A presença da família no mundo moderno

Autor: Virgil C. Dechant
Acima de tudo, nos reunimos nesta ocasião para celebrar a família. Graças a Deus, há muito a celebrar.

Celebramos o testemunho luminoso ao mundo de tantas famílias cristãs, exemplares e saudáveis.

Estas são as famílias das quais pode ser dito — como o Papa João Paulo diz — “que elas mostram uma consciência mais viva de liberdade pessoal e maior atenção à qualidade das relações interpessoais no casamento, a promover a dignidade das mulheres, à procriação responsável, à educação das crianças.” (Familiaris Consortio, 6). Estas famílias são verdadeiras igrejas domésticas, assim como células vivas da sociedade.

Eu sou agradecido a Deus que, apesar dos membros das famílias dos cavaleiros de Colombo não estarem isentos dos problemas e das pressões que afligem outras famílias, muitas delas se reúnem nesta descrição.

Nós celebramos a propagação e o aparente crescimento, interesse no casamento encontrado em muitos quadrantes da sociedade atual, um interesse dirigido às necessidades do encontro familiar e encontrar soluções para os problemas familiares.

Isto é evidente, por exemplo, numa disponibilidade muito grande de livros, artigos e discussões da mídia. Tanto que, aquela análise de assuntos relacionados às famílias tornou-se uma industria de pequeno porte na mídia e no mundo editorial hoje.

O interesse é também notado entre os líderes políticos e figuras públicas. Aqui, parece, que referências a valores familiares têm se tornado uma espécie de mantra secular, usada para significar solidariedade e interesse.

Na verdade, nem todas as soluções aos problemas familiares propostos na mídia e mundos acadêmicos ou defendidos por políticos, e não todos “os valores familiares” anunciados, são válidos e suscetíveis às necessidades reais.

Alguns na realidade são mal direcionados e destrutivos aos valores familiares genuínos e vida familiar, particularmente aqueles que violam a moralidade ou infringem os direitos paternos.

Em suma, entretanto, nós encontramos no mundo exterior um acentuado interesse pela família que é sincero. Quanto a este ponto, é bem vindo, apesar de precisar algumas vezes ser corrigido — quando é possível — e resistido quando não é possível.

Nós também celebramos o interesse crescente na família evidente hoje por parte da Igreja, especialmente sob a liderança do Papa João Paulo.

Acho que o programa da renovação familiar contida na exortação apostólica Familiaris Consortio; da mensagem para as famílias de um guia moral iluminado em direção à Veritatis Splendor e Evangelium Vitae; dos ricos tesouros de ensino católico sobre o casamento e família contidos no Catecismo da Igreja Católica.

Acho também que o trabalho do Conselho Pontifício para a Família e tais programas acadêmicos como o Instituto João Paulo II para estudos do casamento e da família, dos quais o ramo norte-americano, os cavaleiros de Colombo patrocinam em Washington, D.C.

Tudo isto é para o bem. Tudo isto é razão para celebrar.

Mas há sinais de preocupação, também. A respeito deles, me refiro a uma perspectiva de primeiro mundo ocidental, embora estes mesmos aspectos também estejam presentes em toda parte, devido à influência da cultura ocidental.

A raiz de muitos problemas que as famílias enfrentam é o relativismo.

Parcialmente, esta é uma forma de relativismo cultural, dentro de uma visão de que todas as espécies de formas “familiares” são igualmente aceitáveis e nenhuma é normativa ou mais desejada do que a outra.

Por exemplo, a paternidade de um só membro e a ilegitimidade têm por vezes sido consideradas como convenientes, até mesmo liberadas, e hoje, é às vezes mesmo sugerido que relacionamentos homossexuais mereçam a legalidade do casamento.

Parcialmente, também, esta é uma expressão de relativismo individual — a falácia libertária que imagina que o que quer que os indivíduos considerem estar certos é portanto direito deles.

Coabitação e divórcio, aborto, infanticídio, eutanásia para os incapazes ou idosos — tudo é pura “escolha” dentro deste ponto de vista. O “direito de escolher” é sagrado, inviolável mesmo que a escolha possa ser rigidamente controlada por pressão social ou alguma ideologia não humana.

O Papa João Paulo chega à raiz do problema quando escreve sobre uma liberdade que conduz “a uma séria distorção da vida na sociedade”. Ele explica:

“Se a promoção do ser é compreendida em termos de autonomia total, as pessoas inevitavelmente chegam ao ponto de se rejeitarem umas às outras… a sociedade se torna uma massa de indivíduos colocados lado a lado, porém sem quaisquer vínculos recíprocos… qualquer referência aos valores comuns e a uma verdadeira relação está perdida, e a vida social fica à mercê de areias movediças de total relativismo. Neste ponto, tudo é negociável, tudo está aberto à barganha: até mesmo o primeiro dos direitos fundamentais, o direito à vida.” (Evangelium Vitae, 20.1).

Nem se precisa dizer que esta atitude é pertinente ao casamento e à vida familiar.

