Os pobres de espírito

Autor: Josemar Monteiro de Oliveira

Vida radical.

As bem-aventuranças foram pronunciadas por Jesus. Apesar de terem sido palavras pronunciadas neste mundo está muito claro que não têm sua origem neste mundo. A primeira seção do Sermão do Monte aborda o tema O Caráter do Herdeiro do Reino, as Bem-aventuranças.
As Bem-Aventuranças, escritas por Mateus, manifestam exatamente a maneira paradoxalmente inversa do pensar da humanidade de seu tempo e especialmente nos tempos em que vivemos. Elas apresentam-nos um estilo de vida radical. Na verdade o quadro pintado por Jesus através das bem-aventuranças não é tão alentador, é assustador e deve levar cada leitor a um decidido conflito entre o que alimenta a sua alma e o que deveria nutri-la.
As bem-aventuranças são 8 princípios de caráter que Jesus enumera em Mateus 5: 3 – 10.

Curiosidades.
A primeira curiosidade a seu respeito é que todas elas começam com a palavra bem-aventurado (makarios). (“No grego clássico, essa palavra (Makarioi) significava “felicidade, boa sorte, bem-estar”. Píndaro, Platão e Aristóteles, por exemplo, a usaram regularmente em saudações, para enviar votos de felicidade e para descrever a pessoa bem-nascida, educada ou feliz. O uso que Mateus dá à palavra tem esse mesmo sentido de perfeição, alegria e recompensa em decorrência de se viver da maneira que as bem-aventuranças encorajam”. (Overman, 1999:87))
A segunda curiosidade é que em cada bem-aventurança há uma promessa.
A terceira curiosidade é que Jesus abre um parêntese com a promessa do verso 3 – porque deles é o reino dos céus – e fecha o parêntese no verso 10 exatamente com a mesma promessa, isto é, as promessas da primeira e última bem-aventuranças são iguais. Entre essa promessa (a do verso 3 e 10) que abrem e fecham os parênteses, Jesus vai apresentando as virtudes de caráter que seu seguidor deve cultivar em sua alma.

Possuidores de virtudes.
Embora cada cristão tenha uma formação social e uma cosmo visão diferentes todos pertencem a uma mesma família e devem ter indistintamente os traços de caráter apresentados por Jesus em Mateus 5:8-10. Jesus está dizendo, com as bem-aventuranças, que todos os crentes deveriam ser assim, possuidores dessas virtudes de caráter. Não é permitido por Jesus que seu seguidor escolha o que gosta e descarte o que não lhe agrada na lista das virtudes apresentadas. Uma pergunta é inevitável quando você se depara com essa compreensão das bem-aventuranças: Esse ideal de caráter tem achado lugar em minha vida?

Três grandes verdades sobre as bem-aventuranças.
Primeiramente elas nos informam onde podemos encontrar a verdadeira felicidade. O pecado tem destruído muitas coisas neste mundo, mas uma coisa ele ainda não conseguiu destruir, o desejo acalentado de sermos felizes. O homem que diz não se importar com a felicidade é um mentiroso. Todos os seres humanos estão à procura da felicidade, o trágico da questão está: qual a fonte buscada para saciar esse desejo dê ser feliz. Satanás explora esse desejo de felicidade apresentando o pecado como a forma de saciá-la. Mas o pecado jamais conduziu alguém a felicidade. O Sermão do Monte esclarece que somente um tipo de pessoa é realmente feliz e bendita, a pessoa cujo caráter foi moldado pelas virtudes apresentadas nas beatitudes, as virtudes do reino. Que tipo de virtudes alimenta o meu desejo de ser feliz? Vivemos dias marcados pela superficialidade e a voz de Jesus precisa mais uma vez ser ouvida. Entre outras verdades Jesus diz que a vida feliz é aquela que encontra a felicidade nas virtudes do reino celeste.
A segunda verdade sobre as beatitudes é que elas focalizam o interior da alma. A grande maioria das pessoas se justificam apontando para o que elas fazem em lugar de olharem para aquilo que elas são. O pecado age no interior e por isso o problema de resultados maiores não está nos erros praticados pelas mãos, pelos pés ou pelos olhos, isto é, os problemas que corrompem e desgraçam a vida não estão centrados na língua, nas mãos, nos olhos ou nos pés. O problema de conseqüências eternas reside dentro do coração. O que você é quando está diante de Deus é o que você é de fato e é isso o que Deus consegue ver. As virtudes descritas nas bem-aventuranças são virtudes produzidas pelo espírito e são produzidas a partir do coração. As virtudes comunicadas por Jesus não são qualidades naturais de ninguém. Jesus não está falando aqui de gentileza, bondade ou educação. Não basta policiar a sua língua ou seus olhares. Jesus não está falando de como se tornar um cristão, mas do que se vai encontrar no interior de Seu verdadeiro filho. A medida que você ler as beatitudes você ouvirá Jesus dizer olhe para dentro do seu coração, afinal de contas qualquer fariseu poderá dominar os seus pés, as suas mãos e os seus olhos, mas o julgamento de Jesus enxerga as motiv AÇÕES da alma – o que te motiva a agir como você age ? Você é uma pessoa renovada nessa parte do seu ser? Você estaria disposto a permitir que Jesus transformasse verdadeiramente a sua vida, a partir das motivações que surgem de sua alma? Lembre-se que como cristão você pode estar tirando uma nota alta ao ser avaliado pelos homens, mas quando sua alma se faz transparente diante de Deus como Ele te vê?
A terceira grande verdade sobre as bem-aventuranças é que elas apresentam a diferença essencial entre os que vivem do mundo e os que vivem no mundo, mas não são do mundo. Nas bem-aventuranças Jesus está apresentando virtudes que fazem a diferença entre seus verdadeiros filhos de outras pessoas, quer do mundo quer da própria igreja. Jesus, nas beatitudes, está falando de virtudes necessárias e indispensáveis a vida do Cristão. Ele apresenta as virtudes de caráter que diferenciam a conduta do crente e do não crente. E a medida que você estuda as características de um verdadeiro cristão você começa a perceber que a diferença entre os dois está nas coisas que eles admiram e desejam. O que é que o mundo valoriza num indivíduo? Segurança própria, auto-confiança, auto-determinação…. Se você quiser ser bem-sucedido você precisa dar a impressão de que você é um sucesso. Haja mais bem sucedidamente do que você realmente é. Dê a impressão aos outros de ser muito mais do que de fato você é, e as pessoas dirão: Esse é realmente o homem que precisávamos. Mas o verdadeiro filho de Jesus tem outra admiração, ele admira a humildade de espírito.

