As influências do culto no Antigo Testamento

Autor: Van Groningen
“Porque grande é o Senhor e digno de louvor, mais tremendo do que todos os deuses.
Porque todos os deuses dos povos são coisas vãs; mas o Senhor fez os céus.
Glória e majestade estão ante a sua face, força e formosura no seu santuário.
Dai ao Senhor, ó famílias dos povos, dai ao Senhor glória e força.
Dai ao Senhor a glória devida ao seu nome: trazei oferendas e entrai nos seus átrios.
Adorai ao Senhor na beleza da santidade: tremei diante dele todos os moradores da terra” (Salmo 96,4-9).

Este Salmo bem poderia estar escrito no Novo Testamento. Embora eu não seja um especialista em liturgia, aquilo que vou dizer é extraído de uma perspectiva teológica, exegética e bíblica do Antigo Testamento. Em qualquer que seja o país, etimologicamente, “liturgia” significa “pessoas trabalhando”, não pessoas se divertindo, se alegrando, fazendo o que bem entendem, mas pessoas trabalhando conforme a vontade de Deus. Estar envolvido liturgicamente é estar trabalhando na adoração, no culto a Deus. Quando cultuamos a Deus, na verdade, expressamos a dignidade de Deus. E se nós, trabalhadores, somos indignos, por natureza, para expressar a dignidade de Deus, como é que nós, indignos, podemos expressar dignidade? Esse tem sido o problema básico da liturgia de culto desde a entrada do pecado na história do homem até os dias atuais.

Algumas vezes temos a impressão de que as pessoas pensam que Deus é honrado porque nós somos dignos: “Vejam como eu posso cantar! vejam como eu posso tocar um instrumento!”. Solenidade e dignidade são fundamentais na liturgia; e devemos comparecer como um todo perante o nosso Redentor, não permitindo que apenas o coro tome o lugar da assembléia para expressar o louvor. Deus espera que todos seus filhos expressem de algum modo o seu louvor e adoração, Ele não quer ser “divertido” pelas partes do culto. Até o modo como nos vestimos expressa a nossa adoração, a nossa apreciação pelo que Deus é.

Ultimamente os teólogos liberais defendem o seguinte princípio: “Nós vivemos em um ambiente em que há uma renovação teológica e litúrgica. Novos pontos de vista, novos entendimentos, novas formas, novos métodos e padrões, todos eles estão lutando para prevalecer”. Até um certo ponto poderíamos dizer que eles estão certos, mas a questão é esta: Quanto disso vem das Escrituras e da Tradição da Igreja? Existe muita divisão quanto ao modo de se cultuar a Deus. O que se ouve com mais frequência é: “deixem as pessoas se expressarem da forma como elas quiserem!”. E constantemente empregam indevidamente o Antigo Testamento ou outras passagens da Sagrada Escritura. Não se pode esquecer que no Antigo Testamento, no Tabernáculo e no Templo, a adoração era prescrita e controlada; não era uma questão de deixar as pessoas se expressarem como quisessem. Assim, apesar de gostarem sempre de citar o Antigo Testamento, só buscam as passagens que pensam favorecer suas idéias. Alguns se referem, por exemplo, ao Salmo 47,1 onde diz: “aplaudi com as mãos, nações”. Mas que nações? Aquelas que foram conquistadas! Não as vitoriosas, mas aquelas que foram trazidas sob a vontade de Deus. Que essas nações aplaudam com as mãos! No Salmo 98,8 lemos: “Os rios batam palmas”. Como é que rios batem palmas? Ainda: “regozijem-se também as montanhas”. Regozijem!? Cantem!? Elas cantam? Porque as pessoas literalizam esse tipo de metáfora? Existe um cântico, cuja letra diz “as árvores batam palmas”, conforme Isaías 55,12. Também vemos pessoas batendo palmas quando um rei era entronizado, coroado. Mas hoje quando as pessoas querem motivos para bater palmas, frequetemente elas usam estas metáforas singulares, exclusivas e específicas. Essas pessoas literalizam idéias, imagens, mas não têm ninhos de passarinho ao redor do local de culto, como diz o Senhor, também não se lavam com hissopo, como diz o Salmo 51; não constroem muros em torno de Jerusalém, como diz o Salmo 51:18. É muito interessante o uso que essas pessoas fazem do Antigo Testamento, pegam passangens bíblicas, mas somente as que lhes interessam, e as torcem segundo as próprias inclinações.

