A carta de Judas

Autor: Jorge Pinheiro dos Santos
A epístola de Judas começa e termina com palavras confortadoras. O assunto central da carta de Judas é o versículo três. Por isso, desejamos torná-lo o assunto de nosso estudo: é dever batalhar pela fé que foi entregue aos santos.
A carta de Judas é um dos textos mais desconhecidos do Novo Testamento. É de certa forma um escrito estranho, porque cita o Primeiro Testamento e não se refere aos evangelhos. Mais ainda, cita livros que, mais tarde, serão declarados apócrifos. É o caso do verso nove, um trecho tirado do livro A ascensão de Moisés e do verso 14 tirado do livro de Enoque, literatura que fazia parte da cultura judaica, mas que não foi considerada inspirada pelos judeus.
É uma carta pequena, de 25 versículos, escrito em grego elegante, surgido no final do primeiro século. O tempo dos apóstolos já passara e estamos na época pós-apostólica. As comunidades às quais Judas se dirige não têm um rosto definido: trata-se de uma carta aberta, mas os problemas são muito concretos: divisões internas por causa de falsos profetas que exploram as pessoas em nome da fé. Nesse sentido, é um texto extremamente atual e importante.

“Eu, Judas, servo de Jesus Cristo e irmão de Tiago, escrevo esta carta aos que foram chamados, isto é, aqueles a quem Deus, o Pai, ama e a quem Jesus Cristo protege. Que vocês tenham mais e mais a misericórdia, a paz e o amor de Deus!

Meus queridos amigos, eu estava fazendo todo o possível para escrever a vocês a respeito da salvação que temos em comum. Então senti que era necessário escrever agora para animá-los a combater a favor da fé que, uma vez por todas, Deus deu ao seu povo. Pois alguns homens que não temem a Deus entraram no meio da nossa gente sem serem notados. Eles torcem a mensagem a respeito da graça do nosso Deus a fim de arranjar uma desculpa para a sua vida imoral. E também rejeitam Jesus Cristo, o nosso único Mestre e Senhor. Há muito tempo que as Escrituras Sagradas anunciaram a condenação que eles já receberam. Embora vocês conheçam tudo isso, quero lembrar que o Senhor salvou o povo de Israel, tirando-o da terra do Egito, mas depois destruiu aqueles que não creram. Lembrem dos anjos que não ficaram dentro dos limites da sua própria autoridade, mas abandonaram o lugar onde moravam. Eles estão amarrados com correntes eternas, lá embaixo na escuridão, onde Deus os está guardando para aquele grande dia em que serão condenados. Lembrem dos moradores de Sodoma, de Gomorra e das cidades vizinhas, que agiram como aqueles anjos e cometeram imoralidades e pecados sexuais. Eles sofreram o castigo do fogo eterno, o que é um aviso claro para todos.

Do mesmo modo esses homens têm visões que os fazem pecar contra o próprio corpo deles. Desprezam a autoridade de Deus e insultam os gloriosos seres celestiais. Nem mesmo o arcanjo Miguel fez isso. Na discussão que teve com o Diabo, para decidir quem ia ficar com o corpo de Moisés, Miguel não se atreveu a condenar o Diabo com insultos, mas apenas disse: Que o Senhor repreenda você!. Mas esses homens xingam aquilo que não entendem. E as coisas que eles conhecem por instinto, como os animais selvagens, são estas que os destroem. Ai deles! Seguem o mesmo caminho de Caim. Por causa de dinheiro, eles se entregam ao mesmo erro de Balaão. E, como Corá se revoltou e foi destruído, eles também se revoltam e serão destruídos. Com as suas vergonhosas bebedeiras, eles são como manchas de sujeira nas refeições de amizade que vocês realizam. Eles cuidam somente de si mesmos. São como nuvens levadas pelo vento, que não trazem nenhuma chuva; são como árvores que, mesmo no outono, não produzem nenhuma fruta; são como árvores que foram arrancadas pela raiz e estão completamente mortas. Eles são como as ondas bravas do mar, jogando para cima a espuma das suas ações vergonhosas; são como estrelas sem rumo, para as quais Deus reservou, para sempre, um lugar na mais profunda escuridão. Foi Enoque, da sétima geração a partir de Adão, quem há muito tempo profetizou isto a respeito deles: Olhem! O Senhor virá com muitos milhares dos seus anjos para julgar todos. Ele virá a fim de condenar todos os que não querem saber de Deus, por causa de todas as más ações que praticaram e por causa de todas as palavras terríveis que esses pecadores incrédulos disseram contra Deus!. Esses homens estão sempre resmungando e acusando os outros. Eles seguem os seus próprios maus desejos, vivem se gabando e bajulam os outros porque são interesseiros. Mas vocês, meus amigos, lembrem do que foi profetizado pelos apóstolos do nosso Senhor Jesus Cristo. Eles disseram a vocês: Quando chegarem os últimos tempos, aparecerão pessoas que vão zombar de vocês, pessoas que não querem saber de Deus e seguem os seus próprios desejos. São essas pessoas que causam divisões, pois são dominadas pelos seus desejos naturais e não têm o Espírito de Deus. Porém vocês, meus amigos, continuem a progredir na sua fé, que é a fé mais sagrada que existe. Orem guiados pelo Espírito Santo. E continuem vivendo no amor de Deus, esperando que o nosso Senhor Jesus Cristo, na sua misericórdia, dê a vocês a vida eterna. Tenham misericórdia dos que têm dúvidas; salvem outros, tirando-os do fogo; e para com outros mostrem misericórdia com medo, odiando até as roupas deles, manchadas pelos seus desejos pecaminosos. Deus pode evitar que vocês caiam e pode apresentá-los sem defeito e cheios de alegria na sua gloriosa presença. Por meio de Jesus Cristo, o nosso Senhor, louvemos o único Deus, o nosso Salvador, a quem pertencem a glória, a grandeza, o poder e a autoridade, desde todos os tempos, agora e para sempre! Amém!”