A busca.
O crente e o não-crente não são diferentes apenas no que admiram mas também naquilo que eles buscam, procuram e desejam. Diga a seu vizinho que você tem uma idéia fantástica para seus negócios e que isso lhe renderá um novo carro e uma casa nova, ele certamente ficará ansioso para ouvir que idéia é essa. Diga a esse mesmo vizinho que você está buscando encontrar a felicidade em caminhar com Deus e ele vai buscar qualquer desculpa para te deixar falando sozinho. A busca da justiça do reino não interessa às ansiedades de uma mente secularizada porque o que o mundo admira e anseia difere do que admira e deseja o filho de Deus. Não há como evitarmos vermos isso ao lermos as bem-aventuranças.
Não é de surpreender que Jesus começa as beatitudes com os pobres de espírito, essa virtude é a chave para tudo o que ele diz a seguir. Por que essa virtude é tão importante e por que ele a escolhe como sendo a primeira de todas as demais?

O que é ser pobre de espírito ?
Ser pobre de espírito não está, no seu íntimo, relacionado com materialidade ou aparência apenas. Uma pessoa pode dar tudo o que possui e ainda assim não ser um pobre de espírito. Uma pessoa pode ser a mais generosa e bondosa da igreja e não ser pobre de espírito. Ser humildade de espírito não é você ter uma auto-imagem negativa também.
Você pode sofrer uma auto-comiseração e ainda assim não ser um pobre de espírito. O significado da expressão pobre no NT e no AT nos ajudará a compreender o sentido do que Jesus disse.

Significado que vem do Grego.
Há duas palavras no grego para a expressão pobre: penes / ptochos .
A primeira expressão (penes) se refere ao homem que não consegue suster a si e a sua família lidando com a terra e procura uma alternativa de trabalho com as mãos, trabalhos manuais, nessa caso a expressão especifica um tipo de pobreza relativa.
A segunda palavra para pobre (ptochos) revela o sentido de encolher-se de medo, esse termo descreve a pobreza absoluta, descreve a pessoa que precisa mendigar para sobreviver. É chocante ouvir o que Jesus tem a dizer. Bem-aventurada a pessoa que é absolutamente pobre(ptochos), aquele que foi destituído de tudo e que depende dos outros para sobreviver. No AT o pobre não tinha influência ou poder e por isso era uma pessoa oprimida e pisoteada pelos outros. Não tinha recursos humanos a seu dispor e toda a sua confiança precisava ser colocada em Deus.
O Salmista em Salmos 34: 6 usa a expressão nesse sentido de colocar a sua confiança em Deus. A palavra para pobre no AT (aw-nee ) consuma seu sentido em confiança em Deus para o livrar de suas amarguras financeiras.

Conceito.
Se ajuntarmos as ideologias refratadas pelos termos do NT e no AT teremos a idéia do que seja pobreza de espírito. Pobre de espírito é virtude daquele que tem consciência da sua falência diante de Deus e tudo o que ele pode fazer é chorar e clamar por misericórdia ao Senhor. As pessoas estão sempre preocupadas em manifestar o que pensam, o que sabem e o que acham. Mas é importante entender que os pobres de espírito nem sempre estão prontos a falar pois foram silenciados por Deus. Isso não quer dizer que Deus tenha fechado as suas bocas, mas que quando diante de Deus reconhecem a sua absoluta dependência material e espiritual. Essas pessoas estão sempre diante de Deus envergonhadas pelo seus pecados. Qual o grau de dependência de Deus que você desenvolve em sua alma?