Como posso adorar a Deus segundo os princípios tanto do Antigo quanto do Novo Testamento? Olhando para a sociedade, encontramos três ênfases básicas:

Há uma ênfase na “renovação da liturgia e há também reações contra essa idéia: “Deixem as pessoas fazerem como entenderem”. E infelizmente temos ainda mais divisões do que antes, quanto ao modo de adoração.
Se uma ênfase diz: “Vamos fazer o que a Igreja fez tradicionalmente”; a outra diz: “Liberdade! Vivemos na época do Espírito e não da Lei!; vamos ter o Espírito Santo dirigindo”. Isso nos dá a impressão de uma Igreja somente no campo social, com reuniões mais com propósitos sociais do que de adoração a Deus.
E há ainda uma terceira posição, que é a daqueles que querem conservar a liturgia tradicional.
Quanto a essa idéia de que pessoas devem se reunir da forma como bem entendem, alguns acham que o Novo Testamento é a dispensação da liberdade, mas se esquecem de que esta liberdade é controlada pelos seguintes princípios:

A centralidade de Cristo.
O Deus Trino e Uno.
A necessidade de ordem, por parte dos adoradores.
A administração correta daquele que é ordenado como o líder do culto.
Todos têm que concordar que há uma necessidade de honrar a Deus e adorá-Lo, com um serviço que ao mesmo tempo honre a Deus e edifique o povo de Deus. Mas lembrem-se: edificação, e não divertimento, deve ser o princípio básico. Esta é a ênfase tanto do Antigo quanto do Novo Testamento.

Considerando agora o aspecto real do problema: Será que o Antigo Testamento oferece direções para uma adoração na liturgia contemporânea? Isso nos leva imediatamente a um problema histórico que oferece um estudo muito desafiador: Que parte do Antigo Testamento deve ser estudada? Há pelo menos cinco épocas representadas no culto no Antigo Testamento:

