Autor: Renato Vargens
Antes de abordarmos um tema tão complexo como a herança histórica religiosa em nosso país, é imperioso além de fundamental retrocedermos até as origens do sentimento mágico religioso, que se perde na história da humanidade.
O pensamento mágico remete-se a pré-história e atinge uma categoria universal: desde as épocas mais remotas da humanidade e em todos os cantos da terra, faz-se misturada à religião. Dos séculos mais distantes, datam estatuetas com formas humanas imbuídas do sentimento mágico. Por exemplo, o que dizer de Ur dos caldeus uma cidade antiga dos primórdios da civilização onde o misticismo e a religiosidade delineavam a forma de vida de seus moradores. É em Ur que percebemos uma gama significativa de deuses dos mais distintos e variados como: Onu o soberano do céu; Enlil e Adad deuses das tempestades e dos dilúvios; Sin o deus lua; Shamosh, o deus guerreiro; minurta o deus da guerra; Gula a deusa que presidia a medicina; Nabu o deus da escrita. Isto tudo, sem falar dos bruxos, dos feiticeiros, dos magos, que faziam todo o tipo de feitiçaria e magia a fim de incitar a ação dos espíritos.
E a grande civilização grega? Grandes pensadores como Tales de Mileto, Platão, Heráclito, Sócrates permeavam seus conselhos com práticas de magia e curandeirismo.
O pensamento e a experiência mágico-superticiosa estão presentes em todas as sociedades na Europa, na África, no Brasil, em Cuba, na Austrália, e em toda parte do globo onde existir vida humana.
A diferença entre religião e magia:
Desde os tempos mais remotos até os dias de hoje, a magia e a religião tem sido refúgio para os corações amedrontados, angustiados e desesperados. Carmem Cinira Macedo, nos apresenta um ponto em que a magia e a religião se distinguem:
“Na religião, o indíviduo é considerado subordinado a vontade dos seres sobrenaturais. Na magia, considera-se que , sob certas condições , o indíviduo pode dominar e controlar as forças sobrenaturais.”
O domínio do sagrado e da magia encontra abertura no coração humano nas ocasiões em que ele, ser humano sofre. Nesses momentos, o homem busca uma explicação para o universo e a vida, além de buscar uma solução para o seu problema particular.
Os religiosos que vivem com sua visão voltada para o eterno são os místicos. O misticismo tem marcado fortemente a religiosidade popular. O povo precisa de um místico para apontar-lhe uma saída. É em meio a esse clima mágico-religioso que devemos compreender as seitas inerentes ao povo brasileiro.
Magia, feitiço e supertição no Brasil:
Por volta de 1530 vieram para o Brasil os primeiros negros como escravos, para trabalharem no 1o centro produtor de açúcar: Vila de São Vicente, no atual estado de São Paulo. Durante aproximadamente 320 anos os negros foram capturados em sua terra de origem e trazidos para o Brasil a fim de exercerem a função de escravos. A maioria dos negros procedia da costa da África Ocidental. Traziam consigo elementos de pelos menos 03 culturas africanas: Sudanesa, Guinlense-sudanesa e Banto. Daí a serem divididos em 02 grandes grupos: Os Sudaneses e os Bantos.
Ao chegarem ao Brasil, os nefros foram se misturando uns aos outros, com os índios e com os estrangeiros, influenciando e sendo influenciados psicológica e socialmente.
Outro fator importante a se observar é que chegando ao Brasil, os negros encontraram uma sociedade semifeudal que podia utilizar o trabalho braçal dos escravos sem questionar as suas representações mágico-religiosas. Provinham eles de economia agrícola mais adiantada do que a existente no Brasil e puderam adaptar-se facilmente as atividades agrícolas aqui encontradas. Assim, o orixá Ogum encontrou aqui suas ferramentas de trabalho: enxada, foice, pá e etc. Aqui o negro encontro o cavalo, o bode, o carneiro, o galo e a galinha, utilizados nos sacrifícios; encontrou o mar, de onde saíam a sereia e o calunga; os rios, onde poderiam lavar as pedras de Iasan e Olum.
