quais têm medo de sofrer alguma desgraça, doenças ou a morte, das quais ninguém pode salvá-las. Nas pessoas que têm fé, ao contrário, esta disposição é o reconhecimento de sua própria responsabilidade diante de Deus. A educação religiosa correta exige a implantação deste sentimento na criança, na mais tenra idade.

Aspectos da educação doméstica

Conforme já mencionamos acima, enquanto a criança ainda é pequena, ela assimila por excelência através dos seus sentimentos. À medida que ela vai crescendo, é preciso desenvolver sua vontade e seu intelecto. O indivíduo vive e cresce preferencialmente influenciado por seus sentimentos e desejos, quando sua razão ainda não amadureceu, então é necessário não sobrecarregar a criança com admoestações, sermões e provas lógicas.

A educação na família começa ensinando a criança a ser obediente. Quanto antes ela se acostumar a seguir os ensinamentos dos pais, tanto será mais fácil educá-la durante seu crescimento. No início a educação resume-se em proibições: não faça isto, não pode fazer assim, isto não é bom… Mas, a criança cresce e é preciso lhe dar algo positivo, instruindo e ensinando. Aqui já começam a ocorrer dificuldades, pois somente palavras nem sempre são suficientes para incutir na criança as regras de conduta. Habitualmente podemos encontrar resistência com evidente teimosia da criança em submeter-se. Para superar isto, às vezes os pais devem recorrer a meios mais vigorosos.

Existem dois métodos de influência: alguns pais aplicam o método da punição; outros seguem o caminho da influência religiosa. O castigo físico, sem dúvida, às vezes é indispensável; porém, se for aplicado com muita freqüência, poderá trazer resultados negativos. Primeiramente, a criança se habitua a cumprir as obrigações “sob a vara,” e não irá aprender a seguir seus próprios impulsos interiores. Em segundo lugar, se os castigos tornam-se freqüentes demais, farão a criança ficar irada, fechada, pouco comunicativa, desconfiada e esses castigos deixarão marcas doentias em seu caráter.

O método religioso na educação funciona com mais êxito. Os pais quase não necessitam recorrer a punições físicas quando infiltram nos filhos aquilo que exige o Senhor Deus e não suas próprias regras. A mãe cristã ensina seu filho dizendo: “Não faça isto — Deus não gosta disto… Isto não pode, Deus não permite isto.” Ou então: “Se você fizer assim, Deus vai castigá-lo!” Se por um acaso a criança se ferir ou se queimar por sua desobediência, a mãe diz: “Viu? Deus te castigou porque você O desobedeceu.”

Gradualmente, passo a passo, os pais podem habituar a criança ao sentimento da dependência de Deus. Se a criança faz algo que é proibido, escondido, então é dito a ela: “Não pense que Deus não está vendo o que você está fazendo aqui escondido de mim! Deus vê tudo,” — e diante disto apontam para o Ícone no canto da sala. Quando um pequenino, querendo roubar balas da cômoda, virou o Ícone de costas, “para Deus não ver,” a mãe lhe explicou que Deus está em todas as partes, vê tudo e é impossível se esconder Dele.

Mas não são apenas as proibições que devem ser sugeridas com o nome de Deus. Muito mais importante é quando exigências positivas à criança devem ser fundamentadas na autoridade Divina. É preciso explicar-lhe que Deus o ajuda em todo o bem, e o caminho principal para receber a ajuda de Deus — é a oração. A criança deve entender que, sem a ajuda de Deus, ela não conseguirá nada. Além disso, é indispensável também ensinar a criança a agradecer a Deus por tudo: aquilo que ela possui, pela saúde, pelo alimento, pelas alegrias, pelos objetos que ela usa. Igualmente deve-se acostumar a criança a rezar pelos seus pais.

A idéia sobre Deus é de suma importância para o reconhecimento da criança, como sendo o Pai Celestial que nos ama e Se preocupa conosco. Quando, por exemplo, a criança fica sozinha em casa, ou entre pessoas estranhas, a mãe a consola dizendo: “Você não está sozinha, pois Deus está com você e sempre vai te proteger.” É preciso contar para a criança a respeito do Anjo da guarda, o Qual está sempre ao lado dela, a acompanha e protege. Com isto, os pais a desacostumarão de ter medo do escuro ou de ficar sozinha. Amar a Deus de todo coração deve ser um dos ensinamentos mais importantes.