Primeira: De Adão ao Êxodo. Era um culto centralizado na família; pode ser chamado de adoração doméstica. Há alguns que gostariam de estar lá, naquele período de Adão, com um culto familiar. Estes buscam base para isso também no Novo Testamento. Mas o fato é que o culto centralizado na família era anterior ao Êxodo, o altar era central. No altar, Deus e o povo se encontravam e havia sacrifícios. Caim e Abel sacrificaram e, embora não saibamos que tipo de altar eles construíram, sabemos com certeza que o diabo estava ativo lá. Foi no cenáculo da liturgia que o primeiro homicídio aconteceu. Não é uma contradição terrível? Havia os sacrifícios de expiação de pecados, como lemos em Jó 1. Jó sacrificava pelos pecados dos seus filhos. Havia sacrifícios de gratidão. Noé sacrificou depois de ter saído da Arca. Enoque andou com Deus, Abraão andou com Deus, mas não nos é dito como eles cultuavam, não há qualquer prescrição desde Gênesis 1 até Êxodo 19 sobre como deve ser o culto. O que se encontra é descrição, nós sabemos o que eles fizeram, mas não porque fizeram ou se tinham que fazer assim. Mas acreditamos que eles eram conduzidos pelo Espírito.
Segunda: Desde Moisés, em Êxodo 19, até I Samuel. Foi o período do Tabernáculo. O Tabernáculo era a habitação simbólica de Deus, era um palácio portátil, mas era um palácio. Nele estava a Arca, o lugar do trono de Deus. É importante ressaltar que Deus era o Rei, Ele reinava no meio do seu povo, e ai daquele que não O honrasse como tal. No tabernáculo também havia a mesa, falando da provisão maravilhosa de Deus para o Seu povo; havia o candelabro, sete lâmpadas, representando o Espírito de Deus que produz luz; havia o local de incenso, representando as orações do povo que eram levadas a Deus, o Rei; havia o altar, do lado de fora, antes da entrada. Imaginem, então, Deus, o Rei, saindo do Seu trono e postando-Se à entrada do tabernáculo, ali junto ao altar; e o sacerdote, representando o povo que vinha do outro lado, e eles se encontravam no altar de adoração, de consagração, lugar de interação amorosa, o lugar onde o pecado era removido pelo derramamento de sangue, lugar onde o povo recebia a segurança. Mas antes que o sacerdote pudesse chegar ao altar havia a bacia, ali era onde a purificação externa tinha que acontecer. O sacerdote tinha que se lavar, os sacrifícios tinham que ser externamente limpos, nenhuma impureza externa era aceita, Deus exigia pureza, limpeza. No altar, o coração era purificado, mas antes que o coração fosse purificado o povo tinha que se purificar externamente; o sacerdote que representava o povo tinha que comparecer perante Deus totalmente purificado e limpo. A primeira prescrição que temos para adoração, portanto, é que todas as coisas expressavam a Pessoa de Deus, Seus atributos, Sua presença, Seu relacionamento com o povo, e como o povo respondia a Deus. Tanto no Antigo como no Novo Testamento, o sacerdote tem um papel muito importante, é o mediador entre Deus e o homem. Eles tinham e têm que trazer os sacrifícios que o povo lhes ofertam, mas também têm e tinham a grande tarefa de intercessão; eles tinham e têm que trazer perante Deus as preocupações, os cuidados, e as alegrias do povo e são apenas responsáveis pelo trabalho de intercessão, tinham e têm também que trabalhar, receber as apreensões, os cuidados, prestar serviço social, cuidar para que as leis sociais e sanitárias sejam mantidas, etc. E, assim envolvidos socialmente, eles podiam interceder melhor, e os sacrifícios que eles traziam eram mais significativos. Mas além disso, os sacerdotes tinham uma outra tarefa, eram eles que tinham que trazer a Palavra de Deus, inscritas nas duas pedras, perante o povo, para a leitura. Eles tinham apenas que manter a Palavra, tinham a tarefa de fazer com que as Escrituras fossem repetidamente lidas perante o povo. A Palavra que Deus dera, através dos profetas, era ensinada pelos sacerdotes. Foi por esta razão que Paulo, no Novo Testamento (Rm 15,16) disse: “para que eu seja ministro de Jesus Cristo entre os gentios, no sagrado encargo de anunciar o Evangelho de Deus”, a expressão que ele usa enfatiza o aspecto sacerdotal, o ministro de Deus. Paulo está aqui apresentando a figura do padre que coloca-se entre Deus e o povo como um sacerdote, ele tem o trabalho de representar o povo diante de Deus e ao mesmo tempo de servir ao povo, ensiná-lo ministrando o Evangelho e celebrando o Santo Sacrifício. Isso indica novamente que não havia aquela distinção tão nítida entre o trabalho do sacerdote e o do profeta, mas sim uma espécie de interação entre as duas atividades. Tanto o profeta como o sacerdote tinham a responsabilidade de prover as necessidades sociais do povo; mas nenhum profeta, a não ser Moisés e Samuel, podia oferecer sacrifício. Somente os sacerdotes podiam fazer isso. Sabemos que Uzias foi condenado porque ofereceu sacrifício. Então, avançando do tabernáculo para o sacerdócio, encontramos mais de vinte tipos de sacrifício que deviam ser trazidos; se fizermos um estudo desses sacrifícios vamos ver que cada aspecto da nossa vida, cada uma de suas dimensões, de uma maneira ou de outra, está neles representada.
As festas e sábados também foram prescritos. Por que o sábado Deus quer que o povo tenha tempo para Ele, quer que o povo O ame, e amor toma tempo. Deus quer o nosso tempo, e infelizmente a grande tragédia no mundo hoje é que o tempo de Deus é o nosso tempo. Pergunte a você mesmo, como você gasta o seu domingo? No Antigo Testamento, aqueles que violavam o sábado eram apedrejados, pois estavam roubando o tempo de Deus. Uma das grandes evidências da guarda do pacto no Antigo Testamento era a observância do sábado. É verdade que não podemos absolutizar tanto isso. Os puritanos o fizeram, mas o ideal é manter um equilíbrio. Por que Deus deu as festas, e deu fortes prescrições a respeito delas? Porque Ele quer que tenhamos alegria ao lembrar aquilo que fez por nós. Todo festival tinha o seu ambiente de prazer, de alegria, mas no coração do festival estava o sacrifício.

