A ética nossa de cada dia

Autor: Augustus Nicodemus Lopes
Todos nós tomamos diariamente dezenas de decisões, resolvendo aquilo que tem a ver com nossa vida, a vida da empresa e de nossos semelhantes. Ninguém faz isso no vácuo. Antigamente pensava-se que era possível pronunciar-se sobre um determinado assunto de forma inteiramente objetiva, isto é, isenta de quaisquer pré-concepções. Hoje, sabe-se que nem mesmo na área das chamadas ciências exatas é possível fazer pesquisa sem sermos influenciados pelo que cremos. Ao elegermos uma determinada solução em detrimento de outra, o fazemos baseados num padrão, num conjunto de valores do que acreditamos é certo ou errado. É isso que chamamos de ética: o conjunto de valores ou padrão pelo qual uma pessoa entende o que seja certo ou errado e toma decisões. Cada um de nós tem um sistema de valores interno que consulta (nem sempre, a julgar pela incoerência de nossas decisões…!) no processo de fazer escolhas. Nem sempre estamos conscientes dos valores que compõem esse sistema, mas eles estão lá, influenciado decisivamente nossas opções.

Os estudiosos do assunto geralmente agrupam as alternativas éticas de acordo com o seu princípio orientador fundamental. As chamadas ÉTICAS HUMANÍSTICAS tomam o ser humano como seu princípio orientador, seguindo o axioma de Protágoras, “o homem é a medida de todas as coisas”. O hedonismo, por exemplo, ensina que o certo é aquilo que é agradável. Freqüentemente somos motivados em nossas decisões pela busca secreta do prazer. O individualismo e o materialismo modernos são formas atuais de hedonismo. Já o utilitarismo tem como princípio orientador o que for útil para o maior número de pessoas. O nazismo, dizimando milhares de judeus em nomes do que é útil, demonstrou que na falta de quem decida mais exatamente o sentido de “útil”, tal princípio orientador acaba por justificar os interesses de poderosos inescrupulosos e o egoísmo dos indivíduos. O existencialismo, por sua vez, defende que o certo e o errado são relativos à perspectiva do indivíduo e que não existem valores morais ou espirituais absolutos. Seu principio orientador é que o certo é ter uma experiência, é agir — o errado é vegetar, ficar inerte. O existencialismo é o sistema ético dominante em nossa sociedade moderna, que tende a validar eticamente atitudes tomadas com base na experiência individual.

A ÉTICA NATURALÍSTICA toma como base o processo e as leis da natureza. O certo é o natural — a natureza nos dá o padrão a ser seguido. A natureza, numa primeira observação, ensina que somente os mais aptos sobrevivem e que os fracos, doentes, velhos e debilitados tendem a cair e desaparecer à medida em que a natureza evolui. Logo, tudo que contribuir para a seleção do mais forte e a sobrevivência do mais apto, é certo. Numa sociedade dominada pela teoria evolucionista não foi difícil para esse tipo de ética encontrar lugar. Cresce a aceitação pública do aborto (em caso de fetos deficientes) e da eutanásia (elimina doentes, velhos e inválidos).

Os cristãos entendem que éticas baseadas exclusivamente no homem e na natureza são inadequadas, já que ambos, como os temos hoje, estão profundamente afetados pelos efeitos da entrada do pecado no mundo. A ÉTICA CRISTÃ, por sua vez, parte de diversos pressupostos associados com o Cristianismo histórico. Tem como fundamento principal a existência de um único Deus, criador dos céus e da terra. Vê o homem, não como fruto de um processo evolutivo (o que o eximiria de responsabilidades morais) mas como criação de Deus, ao qual é responsável moralmente. Entende que o homem pecou, afastando-se de Deus; como tal, não é moralmente neutro, mas naturalmente inclinado a tomar decisões movido acima de tudo pela cobiça e pelo egoísmo (por natureza, segue uma ética humanística ou naturalística). Um outro postulado é o de que Deus enviou seu Filho Jesus Cristo ao mundo para salvar o homem. Mediante fé em Jesus Cristo, o homem decaído é restaurado, renovado e capacitado a viver uma vida de amor a Deus e ao próximo. A vontade de Deus para a humanidade encontra-se na Bíblia. Ela revela os padrões morais de Deus, como encontramos nos 10 mandamentos e no sermão do Monte. Mais que isso, ela nos revela o que Deus fez para que o homem pudesse vir a obedecê-lo.

A ÉTICA CRISTÃ, em resumo, é o conjunto de valores morais total e unicamente baseado nas Escrituras Sagradas, pelo qual o homem deve regular sua conduta nesse mundo, diante de Deus, do próximo e de si mesmo. Não é um conjunto de regras pelas quais o homem poderá chegar a Deus – mas é a norma de conduta pela qual poderá agradar a Deus que já o redimiu. Por ser baseada na revelação divina, acredita em valores morais absolutos, que são a vontade de Deus para todos os homens, de todas as culturas e em todas as épocas.

Artigo do Rev. Dr. Augustus Nicodemus Lopes, professor de Bíblia do Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper, publicado na revista MACKENZIE, edição no. 3

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