Para que estes ensinamentos não se tornem abstratos, é preciso reforçá-los com objetos demonstrativos sagrados e ações determinadas: com o sinal da Cruz, assistindo à Missa na Igreja, beijando os Ícones, acendendo velas diante dos Santos, vendo as ilustrações Bíblicas, rezando em casa com a família, tomando água benta em jejum, comungando com freqüência, reverenciando, etc… Com isto a criança fica disciplinada, aprende e se habitua a seguir regras religiosas e sua vontade acostuma-se a obedecer à vontade de Deus.

Compreende-se por sí mesmo que à medida que a criança se desenvolve, os pais devem dirigir suas ações para reforçar nela a obediência a Deus. Isto caracteriza-se na sinceridade, modéstia, docilidade, assiduidade, perseverança, no saber perdoar as mágoas, etc… Se acrescentarmos a isto os hábitos da família cristã em observar dias importantes de jejum e de festas — para a criança será criada uma condição favorável a qual poderá tornar desnecessária qualquer punição física.

Se compararmos este método de educação com outros que excluem a fé cristã, poderemos observar com que freqüência são utilizados gritos, pancadas, sermões longos e enfadonhos os quais não tocam os sentimentos da criança; um outro extremo é a indisciplina e relaxamento desenfreados. Tudo isto apenas mutila a criança. Não seria esta educação tão diferente, o motivo de crianças de várias famílias se diferenciarem umas das outras: umas — são carinhosas, confiantes, sensíveis a tudo que o é bom e também, piedosas para com os outros. Outras crianças, ao contrário, são sombrias, desconfiadas, insensíveis com os outros e impetuosas em seus anseios. Uma educação apenas na aparência exterior, priva a criança das mais valiosas qualidades.

Certamente em qualquer tipo de educação, principalmente a religiosa, a maior influência parte não de palavras soltas ou de punições mas sim dos exemplos pessoais. O comportamento das pessoas mais próximas da criança é o que influencia cada dia e hora em sua alma. As crianças têm contato com dois grupos de pessoas: sua própria família e outros de fora — colegas de escola, vizinhos, amiguinhos e simplesmente com “a rua.” Enquanto a família se esforça para dar bons exemplos às suas crianças, os colegas, amigos, vizinhos e “a rua” freqüentemente as influenciam de forma negativa. Porém isto não significa que seja necessário proibir à criança qualquer contato com o mundo lá fora: tal situação criaria para ela um isolamento artificial do meio ambiente e a privaria da preparação necessária para a vida. Somente é preciso prestar atenção para que a criança tenha amizades, principalmente com amigos positivos e ligados ao cristianismo e para que a influência familiar predomine nas influências alheias.

Para que a família tenha esta influência decisiva na criança, é indispensável uma vigilância constante dos pais, bem como, bons exemplos. Eis aqui qualidades que são exigidas dos pais, para uma educação com êxito:

amor aos filhos, relacionamento justo com eles e a conseqüência das ações deles — “eles ensinam do mesmo modo que agem.” Compreendendo estas obrigações nada fáceis, os pais cada vez mais reconhecem sua responsabilidade para com seus filhos. É agradável observar como jovens casais, procurando dar bons exemplos aos seus filhos, começam a se corrigir prestando atenção em sí mesmos e se autoeducando. Assim acontece que não apenas os pais educam seus filhos como os filhos exercem influência benéfica em seus pais.

É conveniente que o pai e a mãe sejam cristãos e pertençam à mesma Igreja Ortodoxa. No caso de um casamento misto (ortodoxo com não ortodoxo) é muito importante que haja um acordo entre o casal (de preferência antes do casamento), de que os filhos serão batizados e educados na Igreja Ortodoxa. Divergências de opiniões dos pais sobre a fé, e principalmente, discussões a respeito na presença dos filhos, criam uma divisão em suas almas infantis e podem causar um grande mal neles.