Há certa semelhança entre a segunda carta de Pedro e a de Judas: ambas tratam da apostasia na igreja. Pedro descreve a apostasia como uma ameaça futuro, Judas como ameaça presente. Pedro expõe os falsos mestres como perigosos, Judas descreve-os como depravados.
O autor desta epístola descreve-se como Judas, servo de Jesus Cristo, e irmão de Tiago. Sabemos que no Novo Testamento há vários homens com este nome. Como identificar o autor desta carta? Seria Judas Iscariotes, o traidor? Mateus 26.4. Não claro que não. Seria Judas Tadeu filho de Tiago? Lucas 6.16. Alguns estudiosos têm atribuído a este Judas a autoria da epístola, e em algumas traduções aparece “irmão de Tiago”. Veja o verso 17.

A hipótese mais aceita, no entanto, era de que este Judas era irmão de Jesus. Mateus 13.55. Esta possibilidade tem recebido o apoio da maioria dos especialistas em história do Novo Testamento. Não pode haver dúvida quanto a sua autoria, já que Judas se diz “irmão de Tiago”. Fica caracterizado de modo claro, que havia um só Tiago eminente e bem conhecido, o irmão do Senhor.

Conforme vimos acima Judas era irmão do Senhor, fora disto, nada sabemos a seu respeito. Podemos aprender muita coisa de Judas ao escutar o que tem a dizer de si mesmo. Era homem humilde (se identificava como servo de Cristo). Veja Romanos 1.1 e 1Pedro 1.1. Era reconhecido como irmão do Senhor. 1Cor. 9:5.

A carta de Judas Deve ter sido escrita, provavelmente no ano 70, pois faz referência à profecia de 2Pedro que por sua vez, não foi escrita antes do ano 66.

Pelo verso três deduz-se que Judas pretendia escrever sobre salvação, mas acabou por mudar de tema. Então passou a escrever uma defesa do padrão moral da fé cristã. Podemos dividir o estudo em seis partes:

1. Guardados por Deus para o Senhor Jesus. Versos 1 e 2. Foi escrito aos que são chamados, amados, conservados em Cristo e conservados por Cristo.
2. Guardar a fé. Versos 3 e 4. O Espírito constrange Judas a mudar o tema. A salvação é comum: esta ao alcance de todos.
3. Guardados para o juízo. Versos 5-7. Como solene aviso, devem-se guardar os mandamentos.
4. Não guardar a fé. Versos 8-19. Abandonando a fé, segue-se uma terrível deterioração do caráter. Sensualidade, pensamentos corruptos, incontinentes, espírito zombeteiro.
5. Guardados no amor de Deus. Versos 20-23. O amor é tudo. Como devemos proceder. Edificando, orando, conservando, olhando, compaixão, salvando etc.
6. Guardados de tropeçar. Versos 24, 25. Tropeçar precede cair. Ele nos livra dos tropeços.

Assim, a mensagem principal da carta é apologética: refere-se à necessidade dos cristãos estarem alertas contra aqueles que espalham ensinamentos falsos. Com fé em Cristo, sob a liderança do Espírito e no amor do Pai podemos resistir à apostasia.

Notas
Versículo 9. O arcanjo Miguel (Dn 10.13, 21; 12.1; Ap 12.7) discute com o diabo. Essa discussão aparece no livro A Assunção de Moisés. O diabo alegou que deveria ficar com o corpo de Moisés porque Moisés era um assassino (Êx 2.11-16). Miguel disse: Que o Senhor repreenda você! (Zc 3.2, 2Pe 2.11). Foi o próprio Deus quem sepultou Moisés (Dt 34.6).
Versículo 14. Enoque (Gn 5.18, 21-24), da sétima geração a partir de Adão (Gn 5.3-24). A referida profecia se encontra no livro Enoque.

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