A propagação do relativismo coincide e poderosamente apoia uma outra ameaça grave: o esforço, mais ou menos sistemático, de destruir a idéia central de família.

A mais natural e essencial das comunidades humanas, esta comunidade de amor, explicada como estrutura artificial para a opressão, patriarcado, exploração e manipulação: de classe a classe, mulheres por homens, crianças por pais, e assim por diante.

A destruição da família tem suas raízes convergentes no marxismo, liberacionismo e terapias psicoanalíticas. Vemos nisto as mãos de Friedrich Engels e Sigmund Freud, e seus discípulos.

Ela tem numerosos veículos, que incluem o feminismo, a mentalidade de que o divórcio não é problema, a política homossexual, o movimento de um controle à natalidade e a cultura da morte, elementos do movimento pelos direitos das crianças, setores da subcultura psicoterapêutica, e iniciativas intrusivas e invasivas do tão chamado “estado de governanta” (babá).

Certamente, algumas destas coisas contêm elementos importantes de verdade e servem a finalidades importantes. Os direitos da mulher devem ser respeitados. As crianças têm direitos, os pais algumas vezes são inconvenientes, ou simplesmente incompetentes. Famílias feridas precisam de ajuda e apoio do governo.

Mas assegurando que: a mentalidade destrutiva aplicada ao casamento e à vida familiar é ainda errada e corrosiva.

Qual é a nossa resposta a tudo isto?

A família estável composta de dois pais com crianças — e, se possível, com laços familiares com avós, tios e tias, primos e outros membros familiares formando uma extensa comunidade que interage com amor recíproco.

Este modelo é a mais natural e melhor estrutura para a formação saudável e funcionamento das personalidades e relacionamentos humanos.

É neste modelo que os seres humanos naturalmente aprendem a amar e a servir um ao outro e a Deus.

É primordial, indispensável, deve ser acalentado, definido e preservado — pelo governo, pelo setor privado, pela Igreja, por cada um e todos nós.

O que queremos oferecer à família de hoje que se defronta com o relativismo moral, a mentalidade destrutiva e outros desafios?

Muitas coisas, sem dúvida. Mas uma em particular: desejamos dar à família uma apreciação de liberdade responsável — liberdade vivida e assumida. Explicarei a seguir.

Ouvi, recentemente, um padre contar uma estória. Anos atrás ele vivia no que era chamado de Alemanha Ocidental. Tornou-se amigo de uma família que havia vindo da Europa Oriental. Um dia ele perguntou à família qual fora a adaptação mais difícil que tiveram que fazer.

E a resposta o surpreendeu: “fazer compras”.

“Foi extremamente difícil no início porque haviam muitas escolhas e nós não estávamos acostumados a fazer escolhas. Foi duro a princípio.”

Muitas pessoas são, de certa forma, desta maneira.

A liberdade da escolha é primordial à dignidade, porém pode ser desnorteante. Se não for usada adequadamente — e em nossa cultura consumista secular é um perigo real — pode tornar-se libertina ou levar à dependência de ideologia ou paixão.

Liberdade responsável é a resposta, acima de tudo à vida vivida de acordo com a moral verdadeira.

O propósito da defesa da Igreja à moral verdadeira é, como diz o Papa João Paulo, servir à liberdade, por que “não pode haver liberdade distanciada ou em oposição à verdade” (Veritatis Splendor, 96.1).

A liberdade responsável é exercitada ao se viver a vocação. Isto é a absoluta verdade do matrimônio, Como o teólogo e estudioso da ética americana Germain Grisez expõe, a opinião propagada em nossa sociedade secular é de que o casamento é “apenas uma combinação para atingir fins específicos”, e várias maneiras de gratificação pessoal.

Não pode ser desta maneira para os cristãos. “A verdadeira comunhão marital, como realidade que perdura não pode ser avaliada por sua utilidade ou satisfação; mas sim, deve ser procurada e aceita como uma bênção, acalentada e nutrida em si mesmo. Os esposos cristãos devem se submeter à vida matrimonial como uma resposta deliberada ao chamado de Deus, atribuir este ‘sim’ marital como consentimento à vontade de Deus de que se tornam e permanecem um, e, sempre olhar o outro cônjuge como presente de Deus.” (The way of the Lord Jesus, Volume 2, Living a Christian Life, 610).

Esta liberdade responsável é finalmente uma liberdade vivida e assumida.

O Santo Padre nos lembra repetidamente que dar-se incondicionalmente é a essência do amor conjugal. E:

“Que o único lugar onde esta doação em sua verdade maior torna-se possível é no casamento, o compromisso de amor conjugal escolhido livremente e conscientemente e onde homem e mulher aceitam a comunidade íntima de vida e amor desejada por Deus.” (Familiaris Consortio, 11).

A autêntica liberdade humana é a liberdade responsável. Esta é a grande lição que a Igreja deseja ensinar às famílias hoje. Roguemos a Deus para conseguir proclamar e preservar este bem.

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