Além disso, os pais devem evitar de todas maneiras discutir diante dos filhos — seja sobre questões de princípios ou questões práticas do dia a dia. Quando os filhos percebem a diferença de opiniões dos pais, eles seguramente utilizarão isto em seu proveito e se voltarão aquele (ou pai ou mãe) que seja menos exigente. Diante dos filhos jamais deve-se criticar ou humilhar um ao outro; como resultado final torna-se prejudicial à autoridade de ambos.

Em geral os pais devem ser muito cautelosos em suas conversas diante dos filhos. Alguns pensam: eles são pequenos, não entendem nada. Porém a criança, mesmo não entendendo com o intelecto, com sensibilidade interior capta a essência da conversa, e isto produzirá um choque indesejável em seu subconsciente. Desta forma, isto pode prejudicar a alma da criança, ou levá-la a fazer perguntas as quais serão difíceis de responder. Seria melhor não criticar os outros diante das crianças, evitar zombar dos outros, não demonstrar desrespeito àquilo que é sagrado para a criança; por exemplo: criticar os professores, o clero, etc. “Mas, (disse Jesus) se alguém fizer cair em pecado um destes pequenos que crêem em mim, melhor fôra que lhe atassem ao pescoço a mó de um moinho, e o lançassem no fundo do mar” (Mat. 18:6).

Coação

Em alguns países a teoria da “educação livre” de crianças teve grande divulgação. De acordo com esta teoria, as crianças deveriam ser deixadas agir por sí mesmas para que pudessem manifestar e desenvolver sua individualidade. Esta teoria rejeita qualquer tipo de coação e punições. Recomendam aplicar este método até em crianças pequenas que ainda não têm noção do bem e do mal e nem o costume de observar suas ações. É fácil imaginar quantos erros e perigos surgem daqui, os quais possuem pesadas conseqüências físicas e morais!

Será que um cristão pode concordar com esta educação? Naturalmente que não! Deste modo cresce uma geração de pessoas, as quais guiam-se apenas por interesses egoístas, sem responsabilidade moral. Pensando apenas em sí, estas pessoas não refreiam seus caprichos, suas mentes adormecem aos poucos e elas tornam-se pouco escrupulosas nos meios para conquistar suas metas.

A Igreja ensina que a criança desde a tenra idade deve diferenciar o justo e injusto, o que se deve e o que não se deve fazer. Sobre os pais repousa a obrigação de dirigir suas atitudes, preparando a criança para uma vida independente, e esta preparação deve ser iniciada o mais cedo possível. Aos 10-12 anos já será tarde corrigir as falhas, as quais se desenvolveram em decorrência de uma educação negligente na tenra idade.

Para avaliar a importância da coação na educação, é preciso levar em consideração o seguinte: (1) A mente da criança não é totalmente desenvolvida para poder direcionar suas ações. (2) As crianças acostumam-se à responsabilidade quando é exigido delas o cumprimento de instruções de acordo com suas possibilidades. (3) O emprêgo da coação e punição sensatas e moderadas incutem nas crianças a compreensão moral e bons hábitos.

Diante disto, as punições não devem ser tão diretas, ou seja, físicas (estas só devem ser efetuadas apenas em casos extremos) o quanto mais indiretas porém não menos efetivas, como por exemplo: deixar a criança sem doces, privá-la temporariamente de brincadeiras habituais, recusar receber visitas e ganhar coisas prazerosas, fazê-la cumprir tarefas complementares, etc… Desta maneira ou de outra, quando as palavras não são suficientes, é preciso influenciar a criança através de métodos mais produtivos: “Não desperdice palavras, onde é preciso fazer uso da autoridade!” (da fábula de Krilov) “O Gato e o Cozinheiro”). Nós sabemos que a criança nasce não apenas com boas, mas também com más predisposições, e com estas últimas é preciso lutar desde o início. Qual é a batalha que caminha sem proibições e punições? Lembrem-se de sua própria infância, e então vocês se convencerão facilmente de que qualquer bom costume não lhes vinha automaticamente, e sim com dificuldade, persistência e às vezes com lágrimas. O Apóstolo Paulo diz: “É verdade que toda correção parece de momento, antes motivo de pesar que de alegria. Mais tarde, porém, granjeia aos que por ela se exercitaram o melhor fruto de justiça e de paz” (Heb. 12:11).