Terceira: De Davi até o Exílio. Essa foi a época do templo e a maior mudança foi a centralidade do culto. Era a adoração de um povo como um todo. Houve outras mudanças, mas o sacerdócio continuou a funcionar, embora em linha diferente, mas ainda da linhagem de Aarão; muitas tarefas levíticas foram mudadas, eles não tinham mais que se preocupar a respeito de carregar aquele palácio portátil, mas tinham que fazer trabalho de manutenção na habitação permanente de Deus, o templo. Davi deu prescrições, em nome de Deus, a respeito dos corais e grupos instumentais, mas os sacrifícios, o serviço sacerdotal, e as festas de sábado continuaram. Outra mudança relevante tinha que ver com o lugar de adoração. No tabernáculo havia o lugar santo dos santos, com a arca; havia também o lugar santo, para a mesa, o candelabro e o altar do incenso; então havia um lugar onde o sacerdote operava com a bacia e o altar, onde somente eles eram admitidos. Assim o tabernáculo tinha o lugar santo dos santos, um lugar um pouco maior que era o lugar santo, e depois a corte íntima, onde só os homens eram admitidos. Mas o templo também incluía a corte das mulheres e, além disso, em volta, havia a corte dos gentios, e não era apenas para os homens, o templo era para todas as pessoas e nações. De acordo com as prescrições, as nações poderiam entrar pela porta, desde que se tornassem parte do povo de Deus. É por isso que os santos do Antigo Testamento e os Salmos cantavam: “Nações, louvai a Deus. Sabei que pertenceis a este lugar porque Deus é vosso e vós sois de Deus”, conforme diz o Salmo 87.
Quarta: A era do exílio. Não havia templo, não havia sacrifício, não havia sacerdócio. Contudo, Deus enviou profetas, como Ezequiel e Daniel. Supõe-se, portanto, que os grupos fiéis se reuniram no exílio e começaram o que depois ficou conhecido como “sinagoga”.
Quinta: A era pós-exílica, com Neemias e Esdras. A partir de então, o templo foi restaurado, os sacerdotes voltaram a atividade, e os sacrifícios passaram a ser novamente oferecidos. Mas a ênfase é colocada sobre a Toráh, a Lei de Deus que era lida perante o povo. As sinagogas foram estabelecidas por toda a terra, sinagogas onde homens e mulheres sempre foram mantidos separados, mas onde a Toráh era lida e explicada. Havia cânticos, mas havia também uma divisão de pessoas em grupos diferentes, diferentes práticas litúrgicas nas sinagogas.
Então, à medida que analisamos estas cinco eras, encontramos mudanças, mas há sempre um lugar de adoração; há mudanças na liderança, mas há sempre o papel do sacerdote; há ainda o papel da música, da Lei e da hora de oração. Assim, nessas cinco eras, encontramos os seguintes princípios permanentes para o período do Novo Testamento:

