Autor: Valdir Xavier de França
Num contexto de mudanças tão rápidas e da banalização do cristianismo, eu particularmente creio que a celebração cristã que mais representa o significado do verdadeiro cristianismo é a páscoa cristã.
Nela encontramos elementos que resumem o que verdadeiramente significa ser cristão no mundo de hoje. Sem a páscoa cristã não teríamos nenhuma boa notícia para contar a ninguém.
Ela nos diz por exemplo, que: 1. A experiência da páscoa cristã veio confirmar todo o ministério terreno de Jesus. Ele foi verdadeiro e tudo aquilo que ele disse e fez se consumam nesta experiência maravilhosa; 2. Os evangelhos só foram escritos por causa deste evento e que sem ele não teríamos nada prá contar ao mundo; 3. Também nos fala de uma era que se estava findando e de uma nova que estava tomando forma e começando. A páscoa cristã tem profunda influência na origem da missão da Igreja cristã primitiva, pois era o Cristo ressurrecto e exaltado que atraia e atrai as pessoas a Deus.
Neste contexto eu gostaria de pensar sobre o que tudo isto tem a ver conosco no inicio de um novo milênio e meditar sobre a perspectiva dessa experiência tão singular na história da humanidade, para nós hoje enquanto comunidade cristã, Igreja.
Eu quero pensar que os eventos dos últimos dias da vida de Jesus na terra nos falam sobre a nossa responsabilidade de encarnar sua história e nos remetem para a Missão.
1. A Perspectiva Futura da Comunidade Cristã – Com a páscoa a comunidade cristã ganha perspectiva de futuro, sentido de continuidade, o sonho não acabou. Ela ganha senso de auto definição e identidade própria para prosseguir com sua missão delegada e realizar o seu chamado. É somente com base na experiência deste evento que todo o ministério terreno de Jesus tem significado futuro. Este ministério não cessa, não desaparece, nem tão pouco é extinto, ele continua ministrando no mundo através desse ajuntamento de pessoas que são agregadas a esta comunidade. Sua Igreja.
É exatamente neste particular que podemos dizer que por causa da páscoa cristã, os evangelhos foram escritos, e também não seria muito dizer que sem ela, estes não teriam e nem fariam nenhum sentido para as gerações futuras dessa comunidade. Estes foram escritos não só para mostrar eventos passados e históricos, mas para revelar um fé viva, impulsionadora e verdadeira que queima o peito e faz esta comunidade marchar em direção ao futuro com confiança e segurança de que Cristo está e sempre estará presente com a sua comunidade, seu povo.
2. A Perspectiva da Vitória de Cristo Sobre o Mal – A páscoa também nos fala sobre o ápice da presença de Jesus na terra. Sua ressurreição e exaltação significam que Ele já possui a vitória sobre Satanás, a Morte, o Inferno, o Mundo. E que o seu Reino já se tornou uma realidade, mesmo que nem todos reconheçam isto ainda. Portanto não existe nenhuma perspectiva de se falhar nesta missão, o sucesso da missão da Igreja ou não, não trará ou deixará de trazer o Reino de Deus, que já é uma realidade presente no mundo, conduzida para dentro de nossa experiência (realidade) pelo evento da páscoa cristã.
A comunidade dos primeiros cristãos responde a tudo isto de uma maneira maravilhosa, através da sua expressão missionária. Manifestando por onde passavam os mesmos sinais do Reino de Deus, da mesma forma como Jesus fazia, curando, expulsando demônios e etc. Eles entendiam que não era um esquema, um método mas que o poder da experiência da páscoa cristã era que os conduzia a vitória e assim proclamavam a glória de Deus entre os homens, falando não só da experiência de Cristo que voltou dos mortos, como também de suas próprias experiências como aqueles que foram tirados das trevas para a maravilhosa luz de Deus.
3. A Perspectiva do Espírito Santo Sobre Esta Comunidade – Mesmo que o Pentecostes aconteça depois de quarenta dias, quando o Espírito de Deus foi derramado sobre esta comunidade. Podemos afirmar que existe uma intima ligação entre estes dois eventos. Se o evento da Ressurreição havia trazido confiança e identidade própria à esta comunidade, o derramar do Espírito Santo trouxe coragem, intrepidez e ousadia para que esta comunidade se tornasse testemunha dos fatos ocorridos, mesmo que isto viesse a custar-lhes a própria vida. Foi somente através do poder do Espírito Santo que eles se tornaram testemunhas. Newbigin diz que missão é o fluir do Pentecostes, e alguns até afirmam que a primeira atividade do Espírito Santo é Missão.
É através do Espírito Santo que Cristo continua vivo e ativo no mundo e que no dia de Pentecostes Ele escancara as portas dessa comunidade e lança os seus discípulos para o mundo. Com certeza a experiência da páscoa é o inicio do fim dos tempos. Quando será o fim? O tempo é curto e cabe a nós debaixo da orientação do Espírito Santo fazer a vontade de Cristo da mesma forma que Ele cumpriu a vontade do Pai.
Conclusão
Para os discípulos a ressurreição de Cristo e a vinda do Espírito Santo são provas incontestáveis da presença do Reino de Deus entre nós. Mas o que temos nós a ver com isso, as portas de um novo milênio, num contexto de “terceiro mundo”, numa Igreja que luta para descobrir a sua própria identidade num mundo de tão rápidas mudanças?
Bom, penso que para nós, da América Latina:
1. Não há outra possibilidade de se continuar existindo, enquanto Igreja, que não seja sob a perspectiva do Cristo ressurrecto.
Sem o Cristo ressurrecto não existe a suprema autoridade sobre todas as coisas, principados, poderes e dominações deste século presente que nos tornaria impotentes para desenvolver qualquer tarefa missionária.
2. Não há outra possibilidade de se continuar existindo, enquanto Igreja, que não seja sob a perspectiva da natureza missionária da Igreja.
Sem páscoa Cristã a Igreja não seria existente. Esta comunidade cristã só existe por causa do Cristo ressurrecto e é sua tarefa primordial contar a todos que Deus em Cristo reconcilia o homem consigo mesmo.
3. Não há outra possibilidade de se continuar existindo, enquanto Igreja, que não seja sob a perspectiva do já e do ainda não.
A páscoa cristã nos diz que a realidade do Reino de Deus já é presente, e que a caminhada dessa comunidade tem que ser marcada por esta noção do já e do ainda não. Anunciar, buscar e clamar o Reino de Deus, presente e futuro é prerrogativa da existência desta comunidade.
Feliz Páscoa!
Bibliografia
Bosch, David J., Transforming Mission:Paradigm Shifts in Thelogy of Mission New York, Orbis Books, 1999
Newbigin, Leslie, Trinitarian Doctrine for Today’s Mission England, Paternoster Press, 1998