Assim sendo, deixemos que os pais sentimentais não temam magoar seus filhos, quando a situação exigir. Em alguns casos isto é indispensável para a educação deles num saudável clima cristão.

A significação da Igreja

Conduzir as pessoas para a fé e justiça — é a principal tarefa da Igreja. No meio daqueles que tem pouca fé e de um ambiente pervertido, a Igreja Ortodoxa é o farol espiritual, uma pequena ilha de santidade para adultos e crianças. Sem ela é impossível educar e influenciar as crianças com benevolência.

O ambiente da Igreja com os ofícios têm influência benéfica sobre a criança. As luzinhas das velas e lamparinas, os ícones, o cheiro do incenso, o canto do côro, o brilho das vestimentas sacerdotais, o badalar dos sinos — tudo isto deixa brilhantes impressões em sua alma. Quando os pais levam seu filho com freqüência à Igreja, ele se acostuma com isto e começa a gostar dos ofícios.

A fé Ortodoxa é rica em dias comemorativos, ofícios magníficos e nobres costumes, que produzem influências positivas nas pessoas. Lembrem-se do Domingo de Ramos, da Semana Santa e a procissão com o Santo Sudário, da Páscoa (que ninguém festeja com tanta alegria e intensidade como os ortodoxos); nossa benção das águas, dia da Santíssima Trindade com flores em abundância e muito verde, a transportação da Santa Cruz, benção das frutas na comemoração da Transfiguração e outros festejos. E quantos costumes dos antigos ortodoxos enfeitam nossa vida doméstica: “o cantinho vermelho” com ícones vermelhos e lamparinas acesas, a primeira refeição após a Quaresma, dia de memória dos finados, benzimento das casas e outros. Que alimento rico para a alma da criança! Os pais devem se preocupar com tudo isto — pelos seus filhos, não tentando se justificar com a falta de tempo, distância da casa à Igreja ou outras circunstâncias.

No início, a educação religiosa é alcançada nem tanto pela razão, como pelo sentido. Por esta razão, crianças que sempre freqüentam a Igreja — este campo arado, susceptível às sementes do bem, o qual em seu devido tempo trará frutos.

A primeira confissão aos 7 anos de idade é um acontecimento importante na vida da criança. Após a confissão, a pessoa torna-se santa e pura como após o Batismo. É de vital importância que os pais ensinem seus filhos nesta idade a anotarem suas falhas, más ações e com sinceridade sentirem o arrependimento. A primeira confissão indica à criança de que está se aproximando o tempo de maturidade e responsabilidade diante de Deus. Até então, o Sacramento da Comunhão nutria a criancinha através da fé dos pais. E agora, ela sozinha aproxima-se do Cálice Sagrado consciente, após arrependimento individual. Por esta razão a preparação do jovem para receber dignamente sua primeira Comunhão consciente é uma etapa muito importante na educação cristã.

Nesta idade, ou um pouco mais tarde, os meninos podem começar a servir no altar, e as meninas, começar a cantar no côro ou auxiliar no recolhimento de tocos de velas durante o ofício. Isto os ensinará a participarem dos ofícios. A participação regular na Liturgia e a proximidade com o sacerdote leva a criança solícita espiritualmente a começar a ser atraída para a Igreja, e até refletir sobre a dedicação de sua vida a Deus. Isto ainda não significa que o jovem escolherá exatamente este caminho, porém o próprio pensamento pessoal diz que a Igreja tocou fundo nele.

Escola Paroquial

A escola paroquial nem sempre é capaz de resistir às influências corruptas. Pelo contrário, desejando estar no “nível do século,” ela muitas vezes elabora formas legais para a relação frívola com questões da vida. Diante de nós estão presentes as estruturas sociais, as quais empurram abertamente a família e a sociedade para a corrupção moral. Como exemplo, prestemos atenção na imprensa e na televisão: enchem as crianças com imagens vulgares, com filmes sem conteúdo, de baixa qualidade com cenas saturadas de violência e sexo.