Adoração. O culto litúrgico deve ser centralizado em Deus. Isso não foi mudado no Novo Testamento. A adoração deve ser prestada a Deus, Ele reivindica e espera isso de Seu povo. Cultuar, portanto, é um ato de obediência, é trabalhar para Deus, é serviço. Essa é a razão pela qual podemos falar do serviço litúrgico, e não da reunião litúrgica; a menos que você esteja enfatizando o encontro do povo com Deus. Adorar a Deus por causa de Deus significa que honramos o Seu caráter. Ele é espiritual, e por isso Jesus disse que devemos adorá-Lo em espírito. Isaías ficou impressionado quando estava no templo e viu a Deus, pois Deus é Santo, separado do que é material, puro; e, como espiritual que é, Ele não está limitado a experiências humanas. As experiências não podem determinar ou governar o tipo de liturgia. Se limitarmos o culto litúrgico às nossas idéias, estaremos limitando o Deus infinito. Infelizmente poucos hoje entendem o que é a santidade de Deus. Querem trazer Deus ao nível deles, ao invés de elevarem-se ao nível santo de Deus. Deus não é apenas santo, Ele é também majestoso. Os Salmo 93 diz que Ele está revestido de majestade, Deus é glorioso, é sublime, é lindo. Devemos adorá-Lo no Seu esplendor e na Sua beleza. Se mantivermos a nossa adoração nesse contexto próprio de beleza, majestade, e sublimidade, adoraremos a Deus da forma como Ele deve ser adorado.
O Deus do Antigo e do Novo Testamento é um Deus de amor, bondade, compaixão, e misericórdia. Mas esse Deus compassivo e misericordioso é, ao mesmo tempo, o Governador, o Soberano de todas as coisas. Todos os povos digam: “Deus reina!” Mas os pregadores, os sacerdotes, devem dizer isso primeiro, conforme Isaías. Na presença do Rei, no Palácio do Rei, os súditos nada são e devem portar-se com humildade e com disposição para servi-Lo. Vocês podem imaginar as pessoas indo ao palácio batendo palmas; “- Por que você está batendo palmas?” / “- Porque eu gosto”. Não, na presença do Altíssimo a nossa atitude não deve ser baseada naquilo que gostamos, mas sim naquilo que Ele requer que façamos. Afinal, quem está sendo cultuado, você ou Deus? Sinto muito se vocês gostam de bater palmas, isso é tão vulgar, diminui a beleza, e o esplendor da glória de Deus. Se o culto é centralizado em Deus, não apenas devemos honrar o caráter de Deus, devemos honrar também a vontade de Deus. Deus tem falado, e nada deve tomar o lugar de Deus e de sua palavra que está prescrita para nossa santificação. Eu quero repetir: Deus estabeleceu o tempo e o modo do culto, e isso é uma questão de obediência. É da vontade dEle que confessemos os nossos pecados e que compareçamos à Sua presença com um coração contrito, o salmista nos fala disso. Os sacrifícios do Antigo Testamento e o Sacrifício da Nova Aliança nos conclamam a relembrar o que éramos e o que hoje somos como pessoas redimidas.

