Breve Teologia da Evangelização

Quando evangelizamos alguém, todos nós cristãos carregamos conosco alguns pressupostos teológicos que norteiam o conteúdo da nossa mensagem, ainda que não tenhamos parado para analisar. Pressupostos estes que influenciam na forma em que proclamamos e nas expectativas que alimentamos com relação ao que é proclamado.

Dentre estes pressupostos, alguns são mais evidentes que outros, vejamos a seguir alguns deles.

A. A inspiração e inerrância das Escrituras:

Compreendemos a inspiração como sendo a influência sobrenatural do Espírito Santo sobre os homens separados por Ele mesmo, a fim de registrarem de forma inerrante e suficiente toda a vontade revelada de Deus, constituindo este registro na única fonte e norma de todo o conhecimento cristão (2 Tm 3.16; 2 Pe 1.20-21) .Infelizmente muitos problemas têm surgido pelo fato de pessoas proclamarem o evangelho com um conceito deturpado no que diz respeito às Escrituras e Sua autoridade. Estas deturpações têm dado margem ao surgimento de muitas heresias e seitas, que têm feito com que o cristianismo pareça uma grande farsa, ou simplesmente conceitos e princípios sem fundamentos uma vez que a sociedade não faz muita distinção dentro do cristianismo, consideram tudo e todos como “evangélicos”.

No momento em que uma pessoa é evangelizada, fala-se para ela da salvação eterna oferecida por Jesus Cristo conforme as Escrituras, fala-se do amor demonstrado por Jesus na Cruz conforme as Escrituras, fala-se também do alvo de todo regenerado durante a sua vida. A partir do momento em que não se acredita na inspiração das Escrituras, nem mesmo em sua inerrância, conseqüentemente a mensagem anunciada torna-se sem valor, sem fundamento, pois está baseada em fonte não confiável. Como pregaremos a Palavra se não confiamos no sentido exato do que estará sendo anunciado? Como evangelizaremos se não temos a certeza de que o que falamos procede de fato de Deus, ou se é meramente uma falácia dos homens?

O apóstolo Paulo mostra a sua convicção de que as Escrituras são de fato a Palavra de Deus e digna de toda aceitação (1 Tm 2.12; 4.9). A sua vida e mensagem estavam baseadas nas Escrituras. Note que em Romanos 1.16, Paulo diz que o evangelho é o poder de Deus para a salvação do pecador, este é o evangelho pregado pela Igreja, um evangelho que proclama a Palavra que transforma e não simplesmente opiniões dos homens a respeito da Palavra. “A Igreja por si só não produz vida, todavia ela recebeu a vida em Cristo (João 10.10), através da Sua Palavra vivificadora; desse modo, ela ensina a Palavra, para que pelo Espírito de Cristo, que atua mediante as Escrituras, os homens creiam e recebam vida abundante e eterna”. Se proclamamos para as pessoas o conteúdo das Escrituras como a mais pura verdade, como uma mensagem que pode mudar vidas, uma mensagem sempre atual, é porque de fato cremos que a Palavra é viva e eficaz, é transformadora, e cremos que ela é inspirada por Deus. Logo, não contém erros porque o nosso Deus é perfeito e nEle não há falhas.

B. A Universalidade do Pecado:

Ao falarmos para alguém das Boas Novas, não saímos a procurar onde estão os pecadores e nem mesmo a perguntar quem é pecador para que possa ouvir o que temos a dizer. Ao nos dirigirmos aos homens apresentando o plano de salvação de Deus para a humanidade, partimos do pressuposto de que todo homem é pecador, está debaixo da condenação e necessita da glória de Deus (Rm. 3.23). Uma das conseqüências mais óbvias do pecado é a morte. Essa verdade é destacada na declaração em que Deus proíbe Adão e Eva de comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal: ‘porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás’ (Gn 2.17). A Palavra de Deus é bem clara quando nos diz que não há um justo se quer, não há quem busque a Deus (Rm 3.10-11). Desde a queda, o homem encontra-se sob o domínio do pecado, que corrompeu o seu intelecto, vontade e sua faculdade moral. A raça humana encontra-se morta espiritualmente, escrava do pecado (Gn 6.5; Is 59.2; Jo 8.34,43,44, Ef 2.1,5) e não há nada que ela possa fazer para restaurar a comunhão que fora quebrada (Rm 3.19-20). Partindo deste pressuposto, temos em mente que devemos anunciar as Boas Novas a todo homem, cientes de que todos estão perdidos e todos necessitam da graça, do perdão, da salvação que só vem por meio de Cristo Jesus.