O latifundiário no Brasil era senhor da vida e da morte de seus escravos. Como acontecia na África, aqui os negros podiam cultuar os seus deuses, realizando seus rituais e cerimônias mágicas.
Sincretismo Religioso:
O significado de sincretismo:
“Nos primórdios da era cristã, época de Plutarco, o verbo syncretizo designava a união de diversas comunidades cretenses, quando o inimigo invadia a Grécia; esse acordo comum era syncretismos. O verbo grego Kretizo vem da ilha de Creta e significa falar e agir como um cretense. Somente a partir do século XVI, o termo sincretismo foi utilizado para designar a mistura de doutrinas filosóficas ou teológicas. Erasmo lhe deu novo significado, derivando-o do verbo Kerannyai (misturar) mais o latin crescere (syn + crescere = com cvrescer ou crescimento conjunto. A partir do século XIX , sincretismo designa a mistura de diversos cultos, divindades e religiões.”).
Os elementos do sincretismo brasileiro:
1. Catolicismo medieval de Portugal:
É o chamado catolicismo tradicional, que se caracteriza por ser medieval, luso-brasileiro, leigo , social e familiar. O catolicismo implantado pelos portugueses no Brasil foi o da contra-reforma que conservou o velho culto dos santos, com muitas práticas das supertições da idade média.
Obs: O santo é aquele que por um lado protege os cristãos do terror dos espíritos. O santo é aquele que serve de medianeiro entre Deus e o homem, apaziguando-o da sua ira contra o ser humano.
2. A cultura indígena:
O Ameríndio vem contribuir na formação do animismo brasileiro com a crença na comunicação com os espíritos dos mortos ancestrais, o que resultou no culto e devoção dos últimos. Os indígenas viviam num mundo rico de lendas, cerimônias e crenças espirituais, onde os mortos e os vivos interferem e comungam entre si. O universo ameríndio era governado pelos espíritos, onde todos os acontecimentos, como a semeadura e a colheita, a caça , a pesca, a guerra e o ciclo da vida eram precedidos por cerimônias que lhe davam cunho e significado espiritual. Os índios habitantes das selvas brasileiras viviam obcecados pelo medo. Tinham crenças estranhas e eram aterrorizados pelos espíritos. Eles criam que as florestas eram infestadas pelos espíritos que se encarnavam em animais ou em membros da tribo, para encorajar ou afligir os coitados.
Alguns deuses indígenas:
Inoran – Os Tupinambás criam que esta entidade não tinha início e nem fim, tendo existido sempre.
Tupã – o deus trovão.
Jurupari – Identificado como diabo. Ele costumava habitar em vilas abandonadas e em lugares onde os corpos dos antepassados eram enterrados.
Algumas lendas indígenas:
Saci-perêre – O mensageiro dos mortos.
Curupira – Protetor e senhor dos segredos das florestas.
Caipora – O seu aparecimento significa presságio de problemas.
O pajé:
Era o encarregado de apaziguar os espíritos e servir de mediador entre eles e o povo.
Era o intérprete do sobrenatural.
Era o curandeiro da tribo.
3. A influência africana:
O catolicismo medieval portugûes, que enfatizava a participação dos santos como intermediário entre Deus e os homens, já era para as classes mais simples e incultas, e entre a própria raça branca, um politeísmo disfarçado. Assim os negros teriam todas as rações para confundir os santos católicos com os orixás do seu animismo ou fetichismo.
Orixás Paralelo católico
Exu São Gabriel
Ibejê Cosme e Damião
Iemanjá Nossa Senhora
Ifá Espírito Santo
Olurum Deus
Oxalá Menino Jesus
Oxossi São Jorge
Nas celebrações religiosas promovidas pela família patriarcal dificilmente os brancos se misturam com os escravos. Em tais ocasiões, os brancos criam firmemente que os negros dançavam em glória da bendita virgem Maria e dos santos, entretanto a virgem e os santos eram apenas máscaras.
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Pr. Renato Vargens, escritor, conferencista e um dos pastores da Igreja Cristã da Aliança em Niterói.
Casado com Ana Cristina e pai de João Pedro e Luiz Filipe.
http://www.renatovargens.rg3.net
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