Autor: Ézio Martins de Lima
“Em seguida dizia a todos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e siga-me”. (Lucas 9.23)
“Não vos inquieteis, pois, pelo dia de amanhã; porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal”. (Mateus 6.34)
A fé cristã é realista. Não esconde as vicissitudes da existência, nem mascara as mazelas que, admitindo ou não, enfrentamos momento após momento! Alguns há que, é verdade, preferem uma fé que lhes rouba o contato com a realidade. Há uma palavra cunhada para expressar esta realidade: alienação. Negar a realidade, contudo, não a altera. Pode até ser que a negação repetida leve a um estado de condicionamento mental capaz de tornar o verdadeiro em falso e o falso em verdadeiro, mas mesmo assim o que se nega não deixa de existir…
Em geral as religiões, quer sejam animistas ou não, politeístas ou não, negam o sofrimento espiritualizando-o. O cristianismo, por sua vez, trata do sofrimento com uma realidade ímpar, ao considerá-lo um fator inerente à existência. Jesus disse aos Seus discípulos que o sofrimento ser-lhes-ia uma experiência concreta “a cada dia”: “Não vos inquieteis, pois, pelo dia de amanhã; porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal” (Mateus 6.34).
Particularmente pensamos que os cristãos modernos não sabem lidar com o sofrimento. Tal fato se deve ao distanciamento do ensino de Jesus e a absorção de conceitos kármicos e fatalistas, bem como o dualismo que geralmente se faz entre corpo/carne (concebido como mal), e alma/espírito (concebido como bom). Se o corpo é mau, tudo que o corpo sofre é símile: prazer, dor, cansaço, etc. Quão distante tais conceitos estão do cristianismo bíblico!
Por assimilarem tais conceitos, as pessoas se frustram com Deus quando se vêem vitimadas pelo sofrimento. Mas a verdade é que não há como fugir da experiência universal do sofrimento! Como bem escreveu o rabino Kushner: “Todos somos irmãos e irmãs no sofrimento. Ninguém chega até nós de uma casa que nunca conheceu a tristeza”.
É verdade que a vida cristã é coroada da alegria indizível, da paz que excede todo entendimento e de vitórias incontáveis… A vida, porém, não a vivemos apenas nos altos montes e picos da vitória, também a vivemos nas planícies do descontentamento, nos desertos das provas e tentações e, infelizmente, nos vales do silêncio e da morte!
Nossa experiência de vida, bem como a vivência com as angústias dos nossos irmãos e irmãs de fé, tem revelado o quanto precisamos de uma concepção bíblica do sofrimento para que não incorramos no mesmo erro dos outros “que não têm esperança” (I Tessalonicenses 4.13).
O Pastor não disse que não passaríamos pelo vale da sombra da morte, mas a experiência de Davi no sofrimento o ensinou a encontrar o Supremo Pastor inclusive no vale de lágrimas (Salmo 23)! O Bom Pastor não disse que o ladrão não tentará roubar-nos, nos matar e nos destruir…. mas disse que “as Suas ovelhas conhecem Sua voz e O seguem” (João 10). Parece-nos que o ensino bíblico, a partir inclusive do que Jó aprendeu (Jó 42.1-6), quer nos mostrar não que o sofrimento será aniquilado da vida dos crêem em Jesus, mas que somente em Jesus podemos suportar o sofrimento com esperança! Eis a suprema mensagem de Jesus: mostrar o triunfo da fé que repousa na Graça quando do despojamento completo do eu. Enfim, a Graça é suficiente quando somos privados das demais coisas! (2 Coríntios 12.9)
“Na fé cristã, a angústia não nos separa de Deus, mas ao contrário no conduz a uma comunhão mais profunda com Deus. A fé cristã em Deus é essencialmente comunhão com Cristo, e a comunhão com Cristo é essencialmente a comunhão com o Cristo que foi tentado e que sofreu e se sentiu abandonado. Em sua própria angústia, o homem participa na angústia de Cristo, pois Cristo em Seus sofrimentos passou pelos mesmos sofrimentos e angústias que afetam os seres humanos” .
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