C. A Suficiência e eficácia da obra de Cristo:

O apóstolo Paulo falando aos Coríntios, lembra-lhes do evangelho que lhes fora pregado por ele, por meio do qual muitos foram salvos. Paulo diz que a mensagem consistia em que Jesus Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras relatam, foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, e ainda apareceu a várias pessoas (1 Co 15.1-8). Paulo está afirmando que a obra de Jesus Cristo na cruz dá sentido genuíno à mensagem pregada pela Igreja, que se tudo fosse uma invenção humana, ou se o que Ele fez na cruz não foi o suficiente para a salvação do pecador, a nossa fé é vã, a nossa mensagem consiste em mentira, em enganação (1 Co 15.14). Jesus Cristo, nosso mediador, cumpriu de forma cabal e vicária as demandas da Lei em favor do Seu povo. Se a obra de Cristo não fosse plenamente satisfeita, não haveria “bênção” alguma a ser aplicada (João 17.4; 19.30; Hb 9.23-28; 1 Pe 3.18). Jesus Cristo veio para obter a salvação definitiva para o Seu povo (Mt 1.21; Jo 3.16; 2 Co 5.21), Ele mesmo afirma que dá a vida eterna, e aqueles a quem Ele a dá, jamais a perderão (Jo 10.27-28). Graças à eficácia da obra de Cristo na cruz, o homem tem paz com Deus, torna-se amigo de Deus (Cl 1.21-22), torna-se filho de Deus (Jo 1.12), mediante fé em Cristo Jesus como seu único e suficiente salvador. É amparada nesta certeza que a igreja evangeliza.

D. A Responsabilidade Humana:

O ser humano foi criado por Deus como um ser pessoal que tem consciência e determinação própria. Diferentemente de todo e qualquer animal, o homem faz a distinção entre o eu, o mundo e Deus. O homem foi criado com capacidade de se relacionar com Deus (Gn 3.8-14; Jr 29.13; Mt 11.28-30) e com o seus semelhantes, podendo compreender racionalmente a vontade de Deus, fazer-se entender e avaliar todas as coisas (Gn 1.28-30; 2.18-19). Deus não tinha como propósito criar robôs que ao toque de algum dos comandos responderia sem qualquer sinal de raciocínio e, pior ainda, uma criação impessoal, que não tenha capacidade de se relacionar. Com certeza o homem não é perfeito como o Seu criador e mesmo que o pecado tenha comprometido de forma gravíssima todas as suas faculdades originais, ele não deixou de ser a imagem e semelhança de Deus. As Escrituras apresentam o evangelho como uma mensagem que deve ser anunciada a todos os homens, a fim de que eles possam entendê-la e crer nela. A fé é um dom de Deus (Ef 2.8). Todavia, a proclamação compete a nós; é uma responsabilidade inalienável e essencial da Igreja. Por certo, não compreendemos exaustivamente a relação entre a soberania de Deus e a responsabilidade humana; contudo, a Bíblia ensina estas duas verdades: Deus é soberano e o homem é responsável diante de Deus por suas decisões (Rm 1.18-2.16). Em nosso testemunho, cabe a nós anunciarmos o evangelho de forma inteligível, pois estaremos dirigindo-nos a seres racionais a fim de que entendam a mensagem e creiam; por isso, ao mesmo tempo que sabemos que é Deus quem converte o pecador, devemos usar todos os recursos que temos à disposição para atingir aos homens perdidos; desde que estes recursos não contrariem a Palavra de Deus. A nossa proclamação deve ser apaixonada, no sentido de que queremos alertar os homens para a realidade do evangelho, “persuadindo-os” pelo Espírito, a se arrependerem de seus pecados e a se voltarem para Deus ( Rm 11:13-14; 1 Co 9.19-22).

Marcelo Berti
http://marceloberti.wordpress.com