Para contrabalancear este espírito anticristão — a tarefa da escola da Igreja consiste em dar conhecimentos religiosos às crianças, os quais reforçariam nelas a fé, as ensinariam a viver corretamente resistindo às tentações que rodeiam a sociedade, e a serem honestas e cristãs convictas. A escola paroquial aprofunda e amplia a educação religiosa que foi iniciada pela família. Nas aulas de Catecismo as crianças recebem, de forma sistemática, muitas informações importantes: elas decoram orações, se familiarizam com o Antigo e Novo Testamento, estudam os fundamentos da fé Ortodoxa, os mandamentos de Deus e o teor dos ofícios divinos. As crianças também tomam conhecimento do idioma eslavo-eclesiástico usado na Igreja. Nas classes mais adiantadas, se o tempo permitir, é importante apresentar aos alunos as particularidades de outras religiões cristãs e a maneira correta de se aproximarem dos problemas contemporâneos do sistema espiritual e moral.

A escola paroquial é uma auxiliar necessária à família no que diz respeito à educação religiosa. Entretanto a preocupação dos pais com seus filhos caminha adiante da escola. A escola fornece conhecimentos religiosos teóricos, enquanto que a aplicação desses conhecimentos aprende-se com a família. Sem a atmosfera cristã na família, todas informações e conhecimentos adquiridos na escola permanecem teóricos e os quais as crianças esquecerão com o tempo.

Concluindo, é preciso anotar que, nem a família, nem a escola, nem mesmo a Igreja, não podem, cada uma individualmente, educar a criança. Isto poderá ser alcançado, somente com a união destas três instituições. Eis porque quanto mais estas instituições se unificarem, mais êxito se terá na educação das crianças.

Estrutura familiar

A Igreja Ortodoxa sempre considerou a família como principal fonte de esclarecimento cristão das crianças. Os Apóstolos chamavam a família de “igreja doméstica,” e ensinavam aos espôsos e a todos os membros da família a viverem uma vida conjugada com a vida espiritual.

Para isto é necessário rezar diariamente junto com toda a família, de preferência pela manhã, à noite, antes e depois das refeições. A oração conjunta une espiritualmente a família. Aos domingos todos devem ir à Igreja observando o quarto mandamento da lei de Deus: “Lembra-te de santificar o dia de sábado. Trabalharás durante seis dias, e farás toda a tua obra. Mas no sétimo dia, que é um repouso em honra do Senhor, teu Deus” (Exo. 20:8). Desta forma, Deus nos deu seis dias e deixou um para Sí mesmo. As pessoas que dedicam o sétimo dia a sí e às preocupações cotidianas, “saqueiam” Deus e transgridem sua promessa divina com Ele.

Conversações espirituais juntamente com leitura do Santo Evangelho, mensagens dos Apóstolos, vida dos Santos, compêndio da Lei de Deus, ou outras leituras convenientes, produzem efeito muito benéfico na família e criam uma atmosfera conciliadora no lar.

Não se pode desdenhar o “jejum,” o qual foi designado pela Igreja para o desenvolvimento da auto disciplina e da firmeza no cristianismo. O Senhor Jesus Cristo jejuou dando exemplo a nós, assim como jejuavam Seus discípulos, Apóstolos e os primeiros cristãos. Desde o primeiro centenário do cristianismo entrou em norma jejuar duas vezes por semana: às quartas e sextas-feiras. Na mesma época foi estabelecido o jejum também antes da Páscoa, atualmente denominado “Grande Jejum” (Quaresma).

Na ausência da escola paroquial, a tarefa de catequizar os filhos passa para os pais. É preciso ensiná-los a lerem sozinhos a “Lei de Deus” ou a Bíblia infantil e depois contarem o que leram e aprenderam independentemente. Sem os ensinamentos regulares, sem freqüentes esforços e verdadeiras batalhas pela alma das crianças, é impossível prepará-las para a luta com as muitas tentações que as rodeiam.

