Crescer dói

Autor: Daniel Rocha

“E  crescia Jesus em sabedoria, estatura e graça….”

Há um livro interessante que acabou virando filme, chamado “O Tambor”, do alemão Günter Grass. É a história de um menino teimoso que recusava-se a crescer. Quando queria alguma coisa pegava seu tambor e ficava batendo com um cabo de vassoura sobre ele até que alguém o atendesse.  E já com idade adulta tinha a aparência e o corpo de uma criança.
Às vezes penso que é menos penoso continuar sendo o que sempre fomos. Para que arriscar? Para que sair do porto seguro e singrar por rios perigosos e traiçoeiros, que não conhecemos bem? Para que sair do aconchego dos pensamentos que trazem sossego à alma, e aventurar-se por  abismos e montes escarpados?  O senso comum diz que viver na planície é mais seguro que escalar as altas montanhas.
Há cristãos que gostam de viver nas planícies – as montanhas lhes dão vertigens. Há cristãos que recusam-se a sair da segurança encontrada nos limites do terreno em que ele mantém controle,  e sair fora dessa área demarcada na alma é inimaginável para ele. É o medo de “perder” a identidade, é o medo do novo, o medo do não conhecido.
Crescer é “abandonar” posições confortáveis, é deixar o que é seguro, é começar a subir  em direção ao ar rarefeito dos altos montes. Crescer é recusar a permanecer no conquistado, é romper com o passado, uma ruptura que vai levar a uma descontinuidade da rota até então vivida. Crescer dói porque nos leva a dar um passo quando queríamos ficar parados. Os fariseus foram incapazes de entender o que Jesus dizia e fazia porque  reusaram-se a dar o segundo passado, a andar a segunda milha…
Todos os seres vivos,  animais e vegetais e até mesmo os minerais têm em si o potencial de crescimento. Uma semente de laranja carrega em si a potencialidade de um pé frondoso carregado de frutos. Um pires com água e sal deixado por alguns dias começa a produzir pequenos cristais de sódio. Todas as plantas crescem em direção ao sol.
Creio que o cristão traz em si a capacidade de crescimento que o Espírito nos dá. Se não temos crescido devemos olhar o que tem impedido esse processo. Muito provavelmente desenvolvemos “apegos” à nossa forma de ser.  Eles funcionam como laços que nos impedem de dizer adeus à nossa infância, aos nossos quereres, às manhas e  manias, à forma fixa de pensar. Não raro vemos adultos carregando sombras não resolvidas do passado que assombram o presente, vemos homens e mulheres incapazes de um relacionamento saudável por conta de resquícios infantis, que tinham sentido lá atrás, mas agora só trazem complicações.
Paulo diz que ele  plantou,  Apolo regou, mas Deus é quem dá o crescimento. Todo pai quer ver seu filho crescendo. É o processo natural. Mas quando vemos, nas regiões subnutridas de nosso país, pessoas que não crescem devido ao nanismo – doença que causa um baixo desenvolvimento corporal – logo, ficamos imaginando que pode estar havendo no meio evangélico  um  “nanismo espiritual”, provocado por uma alimentação inadequada ou por um desejo próprio, mas oculto da consciência,  de permanecer “ad eternum”  no mesmo estágio.
Todos os autores bíblicos exaltaram  a profundidade do conhecimento e das maravilhas de Deus. É quase uma afronta, diante do Rei,  ficar na superfície, viver de modo fútil, brigar por bobagens,  contentar-se com a mediocridade, buscar repetir experiências que, no passado, tiveram seu significado, mas hoje não tem mais….. 
Obsessão pelo passado, ou tentar encontrar no presente imagens de um passado que já se foi podem indicar um estratagema mental para não olhar para frente, e com isso não ter a responsabilidade de crescer.
“Anões espirituais”  recusam-se a quebrar paradigmas, a ir além do que foi dado. Não há coragem para invocar a Deus e pedir-lhe  para revelar-nos coisas novas e ocultas que não sabemos (Jr 33.3).
Crescer dói, mas sem crescer não há como alcançar a estatura que Deus deseja para nós.

Daniel Rocha
Pastor da Igreja Metodista em Itaberaba, e psicólogo
dadaro@uol.com.br

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