A postura do povo na adoração. Somos portadores da imagem de Deus, e Ele não se esquece disso. Podemos pensar, sentir, falar e cantar; somos mais do que seres materiais físicos, somos espirituais; e é no culto que ocorre o encontro do nosso ser espiritual e Deus.
O sacerdote. No Antigo Testamento o culto devia ser conduzido diretamente por líderes indicados para esse fim (senão leiam de Êxodo 25 a Levítico 10; e Oséias). Os sacerdotes são condenados por não dirigir o povo, e ainda por serem dirigidos pelo povo. O povo de Deus no Antigo Testamento sempre precisou de líderes, o sacerdote tinha que conduzir o povo naqueles festivais, na expiação; então havia o sumo-sacerdote, o sacerdote, e os levitas, cada um com tarefas determinadas, de acordo com a administração superior do sumo-sacerdote. O Antigo Testamento mostra a necessidade da liderança, e estes sacerdotes tinham que se apresentar, conforme era prescrito, com roupas puras e brancas. Se os seus mantos tivessem uma mancha, eles estariam desqualificados para dirigir o povo no culto. Eles tinham que ter os adornos perfeitos. Deviam ser totalmente consagrados, receber um sangue purificador nas pontas dos dedos das mãos e dos pés, e seguir as prescrições de como o culto deveria ser conduzido. Aliás, só havia um modo de conduzir um culto aceitável: o modo prescrito por Deus. Só assim Ele aceitava os sacrifícios do povo através dos sacerdotes. Eles tinham até mesmo que tomar cuidado quanto ao modo como subiam os degraus das escadas que conduziam ao altar, as suas roupas teriam que ser de tal forma que cobrissem todo o seu corpo em todo o tempo. É necessário que se saiba todos esses detalhes, porque aqueles que gostam de basear-se no Antigo Testamento para justificar suas novidades, costumam deliberadamente a omitir esses detalhes. Na preparação para o culto, eles tinham que privar-se de contaminação com corpos, com cadáveres, com pessoas doentes e de qualquer relacionamento íntimo com a esposa (não é sem razão que a Igreja prescreve o celibato!). Em Levíticos, lemos que se não houvesse uma obediência estrita a essas prescrições eles seriam mortos. Todos os membros do clero nesta posição devem se conscientizar desse caráter mediatório da sua função, eles representam a Deus perante o povo, eles estão na presença de Deus, e a bondade, a majestade, e a beleza de Deus; mas eles também comparecem lá representando o povo, eles falam a Deus em favor do povo. No Antigo Testamento, Deus era o Rei; o povo, os servos; e os sacerdotes, os mediadores. Mas não eram mediadores como reis, e sim como um do povo que tinha sido apontado por Deus para representar o povo perante Ele. Eles tinham que elevar o povo até o padrão de Deus, e não trazer Deus aos padrões do povo. Essa era a prescrição do Antigo Testamento. Os inovadores, quando lhes é conveniente, costumam dizer que não estamos mais na era do Antigo Testamento. Contudo, também no Novo Testamento podemos ler a respeito de pessoas que foram apontadas para liderar, e foram qualificadas por Deus para esse trabalho. Pedro foi diretamente apontado por Cristo para liderar o rebanho da Nova Aliança. O papel do líder não foi renegado no Novo Testamento.
A adoração deve expressar a relação pactual estabelecida por Deus entre Ele e o Seu povo. Ele é o Senhor Soberano cujo amor tem sido demonstrado em atos e palavras. Mas Ele é o Senhor e nós, os servos. Nessa relação, devemos nos tornar a cada dia mais semelhantes a Ele. Frequentemente se diz que no casamento perfeito a esposa se torna mais e mais semelhante ao marido, mas isso é um pouco bilateral, porque o marido também deve aprender com a esposa. Agora, realmente o que nos conforta é que Deus não Se torna semelhante a nós, mas Ele nos compreende, e quando não fazemos exatamente o que Ele quer, Ele ainda é compassivo e continua a perguntar: “você me ama?” Todos os que O amam fazem a Sua vontade.
O quinto princípio da adoração é que há um julgamento pelo pecado e, por isso, o sacrifício deve ser renovado. O pecado tem que ser confessado, a expiação, a propiciação, feita por Cristo, em nosso favor se renova a cada dia em nossos altares. Os sacrifícios do Antigo Testamento apontavam para aquilo que Cristo iria fazer. No Antigo Testamento não havia culto, e nem adoração, sem sacrifícios; não havia culto sem altar. Para nós, não há maior ato de adoração do que aquele da Santa Missa, não pode haver culto litúrgico sem o significado da cruz, não há culto litúrgico sem Jesus Cristo, o que foi imolado e que agora vive entre nós no Santíssimo Sacramento. Israel tinha que repetidamente ouvir as maldições do pacto sobre aqueles que o violavam; ouvia as bênçãos, mas tinha que ouvir as maldições também, para lembrar-se de que havia um caminho da vida mas que havia também um caminho da morte.
Além disso, a adoração devia também incluir ofertas, e os sacrifícios deviam expressar gratidão, devoção, desejo de comunhão e meditação, prontidão, e voluntariedade para compartilhar coisas materiais com os sacerdotes, levitas, os pobres, e as viúvas. Não havia lugar para a mesquinhez no culto.