Dificuldade na educação

Na ordem do dia está a questão da conservação da família e salvação das crianças. As estatísticas referentes à quantidade de divórcios e a elevação de crimes entre a juventude nos levam a terríveis pensamentos. A família se desmorona diante dos olhos e com ela vacilam as bases da sociedade. Qual a razão da crise familiar? O principal motivo é o enfraquecimento da fé em Deus e o afastamento dos princípios cristãos.

Afim de conservar a família e educar corretamente as crianças, é indispensável que os pais construam sua vida familiar no fundamento cristão. Deus e a salvação da alma estão em primeiro lugar, e os bens materiais em segundo. É claro que isto não é fácil, nas condições do rítmo acelerado da vida e das dificuldades econômicas. Se antes a família conseguia sobreviver com o salário do pai, agora, com muita freqüência é necessário que pai e mãe trabalhem para o sustento da família. A ocupação excessiva dos pais se faz sentir negativamente no ambiente familiar e nas crianças as quais muito cedo são entregues aos cuidados de desconhecidos e nem sempre convenientes.

Com freqüência os pais que chegam cansados e nervosos em casa, começam a discutir por qualquer bobagem, elevam a voz e até se ofendem mutuamente. Isto provoca uma atmosfera doentia no lar e se faz sentir nas crianças.

Para evitar isto, os pais devem se esforçar ao máximo para diminuírem o rítmo de vida. É melhor viver modestamente, porém em paz, do que viver fartamente, mas com amargura e brigas. A empolgação com a carreira e a corrida atrás de bens materiais, conforme dados estatísticos, freqüentemente causam a separação. A oração juntamente com os filhos (de preferência, com regularidade feita pela manhã e à noite) ajuda os pais a encontrarem o balanço de suas preocupações diárias, e atrai a ajuda de Deus.

É claro que falhas e equívocos são inevitáveis, mesmo na família mais religiosa e saudável. O casal deve resolver seus problemas com diálogos tranqüilos e sinceros. É bom ter estes diálogos com regularidade e completá-los com a leitura das Sagradas Escrituras, para que os pensamentos e planos sejam inspirados pela palavra de Deus. Durante as discussões é preciso ouvir pacientemente a opinião um do outros e levá-la em consideração. Jamais deve-se elevar a voz, dizer insultos ou humilhações — principalmente na presença dos filhos. Deve-se pedir perdão, mesmo quando você se considera com razão, e agir assim até que os dois se recolham para dormir, conforme ensina o Apóstolo Paulo (Efe. 4:26). Se não agirem desta forma, as mágoas mútuas permanecerão acumuladas e o casal aos poucos perde o respeito e o amor.

Os pais precisam prestar atenção no que constitui o entretenimento doméstico: televisão e música, que influenciam enormemente na estrutura familiar. A televisão seria uma excelente invenção, caso fosse utilizada com moderação e fossem escolhidos programas úteis.

Na prática, a TV tem um efeito nocivo nas crianças. Ocupando no lar lugar de honra, como se fosse um ídolo em uma família pagã, ela não apenas rouba muito tempo das crianças, como as habitua a uma diversão passiva, que não possui nenhum valor educacional. A maioria dos programas, conforme é de nosso conhecimento, é impregnada de grosseria e vulgaridade, as quais entopem as almas infantis. Sobre este tema foram escritos muitos livros e artigos. Crianças que assistem muito à televisão, como regra estudam mau, tornam-se indisciplinadas, atrevidas e começam a se manifestar cedo nelas qualidades negativas.

É notório que a televisão possui influência hipnótica não apenas nas crianças, mas também nos adultos, os quais aos poucos se viciam tanto em televisão, como ao cigarro ou bebida alcoólica, que sem ela já não conseguem viver. A TV gradualmente tira a vontade de ler, faz desaprender a pensar, rezar ou fazer algo útil. Por esta razão, certíssimos estão aqueles pais que para seu próprio bem e também dos filhos, se recusam a ter um televisor em casa, ou controlam energicamente o tempo em que as crianças passam diante da TV.

