Autor: Lewis B. Smedes
No vilarejo de Faken, no interior da Frísia, vivia há muito tempo um padeiro chamado Fouke, alto e esguio com um queixo longo, fino e empinado, e um nariz longo, afilado e empinado também, Fouke era um homem justo. Ele era tão certinho e de seus lábios parecia jorrar tal “eqüidade”, que o povo de Faken preferia manter distância dele.
Sua esposa, Hilda, era baixinha e parrudinha. Ela era toda redondinha, da cabeça aos pés. Hilda não afugentava as pessoas com a sua “eqüidade”. Era justamente a sua aparência que as atraía e as deixava à vontade na sua companhia, pois ela emanava compreensão e alegria.
Hilda respeitava o seu marido certinho e também o amava — tanto quanto ele lhe permitia. Mas no fundo ela sentia falta de algo mais, algo além de sua atitude imaculada. E esse vazio era a raiz de sua tristeza.
Um dia de manhã, depois de ter trabalhado desde madrugada fazendo pão, ao chegar em casa, Fouke deparou-se com um estranho em seu quarto, recostado no colo fofinho de Hilda.
A aventura dela logo tornou-se a conversa nas tabernas e o escândalo entre a congregação de Faken. O povo, conhecendo a reputação de Fouke, presumia que ele expulsaria a esposa de casa. Mas ele surpreendeu a todos, mantendo Hilda como esposa e dizendo que a perdoava como o Bom Livro [a Bíblia] lhe dizia para fazer.
Mas no fundo, no fundo, Fouke não conseguia perdoar-lhe por ter envergonhado o seu nome. Sempre que pensava nela, sentia raiva e amargura. Ele a desprezava como a uma prostituta qualquer. A questão é que ele a odiava por tê-lo traído sendo ele um marido tão bom e fiel.
Ele só fingia ter perdoado a esposa para poder puni-la com a sua “misericórdia”.
Acontece que esse fingimento de Fouke não “colava” lá no Céu, então cada vez que ele sentia aquele ódio por dentro, um anjo ia até ele e jogava dentro de seu coração uma pedrinha menor do que um botão de camisa.
Cada vez que caía uma pedrinha ali, Fouke sentia uma dor parecida com a dor que sentira no momento em que flagrara Hilda saciando sua fome de amor com um estranho.
Sendo assim, ele a odiava cada vez mais. Esse ódio lhe causava dor e a dor criava mais ódio.
O número de pedrinhas foi aumentando e pesando cada vez mais no coração de Fouke. Seu coração ficou tão pesado que seu corpo curvou-se de tal forma que ele tinha que forçar sobremaneira o pescoço para poder olhar adiante. Cansado de tanto sofrimento interior, começou a desejar a morte.
Uma noite o anjo que jogara as pedrinhas em seu coração foi visitá-lo e lhe disse como poderia ser curado dessa dor.
Ele disse que havia um remédio, só um, para o seu sofrimento. Ele precisaria do milagre dos olhos mágicos. Precisaria ter olhos que pudessem olhar e ver como a sua dor começara, e ver Hilda não como a esposa que o traíra, mas como uma mulher frágil que precisava dele. Somente olhando de uma forma diferente, com os olhos mágicos, ele poderia sanar a dor das mágoas passadas.
Fouke protestou: “Nada pode mudar o passado. Hilda é culpada, e isso é um fato que nem um anjo pode alterar”.
“É verdade, você tem razão”, disse o anjo para o pobre coitado. “Você não pode alterar o passado, apenas sarar a dor que ele lhe traz. E só pode sará-la olhando com os olhos mágicos.”
“E como vou conseguir olhos mágicos?” perguntou Fouke de cara feia.
“Peça, desejando de coração, e receberá. E sempre que vir Hilda através dos seus novos olhos, uma pedrinha será retirada do seu coração sofrido.
Fouke não conseguia pedir, pois passara a gostar desse sentimento de ódio. Mas a dor no coração finalmente o forçou a querer pedir os olhos mágicos que o anjo lhe prometera. Então pediu e o anjo lho deu.
Ele logo começou a presenciar a maravilhosa e misteriosa transformação de Hilda. Ele começou a vê-la como uma mulher carente que o amava, em vez de uma mulher iníqua que o traíra.
O anjo cumpriu sua promessa retirando uma a uma todas as pedrinhas do coração de Fouke. Demorou bastante tempo para retirar todas. O seu coração pouco a pouco foi ficando aliviado e ele começou a andar ereto novamente. Por alguma razão também o seu nariz e queixo não eram mais tão empinados como antes. Ele convidou Hilda para participar de sua vida novamente e ela aceitou, e juntos iniciaram uma jornada na sua segunda chance de serem felizes sendo humildes.
Um novo espírito porei dentro deles; tirarei da sua carne o coração de pedra, e lhes darei um coração de carne. Ezequiel 11:19 (ECA)
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