Autor: Daniel Rocha
“Pensais que aqueles dezoito, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou, foram mais culpados do que todos os habitantes de Jerusalém? Não, eu vos digo; antes, se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis” (Lc 13.4-5).
Jesus fez menção no passado de uma torre que havia caído e matado muitas pessoas. Era a torre de Siloé. Jesus queria nos mostrar que aqueles que morreram na torre não eram mais culpados do que os restantes dos habitantes de Jerusalém!
A nossa mentalidade cristã precisa entender que o fato de acontecer algo ruim ou terrível para um cristão não indica que aquela pessoa estava “devendo” alguma coisa para Deus.
Vivemos num mundo imperfeito, manchado pelo pecado, pelo ódio, pela maldade. Quantas crianças e pessoas inocentes morrem diariamente sem nunca terem cometido nenhum mal maior em suas vidas? Quantos cristãos autênticos, lavados pelo sangue do Cordeiro, justificados diante do Senhor, não morrem por esse mundo afora em guerras, desastres e tragédias?
Precisamos parar de olhar para as pessoas que sofrem e achar que elas “estão assim” por culpa delas. Precisamos parar de olhar para as pessoas soropositivas e achar que é porque têm “culpa no cartório” ou olhar para o que tem câncer e deduzir que há algum “pecado não-confessado”. Precisamos parar de concluir que o irmão que não “sobe na vida” é porque ele não dá o dízimo, e você “subiu” porque é um fiel dizimista.
Essas explicações têm criado uma geração de crentes carregados de culpa que vivem procurando em sua vida “onde errei” para que tal coisa sucedesse comigo? O que pretendo demonstrar é que nem sempre os sofrimentos são resultantes de um erro nosso ou porque deixamos de fazer alguma coisa que devíamos ter feito.
Não estou querendo aqui tirar as conseqüências da ação humana irrefletida e irresponsável, mas não podemos generalizar isso para todas as situações de dor e miséria. Nem sempre existe uma relação determinista de causa-efeito. Pastores morrem de desastres; missionários são acometidos das mais diversas doenças; crentes sinceros e de vida irrepreensível sofrem de diabetes, úlcera, problemas de coluna, artrite, deficiência renal….
Não podemos inferir que desastres, tragédias ou doenças decorrem de uma culpa anterior. Nós cristãos não cremos em karma!
Quando começamos a achar que tudo é decorrência determinista de nossos atos (bons ou maus) perdemos a consciência da graça de Deus. As benesses de Deus sobre nossa vida nem sempre encontram um servo merecedor. A benção pode vir sobre nós independente de nossos méritos. O sol nasce para os bons e para os maus, e a chuva cai sobre a fazenda do cristão e sobre a fazenda do ateu.
É muito comum ver crentes testemunhar bençãos enfatizando seus méritos, seus jejuns, o quanto ele tem sido fiel, o quanto ele tem fé, o quanto a igreja que ele freqüenta é poderosa, etc. etc. Poucos, muito poucos, reconhecem que não merecem essas bênçãos e que se receberam foi unicamente pela graça de Deus.
Isso faz-me lembrar a história do galo que gabava-se de todas as manhãs fazer o sol nascer porque antes do alvorecer ele subia no poleiro e cantava a plenos pulmões. E por anos e anos aquela comunidade cria que, de fato, o sol nascia porque aquele galo cantava ainda de madrugada para chamar o astro-rei. Até que um dia o famoso galo perdeu a hora, dormiu até tarde e….. o sol nasceu.
Da mesma forma há muitos crentes que imaginam que é o seu fazer que vai determinar o presente e o futuro. Temos a nossa responsabilidade, é verdade, mas há os desígnios inescrutáveis que somos incapazes de compreender.
É sempre bom lembrar que se não somos consumidos devemos isso exclusivamente às misericórdias de Deus e não por nossos méritos pessoais (Lm 3.22).
É sempre bom lembrar que Deus não nos trata segundo os nossos pecados, nem nos retribui consoante as nossas iniqüidades (Sl 103.10).
É sempre bom lembrar que nossas justiças são como trapos de imundícia (Is 64.6 ) e não nos garantem nada!
Hoje posso dizer que entendo o Pregador quando ele diz: “há justo que perece na sua justiça, e há perverso que prolonga os seus dias na perversidade” (Ecl 7.15).
A nós resta a única atitude correta diante da vida, da dor e do sofrimento: depositar nossa confiança em Deus e descansar em sua Graça, mesmo não compreendendo as coisas que nos entristecem e nos fazem chorar.
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