A música, como qualquer arte, deve provocar no indivíduo sentimentos nobres e elevados. Existe a bela música clássica e a boa música popular. Infelizmente não se pode dizer isto da música contemporânea, tal como o “rock and roll” ou “heavy metal,” as quais afloram em quem as ouve, sentimentos eróticos e maldosos. Algumas dessas músicas contemporâneas são compostas de sacrilégios, blasfêmias e palavrões. Por isto os pais que desejam o bem de seus filhos, devem protegê-los desta imundice.

Pode ser que para alguns, esta limitação parecerá antiquada e supérflua. Porém, é preciso lembrar as palavras do Evangelho a respeito do perigo do caminho largo, pelo qual segue a maioria, e sobre a salvação do caminho estreito do cristianismo. Agora mais do que no tempo apostólico é necessário constatar que o mundo está deitado no mal, e quem é o príncipe desse mundo — o demônio (1 João 5:19; João 12:31 e 14:30).

Às vezes os pais, com toda sua dedicação à fé, transmitem muito formal e secamente os conhecimentos religiosos aos seus filhos; obtém-se uma mera implantação superficial de alguns fatos, leis e costumes, que não são aquecidos nem pela fé autêntica em Deus, nem pelo amor a Deus e ao próximo. Outras famílias sofrem com as atitudes indiferentes e superficiais à Ortodoxia, como por exemplo, na Rússia antes da revolução muitas pessoas, principalmente os intelectuais, somente se lembravam da Igreja nos dias de grandes celebrações ou datas especiais na família: batizados, casamentos e enterros. Todo o restante de sua vida passava sem o elo com a Igreja e sem atenção para as exigências dela. Naturalmente que tal atitude de menosprezo à fé era repassada pelos pais aos seus filhos. Por isso imagina-se porque a revolução na Rússia tomou tamanha dimensão monstruosa e porque os cristãos ficaram tão passivos diante da destruição de Igrejas, exterminação de relíquias e aniquilação do clero.

É preciso se esforçar para que a fé em Deus penetre em toda nossa vida e não apenas alguns “cantinhos festivos.” Qualquer pequena porção ao contrário do esforço na religião priva a pessoa da integridade, da estabilidade, firmeza e entusiasmo. Ainda na antigüidade, Tertúliano disse que “a alma da pessoa, por sua natureza é cristã e não pode contentar-se com a fé incompleta, pela metade.” Isto é em particular verdadeiro em relação às crianças, as quais procuram a total harmonia entre a fé e a vida.

Diante de todas as dificuldades que os pais encontram na educação dos filhos, existe um lado, certamente positivo: se esforçando para guiar seus filhos na direção certa, os pais juntamente aprendem e crescem espiritualmente. Propriamente é nisto que se concluem os planos do Criador, o verdadeiro objetivo da família — ensinar as pessoas a se preocuparem uns com os outros e crescerem espiritualmente.

Quando os pais, reconhecendo sua incapacidade e fraqueza na educação dos filhos, dirigem-se a Deus pedindo ajuda para serem guiados, Deus então, verdadeiramente os ajuda, e a vida familiar flui suavemente sob o abrigo do Todo Poderoso.

Conclusão

Assim sendo, da família, a pessoa recebe os fundamentos da fé, direcionamento moral e senso de responsabilidade. Desde os primeiros dias de vida consciente, o novo membro da família aprende a valorizar o trabalho cotidiano, do qual depende sua alimentação, sua saúde e comodidades da vida. O esforço, e também uma fração de austeridade são ingredientes do meio ambiente da família: eles reforçam o caráter das crianças, as acostumam a trabalhar e ter olhar sensato para a vida. A família — guardiã das tradições; aqui a criança recebe suas primeiras impressões espirituais. E diante do modo de viver religioso da família é que está depositado o início da fé cristã, das orações e boas ações.