Vazio de si mesmo.
Jesus começa com essa bem-aventurança, os pobres de espírito, porque um homem precisa estar vazio de si mesmo antes de receber as bênçãos das virtudes do caráter de Deus. Se uma mão estiver cheia de pedras jamais poderá segurar o ouro oferecido. Nascemos nesse mundo preocupados conosco mesmos e por causa do pecado sempre nos preocupamos com o nosso bem estar. Precisamos, diz Jesus, esvaziarmos de nós mesmos e essa é uma obra que só o Espírito pode fazer dentro de nós. Reconhecer a nossa falência espiritual não é um traço natural da personalidade humana, mas algo que se desenvolve a partir de nossa comunhão com Deus. Hoje em dia há muitas pessoas ensinando como sermos cheios do espírito, mas o que precisamos é de pessoas que nos ensinem a nos esvaziarmos de nós mesmos pelo poder que vem de Deus. Precisamos de pregadores que nos façam entender qual é a condição real do homem. Foi assim que Jesus começou as bem-aventuranças e o Sermão do Monte. Ele apontou, com a pobreza de espírito, para os fundamentos (os alicerces) do coração a fim de que pudéssemos construir o verdadeiro caráter que Deus espera dos que se preparam para herdar o reino dos céus.

As evidências da pobreza de espírito na alma.
Em Filipenses 3:7-11 podemos perceber quem era Paulo. Paulo era pobre de espírito. Paulo era um admirador de Cristo e tudo o que era importante antes deixou de ser quando encontrou a Jesus. Jesus era o primeiro e o mais importante em sua vida.
A primeira evidência da pobreza de espírito é que o pobre de espírito é um admirador de Cristo como Paulo o era.
A segunda evidência da pobreza de espírito é que o pobre de espírito será humilde. Se você fosse virado ao avesso e tudo o que há dentro do seu coração fosse trazido à luz possivelmente você não conseguisse encarar a si mesmo e certamente não desejaria que outras pessoas vissem. A pessoa que consegue ver o seu coração não será uma pessoa orgulhosa. Outras pessoas podem achar que você é inteligente e um sucesso na igreja, mas se você conseguir ver o que há dentro de você entenderá que os outros estão enganados a seu respeito. Os comentários positivos a seu respeito jamais subirão à cabeça se você estiver consciente da sua realidade espiritual.
A terceira evidência é que o pobre de espírito será uma pessoa de oração. E este conceito está associado à concepção presente no termo pobre usado por Jesus que, como vimos, significa aquele reconhece a sua falência espiritual. A oração é a linguagem da dependência. Quando a oração é desprezada é suficiente para que o espírito de independência passe a reinar e o humano passará a ser entronizado em lugar de Cristo. A falta de oração (comunhão) é uma prova da falta de pobreza de espírito.

Conclusão.
Quando ao buscar a Deus você começar a se sentir pequenino agradeça a Ele porque Ele está removendo de dentro de você a confiança que você tem em você e mesmo. Se você quiser crescer em pobreza de espírito estude a vida de Cristo e contemple sua retidão de espírito e sua dependência de Deus. Contemplando a Jesus descobriremos que temos violado a lei de Deus e que ela não tem sido cumprida como Jesus ensinou no Sermão do Monte. Também reconheceremos que foi a graça que nos salvou e isso nos fará crer que a salvação é algo que está fora de nós mesmos.
Há muitos na igreja que não conhecem os seus corações, que são estranhos e alheios ao que de fato são em sua essência interior. E aquele que não consegue enxergar o seu coração entroniza a si mesmo e é conseqüentemente estranho à graça de Deus.
Você não precisa manter-se em trevas, diz Jesus no Sermão do Monte. A medida que você contempla a escuridão do seu coração clame por misericórdia como um mendigo e ele te responderá aquele que vier a mim de modo algum lançarei fora. (João. 6:37)
Ao mesmo tempo que as palavras de Jesus são duras, nas beatitudes e no Sermão do Monte, elas são confortadoras pois apresentam àqueles que não se conformaram com este mundo o galardão eterno. Não é fácil contemplarmos o que somos interiormente, mas vendo nossa condição apreciaremos a pobreza de espírito manifestada pelo próprio Deus entregando-se em sacrifício vivo na cruz do calvário. E construiremos nossa casa sobre a rocha eterna (Mt.7:24-27). Amém.

Referência Bibliográfica:
OVERMAN, J. Andrew. IGREJA E COMUNIDADE EM CRISE: O Evangelho Segundo Mateus. Trad. Bárbara Theoto Lambert: São Paulo: Paulinas, 1999. 471 p.
* Redação: Roney Kumpel 

Fonte: http://www.vivalegre.com.br/materias/materia.asp?cod=1271

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