No Sinai, Deus trouxe o povo para um lugar; o Tabernáculo, Ele trouxe o povo para Si mesmo; no Templo, Ele atraiu o povo para Si, em um lugar; porque num lugar centralizado, a imortalidade de Deus e a Sua permanência eram expressas de uma maneira mais bela; porque num lugar centralizado a Sua beleza, Sua glória, poderiam ser também melhor expressas; mas de uma maneira ainda mais significativa, o lugar centralizado era onde a unidade de Israel, como um só povo, podia ser melhor expressa. No lugar centralizado, aquilo que Deus tem feito deve encontrar também a sua melhor expressão. Como um só povo, reunido num só lugar, devemos reconhecer a Deus como aquele que nos criou e que nos redimiu. Devemos nos lembrar que as festas foram colocadas para recordar as maravilhas que Deus tinha feito (Dt 5). A festa do Tabernáculo expressava o modo como eles viveram no deserto e como Deus os conduziu lá; a festa das colheitas era a maneira como eles celebravam as boas coisas que Deus lhes concedia. Portanto, a adoração é uma expressão concreta do reconhecimento de que Deus é um Deus generoso, criador e redentor. No Novo Testamento isso se traduz em louvores a Deus por nos dar o Seu Filho. Lembramos da paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo, do Seu Reino, e do Seu Espírito derramado sobre nós por meio de todos os tempos litúrgicos da Igreja e suas prescrições. Do mesmo modo devemos também dar ações de graças a Ele através das nossas dádivas.

O último princípio que não podemos nos esquecer é que o culto litúrgico é para toda a família. Pais, como chefes do lar, representando o rei; mães, como as rainhas, tão reais quanto o pai; e os filhos, que são os príncipes e as princesas; todos tiveram que estar lá no culto a Deus, no Sinai. Quando Deus fez um pacto com o Seu povo eles todos tiveram que estar presentes, até mesmo as crianças de peito; e não havia um culto especial para as crianças lá, não havia “missas para crianças”, “missas para os jovens”… (estou pisando em terreno perigoso?) Talvez possamos falar um pouco mais sobre isso. No Antigo Testamento, as crianças tinham que ser trazidas ao templo já no oitavo dia para circuncisão, e na idade de 12 anos já deviam ser consideradas adultas, no que diz respeito ao culto; as crianças eram os futuros servos do rei. Cabe aqui ressaltar que as crianças deviam participar também da páscoa, e elas tinham inclusive o privilégio de perguntar: O que significa isso? E os pais tinham que responder. Isso certamente foi na época em que o culto estava centralizado na família, mas o mesmo é verdadeiro quando o culto foi transferido e centralizado no templo.
Concluindo, no Antigo Testamento encontramos cinco períodos; e permitam-me enfatizar que foi uma época de sombras, símbolos, tipos, e de preparação para a vinda de Cristo. Agora estamos no período do Novo Testamento; o Cristo que foi indicado no Antigo Testamento, como o Servo Sofredor, agora é o Cristo Ressuscitado e Glorioso, Ele trouxe tudo o que estava representado nos sacrifícios. Não há mais necessidade de derramamento de sangue de bois ou carneiros, já que o Seu Sacrifício foi único, perfeito e eterno, mas ainda assim se espera sacrifícios. Nós trazemos os nossos sacrifícios em cânticos, louvores, e ofertas; mas o maior sacrifício que podemos oferecer a Deus somos nós mesmos. Quando Deus chama os Bispos e os sacerdotes, chama-os para o culto, chama-os para representá-Lo, como aquele que está entronizado, como o cabeça da Igreja. Portanto, é uma questão de obediência que nos reunamos como povo de Deus, como Igreja, é uma questão de honra devida a Cristo. Quando ouvimos e obedecemos àqueles que foram ordenados e consagrados por Deus para o Seu serviço aqui na terra, não é uma questão de simples escolha, Deus não nos deu escolha. Ele nos convoca para o Seu culto através dos Seus representantes divinamente ordenados. E eles, como líderes da Igreja, não podem negligenciar a sua responsabilidade. Devem cumprir e mostrar a vontade de Deus ao povo. Na medida em que comparecem perante o povo, representando a Cristo, Sua Palavra e Seu perdão, devem lembrar-nos qual seja a vontade de Deus, e isso de forma digna e majestosa para que representem, por sua vez, a dignidade, a majestade e as maravilhas de Deus. No nosso culto litúrgico hoje, devemos refletir acuradamente sobre o que Deus fez no passado. Não devemos imitar as práticas do Antigo Testamento porque isso seria apenas o arqueologismo já condenado pelo Magistério da Igreja, mas devemos considerar e obedecer a esses princípios que descrevemos, pois de modo algum eles foram revogados.

*Dr. Van Groningen é doutor em Teologia pela Universidade de Melbourne, Austrália.

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