A psicologia pedagógica nos ensina que, nos primeiros anos da vida da criança, ela recebe quase um terço de entendimento sobre a vida de um adulto. Depois disto, a pessoa amplia e se aprofunda naquilo que foi agrupado em sua alma durante os primeiros sete anos de sua vida. Aos três anos surge na criança a consciência de sua personalidade e ela começa a dizer “eu.” Nesta época é preciso começar a ensiná-la a obedecer. Ouçam — este é o início da educação.

Desde a tenra idade, as crianças precisam entender o que é permitido e o que não é. Isto deve ser imposto a ela não na abstração, e sim baseando-se no fundamento religioso: na fé em Deus e em nosso relacionamento com Ele — com amor, gratidão, esperança em Sua ajuda. O conhecimento do pecado abre, diante da criança, um caminho de escolha moral e consciência da responsabilidade diante de Deus. Agora, a criança reconhece que seus atos maldosos transgridem não apenas as exigências do papai e mamãe, mas também, a ordem estabelecida por Deus. E Ele pode castigar o desobediente.

Simultâneamente com os preceitos, os pais devem demonstrar os melhores exemplos, os quais atuam beneficamente tanto na vontade quanto no desenvolvimento da consciência moral. Se formos encher a cabeça da criança apenas com regras, sem reavivá-las com a vida familiar cristã, a criança irá encarar estes preceitos como teorias abstratas. Os bons exemplos dos pais têm um significado decisivo no desenvolvimento dos filhos. Para isto o casal deve se amar mutuamente, rezar junto, dialogar a respeito de Deus, freqüentar a Igreja, comungar com freqüência, observar os jejuns e costumes da Igreja, ajudar os necessitados, com estas palavras — arder com o espírito.

Sem dúvida o insucesso dos pais na educação deve-se à falta de preparo, pouca fé, empolgação pelas coisas materiais da vida. A irritabilidade e a raiva e conseqüentemente o egoísmo, e apego aos bens materiais e ausência de disciplina interior, são obstáculos na educação.

A irritabilidade dos pais atua mal nas crianças e provoca uma réplica por parte delas. Os pais não devem brigar diante dos filhos nem queixar-se um do outro para eles. Os filhos precisam ver seus pais sempre unidos. É preciso proteger os filhos contra a sujeira da rua, a qual se aproxima deles através da televisão e da música turbulenta e voluptuosa. Caso os pais queiram ter um televisor em casa, é preciso, de um lado, limitar rigorosamente o tempo que as crianças ficam assistindo, e por outro lado, verificar o conteúdo da programação e dos filmes.

O principal que cada pai e cada mãe devem entender — é que bons resultados e a verdadeira moralidade são impossíveis de se adquirir sem base religiosa, sem a ajuda da Igreja, orações e Sacramentos. A nomeação do indivíduo não se restringe apenas na vida terrestre, mas se estende pela eternidade. É por isso que a educação da criança deve ajudá-la a ter esta meta principal diante dos olhos.

Oração pelas crianças

Deus, nosso misericordioso Pai celestial! Tenha piedade de nossas crianças (nomes), pelas quais nós humildemente suplicamos a Tí e as quais nós entregamos aos Teus cuidados e proteção. Deposita nelas a verdadeira fé, ensina-as a Te venerarem e as digne de Te amarem com fervor, nosso Criador e Salvador, Dirija-as, Oh Deus, para o caminho da verdade e bondade, para que elas façam tudo pela graça do Teu nome. Ajude-as a viverem virtuosamente e piedosamente, a serem bons cristãos e pessoas dígnas. Dá-lhes saúde física e espiritual e sucesso no labor. Protege-as das artimanhas astuciosas do demônio, das inúmeras tentações, das más paixões e de todas pessoas desonestas e desordenadas. Por Teu Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, pelas orações de Sua Santíssima Mãe e todos os Santos, traga-as para o Teu refúgio tranqüilo e Teu Reino eterno, para que elas junto com todos que foram salvos sempre agradeçam a Tí junto com Teu Filho Unigênito e Teu Espírito vivificante. Amém.

Folheto Missionário número P55
Copyright © 2001Holy Trinity Orthodox Mission
466 Foothill Blvd, Box 397, La Canada, Ca 91011
Editor: Bishop Alexander (Mileant)

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